terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Como vender cerveja em um país onde cerca de 60% da população é muçulmana e proibida pelo governo de comprá-la? Com muito cuidado.
A Guinness Anchor, que conta com a maior participação de mercado dentre as três cervejarias na Malásia, celebrou recentemente o 250º aniversário da Guinness com um concerto perto de Kuala Lumpur, com participação do Black Eyed Peas. A empresa teve que criar uma área separada onde álcool podia ser servido e concordou em não usar a palavra "Guinness" no concerto ou na divulgação do evento.
Inicialmente, muçulmanos não estavam autorizados a ir, mas as autoridades posteriormente mudaram de ideia. O concerto não teve lotação esgotada, mas foi assistido por cerca de 16 mil pessoas. Não se sabe quantas eram muçulmanas.
"Nós voltamos nossas atividades principalmente aos chineses malasianos e aos indianos malasianos", disse Charles Ireland, o diretor administrativo da cervejaria, referindo-se às maiores comunidades não muçulmanas do país.
Apesar desses desafios culturais -e do fato da Malásia ter um dos impostos mais altos do mundo sobre o comércio de bebidas alcoólicas- o consumo de cerveja aqui permaneceu relativamente estável ao longo da última década. Analistas e fabricantes locais estão cautelosamente otimistas de que as vendas poderão aumentar gradualmente à medida que a economia melhorar, aumentar a renda disponível e crescer a população de 28 milhões de pessoas.

O Euromonitor International, um grupo independente de pesquisa de mercado, prevê que o consumo de cerveja na Malásia aumentará para 144 milhões de litros neste ano e para 171 milhões de litros em 2014, em comparação a 137 milhões de litros em 2008. Apesar do álcool ser proibido em alguns países de maioria muçulmana, na Malásia ele é legal para não-muçulmanos e está disponível em supermercados, bares e restaurantes. Ainda assim, ele continua sendo um assunto sensível.
Em julho, uma modelo muçulmana foi sentenciada a receber chibatadas após ser pega bebendo cerveja em um hotel, no Estado de Pahang, no leste. Na maioria dos Estados, muçulmanos pegos bebendo bebidas alcoólicas podem ser multados em até 3 mil ringgits (cerca de US$ 885), ser condenados a pena de prisão de até dois anos ou ambos. Muçulmanos pegos vendendo bebidas alcoólicas podem ser multados em até 5 mil ringgits e serem condenados a até três anos de cadeia.
O diretor administrativo da Carlsberg Malaysia, Sorem Holm Jensen, disse que as cervejarias tiveram que adaptar suas estratégias de marketing porque só podiam veicular publicidade em mídia impressa e no cinema, e só podiam voltar suas campanhas para não-muçulmanos. A Carlsberg, que está em segundo lugar em participação de mercado, à frente da Napex Corp., emprega mais publicidade relacionada a produto na Malásia, enquanto em outros países ela provavelmente retrataria pessoas bebendo em um contexto social, disse Jensen.
A Malásia, um país de renda média, busca se qualificar ao status de país desenvolvido até 2020. O Banco Mundial prevê que o produto interno bruto da Malásia crescerá 4,1% no próximo ano, após sofrer uma contração de 2,3% neste ano.
Com a recuperação do crescimento econômico, o único inibidor para o aumento das vendas de cerveja, segundo alguns analistas, seria um aumento do imposto sobre a venda.
Jensen disse que o imposto representa 7,40 ringgits por litro, dando à Malásia o segundo maior imposto sobre bebidas alcoólicas do mundo, atrás da Noruega.
Uma lata de 325 ml de Carlsberg geralmente custa 5 ringgits em um supermercado. O preço nos hotéis de luxo é de cerca de 20 ringgits por uma garrafa.
Em um relatório neste ano, a Euromonitor atribui um aumento nas vendas de bebidas alcoólicas na Malásia em 2008 à decisão do governo de não aumentar o imposto sobre a cerveja, somado ao aumento da renda dos consumidores e um aumento no número de mulheres bebendo cerveja.
Os analistas disseram que quando o governo teve que aumentar o imposto, como fez em 1998 e em todos os anos de 2003 a 2005, o consumo de cerveja caiu antes de se recuperar, à medida que os consumidores se adaptavam aos novos preços. Após o último aumento de imposto em 2005, as vendas de cerveja caíram para 4,8 litros por ano por pessoa, em comparação a 5,4 litros em 2004, segundo o Euromonitor.
A Guinness Anchor divulgou recentemente seu melhor desempenho em ano fiscal desde a formação da empresa há 45 anos, postando uma receita de 1,29 bilhão de ringgits e um lucro pré-impostos de 191,2 milhões de ringgits para o ano financeiro encerrado em junho.
Neste ano, o Partido Islâmico Pan-Malasiano pediu pela proibição da venda de bebidas alcoólicas em lojas de conveniência na cidade de Shah Alam, de maioria muçulmana, perto de Kuala Lumpur. Apesar da proibição não ter ocorrido, um membro do partido no Parlamento por Shah Alam, Khalid Samad, disse que algumas lojas de conveniência na área decidiram voluntariamente parar de vender bebidas alcoólicas.
Siti Zubaidah Ismail, uma professora do departamento de shariah e lei da Universidade da Malásia, disse que geralmente cerca de 30 casos envolvendo consumo de álcool por muçulmanos costumam ser julgados nos tribunais a cada ano. Ela disse que pode ser difícil para as autoridades pegarem os muçulmanos consumindo álcool e que há preocupação de que o consumo de álcool possa estar aumentando entre os jovens muçulmanos.


A Malásia não é o único país muçulmano onde as vendas de bebidas alcoólicas estão aumentando, como informou o Euromonitor. A Turquia deverá presentar vendas recordes de cerveja de 1,1 bilhão de litros neste ano, em comparação a 727 milhões de litros em 2004, enquanto as vendas no Egito deverão chegar a 182 milhões de litros neste ano, em comparação a 118 milhões de litros em 2004.
Carne de porco também é proibida para os muçulmanos e não é encontrada em muitos cardápios, então Werner Kuhn abriu o El Cerdo, um restaurante em uma área popular em Kuala Lumpur, em 2005. O nome significa "o porco" em espanhol.
"É preciso dar aos clientes um motivo para virem ao seu restaurante", disse Kuhn, um chef alemão. "É preciso oferecer algo que ninguém mais oferece."




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