Cap 1 e 2
No primeiro capítulo, Igarashi discute o impacto da bomba atômica, a imagem do imperador Hirohito e o começo das turbulentas relações entre Estados Unidos e Japão.
Muitos americanos consideravam as bombas justificáveis para por fim à guerra, enquanto para os japoneses, evidentemente, a ação havia sido considerada repugnante e anti-humanitária. Da parte das autoridades, as narrativas eram igualmente contraditórias, tanto no que se referia às decisões de Truman ou às intervenções de Hirohito que, pela primeira vez, começava a se fazer presente. Igarashi explica que até 45, Hirohito estava escondido como as bombas e a sua aparição pela primeira vez em público modifica radicalmente o entendimento de corpo e de autoridade suprema que se tinha no Japão, até então. O encontro entre MacArthur e Hirohito fazia parte de um melodrama que identificava o imperador com uma figura feminina e o americano como o masculino, representando respectivamente os seus paises em uma relação de submissão e humilhação para o japoneses.
No papel de vitima, o Japão rapidamente muda para heroína de um melodrama que continuava a se instalar. Essas narrativas que começaram a se organizar foram traduzidas em filmes, romances e outras manifestações mídiaticas. Um filme que se destaca na época é The Barbarian and a Geisha, com John Wayne no papel de Townsend Harris, que negocia um tratado de abertura do Japão para os Estados Unidos e, no meio tempo, apaixona-se por uma geisha tentando a todo custo “salva-la”. Igarashi cita outros exemplos que replicam os melodramas reais e continuam até mais recentemente a expressar conflitos e ambivalências entre as duas culturas, como o romance Rising Sun de Michael Crichton de 1992, que começa com a descoberta do assassinato de uma jovem caucasiana no predito Nakamoto, de uma corporação japonesa. O protagonista, detetive Smith, aprende que a economia japonesa estava ultrapassando a americana e que a nova guerra não dispunha mais de bombas atômicas, mas de disputas no mercado financeiro e de consumo. Uma pista que Igarashi segue com ênfase maior ou menor no decorrer de todo o livro.
No 2 cap, explica que entre os japoneses, o “pensamento racional” manteve um viés despótico mas apos a guerra o corpo aparecia claramente se rebelando. Os japoneses passaram a desconfiar do pensamento, afirmando que o corpo é a verdade. A dor do corpo, o desejo do corpo, a fúria do corpo, a êxtase do corpo, a confusão do corpo, o sono do corpo – estas são as únicas verdades.
Para ilustrar isso, começa citando o escritor e performer
Tamura Taijiro, que se apresentará como o escritor da carne.
Depois do colapso do regime de antes de 1945, os corpos que permaneceram entre as ruínas das cidades foram celebrados como signos da nova vida no Japão. A maioria das cidades japonesas tinha sido destruída pelo bombardeio americano, e havia pouca coisa para bloquear a visão nesses espaços urbanos. Para muitos sobreviventes da guerra, seus corpos eram o único objeto material que conseguiram resgatar da destruição dos ataques aéreos. Assim que Hiroito começou a viajar ativamente através do país destroçado pela guerra e se misturou com a população japonesa, a imagem do imperador mantendo-se em pé nas ruínas urbanas, metaforicamente representava o estado dos corpos japoneses no período imediatamente posterior a guerra. O corpo do imperador, que tinha sido submetido a um rígido sistema burocrático e que tinha sido afastado do olhar da população, voltou a aparecer perante as pessoas. Shiba Ryotaro, que cobriu a viagem do imperador a Kyoto em 1950 como repórter de um jornal, mais tarde comentou que a imagem do imperador foi produzida no percurso de suas viagens através do país acabado: “Existia o sentimento de que num Japão que não tinha nada, o imperador sozinho existia, e o resto eram ruínas. A imagem do pós-guerra do imperador foi criada quando ele fez as viagens a diversas regiões numa época como esta” . Aos olhos de muitos japoneses, a figura do imperador foi humanizada e liberada dos constrangimentos do regime prévio a 1945, assim como seus próprios corpos no período do pós-guerra.
Durante o 2 cap, Igarashi cita outros autores importantes como o professor da universidade de Tokyo e ideólogo nacionalista Kakei Katsuhiko que pretendia recuperar uma espécie de espírito nacional, que havia sido enfraquecido diante da derrota.
Esta postura acaba refletida em outras instancias importantes da sociedade japonesa, deflagrando uma fase de higienização que acomete por exemplo, os leprosários nacionais. Esta atitude vinha se firmando desde a década de 1930 e foi ainda mais incisiva em relação aos doentes mentais nos hospitais psiquiátricos. O objetivo era afastar esses doentes da sociedade, cultuando de alguma forma, a “normalização dos corpos”. Os corpos que não estavam em forma eram corpos antipatrióticos. O exercito era uma instituição que almejava, mais que todas as outras, produzir corpos ideologicamente sadios através de um treinamento vigoroso.
A luta pela supervivência nos primeiros anos de pós-guerra mudou radicalmente isso. Diante da fome massiva, era difícil sustentar a postura ideal. Por outro lado, foi um processo de recuperação dos sentidos corporais e particularmente, do entusiasmo pela sexualidade.O desfrute sexual marcou a liberação dos corpos japoneses do pós-guerra, expressando o desafio ao regime regulatório que demandava sacrifícios corporais. O fato do estado não conseguir restringir o mercado negro a pesar de uma serie de intentos, só confirmou a sua inabilidade para controlar a vida cotidiana dos corpos. O cuidado atento das funções do corpo e dos sentidos era o médio de ir além dos mandados regulatórios do estado. A cultura do pós-guerra que emergia das experiências nos mercados negros festejava a sexualidade como a materialização dos sentidos corporais. A partir daí, Igarashi cita muitos exemplos, sobretudo da literatura que ilustram essas mudanças de percepção do corpo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário