sábado, 3 de abril de 2010

Muhannad Haddad cresceu e frequentou a escola na Jordânia, arrumou emprego em um banco de lá e viajou a países estrangeiros com um passaporte de lá. Até que, um dia, as autoridades disseram que ele não era mais jordaniano e, assim, retiraram sua cidadania e comprometeram sua capacidade de viajar, estudar, trabalhar, buscar atendimento médico, comprar imóveis e até dirigir.
As autoridades efetivamente lhe disseram que agiam assim para o bem dele próprio. Afirmaram que, como milhares de outros jordanianos de ascendência palestina, ele estava sendo privado da sua cidadania para preservar o seu direito de um dia voltar à Cisjordânia ou a Jerusalém Oriental.
"Eles me deram um papel que dizia: 'Você agora é palestino'", contou Haddad, lembrando do dia que mudou sua vida, há três anos.
Em um relatório recente intitulado "Apátridas de novo", a ONG Human Rights Watch disse que 2.700 pessoas perderam sua cidadania na Jordânia de 2004 a 2008 e que pelo menos outras 20 mil permanecem vulneráveis, especialmente as que em algum momento se mudaram ao exterior atrás de trabalho.
O governo diz que está tentando ajudar, ao solicitar que jordanianos descendentes de palestinos que fugiram da Cisjordânia ou de Jerusalém após a guerra de 1967 mantenham válidos seus documentos israelenses. Isso ganhou maior urgência recentemente, segundo analistas e fontes do governo, por causa da ascensão de um governo israelense de direita, com um chanceler ultraconservador, Avigdor Liberman.
"Não é segredo que alguns elementos em Israel gostariam de ver as áreas palestinas sem as pessoas", disse Nabil Sharif, ministro e porta-voz do governo da Jordânia. "Não queremos ser parte disso."
Críticos e militantes dos direitos humanos, no entanto, veem uma motivação diferente. Afirmam que o governo jordaniano agiu para preservar os seus próprios interesses, tentando agradar jordanianos não palestinos, preocupados com a crescente influência política e econômica dos cidadãos de origem palestina, uma acusação que Sharif negou. Esses críticos dizem também que aparentemente o governo local está assustado com rumores de que a Jordânia seria declarada o lar nacional palestino, como alternativa a um Estado palestino na Cisjordânia e em Gaza.
Os críticos acusam o governo de agir de modo arbitrário, frequentemente dividindo famílias entre cidadãos e não cidadãos, às vezes com base na época do nascimento, e de não oferecer caminhos efetivos para recursos contra decisões relativas à cidadania.
Já faz anos que as autoridades jordanianas manifestam a preocupação em preservar o equilíbrio demográfico nessa nação de 6 milhões de habitantes, dividida de forma quase igual entre pessoas oriundas da margem leste do rio Jordão e as oriundas da margem oeste, a Cisjordânia ocupada.
"O governo não está fazendo isso para apoiar os palestinos no seu direito de retorno", disse Fauzi Samhouri, diretor de uma entidade de direitos humanos em Amã. Em vez disso, afirmou, o governo está reagindo a pressões políticas, porque "algumas pessoas acham que esses procedimentos irão reduzir o percentual da população que é de origem palestina".
Sete homens palestinos que perderam sua cidadania descreveram uma sequência de fatos semelhantes. Eles contaram que tudo aconteceu durante uma interação de rotina com o Estado -ao solicitar uma carteira de motorista, um passaporte ou um certificado de alistamento militar.
O governo diz que isso não tem nada a ver com equilíbrio demográfico, que os números são muito pequenos e que apenas uma fração da sua população palestina está sujeita a esse tipo de revisão. Afirma ainda que esse processo tem ocorrido desde logo depois de 31 de julho de 1988, quando o então rei Hussein proferiu um discurso em que abriu mão de qualquer reivindicação de soberania sobre a Cisjordânia e Jerusalém Oriental.
Um porta-voz militar israelense disse que, sob a lei militar em vigor na Cisjordânia, cidadãos palestinos que deixaram a região após 1967 e antes de 1988 podem perder sua cidadania após três anos, mas depois têm outros três anos para reivindicá-la novamente.O porta-voz disse que decisões a esse respeito são passíveis de recurso perante uma comissão israelo-palestina, mas admitiu que há anos esse comitê não se reúne.


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