As mulheres na Índia estão optando por terninhos de trabalho que se ajustam às formas. No Sudão, uma mulher que vestir calças é mandada para a prisão. Nas capitais da Europa, o lenço de cabeça muçulmano torna-se um para-raios político. Em todo o mundo islâmico, novos estilistas instigam as mulheres a ampliar os limites da moda com roupas que misturam tendências das passarelas globais com costumes muçulmanos.
Nessas sociedades antigas que enfrentam um vendaval de produtos e ideias ocidentais, a mulher, muitas vezes, carrega nas costas as exigências opostas de tradição e modernidade. Seu modo de se vestir transmite muito mais que seu senso de estilo individual. Ela é avaliada pelo que usa ou não usa, seja por seus pais, cunhados, colegas de trabalho, homens grosseiros no ônibus e até por políticos, como ocorre com o debate sobre o lenço de cabeça islâmico.
Às vezes, ela se conforma com a tradição, às vezes a contesta. É o caso da Índia atual, onde uma década de crescimento econômico pujante foi acompanhada de novas oportunidades para a mulher urbana e, ao mesmo tempo, lhe oferece um cardápio de novos visuais.
"Quase todos os dias, eu sinto que este país está mudando", disse Anupama Dayal, uma estilista de Nova Déli cuja coleção de outono propõe vestidos curtos e túnicas frouxas. "E quem muda mais depressa? É a mulher."
Conforme a mulher conquista mais dinheiro, poder e liberdade, seu modo de se vestir geralmente muda. Mas, com maior frequência que os homens, as mulheres veem que suas opções de guarda-roupa são calibradas por expectativas culturais: recato, autoridade, ideais de feminilidade mutáveis.
O que pode conotar tradição para uma ocidental poderia ser um sinal de posição social elevada para uma mulher asiática ou africana.
Na Nigéria, por exemplo, uma estudante colegial está livre para usar jeans justos ou vestidos curtos, mas quando a mulher sobe na carreira profissional raramente é vista com roupas que não sejam as tradicionais do país, cujo custo e artesanato talvez não sejam evidentes para o olhar ocidental.
De maneira semelhante, na Índia uma jovem funcionária de escritório hoje quase sempre usa calças ou ternos. Mas é provável que uma gerente graduada escolhesse um sári.
"Eu realmente acho que o sári me dá muito mais autoridade", disse Ambika Nair, que trabalhou como jornalista e advogada e hoje dirige o ramo de publicações jurídicas da Thomson Reuters na Índia.
A vida das mulheres indianas está em profunda mudança. Há o mesmo número de meninas e meninos matriculados na escola primária. A porcentagem de mulheres no local de trabalho aumentou. As mulheres vivem cada vez mais por conta própria, viajam bastante, adotam crianças como mães solteiras e até se divorciam. Enquanto isso, elas têm de lidar com costumes sociais e religiosos arraigados, enfrentar o assédio sexual e, às vezes, a pura violência.
Como a prosperidade cria uma nova classe de obesos, uma nova consciência sobre estar em forma gerou um novo ideal feminino: magra, firme, em nada parecida com as beldades curvilíneas da antiga Índia, e com roupas adequadas. Os sáris para coquetéis, como são conhecidos, geralmente são feitos de chifom diáfano, às vezes bordado com cristais, talvez combinando com um bustiê.
Em alguns lugares, a globalização exportou as ideias ocidentais de beleza feminina e levou as mulheres a desnudar os corpos. Em outras partes, o ataque de imagens e ideias ocidentais reforçou a tradição, mas as roupas são elegantes.
Na Indonésia, o país muçulmano mais populoso do mundo, o hijab, ou jilbab, como é conhecido, hoje é muito mais comum do que na geração passada. Mas hoje pode ser um lenço de estilista preso por um broche original, ou combinando com elegantes óculos de sol.
"Nós procuramos estilos e tendências no Ocidente e os modificamos para adaptar-se a nossas modestas necessidades", disse Liana Rosnita Redwan-Beer, editora de uma revista em Jacarta.
Zagarpur, hoje baseada em Dubai, começou a desenhar roupas para mulheres como ela: abrigos para corrida com tops mais longos, cobrindo o abdômen, túnicas de seda com estampas vivas, e até um hijab-capuz em uma peça, feito de tecido maleável e respirável. As fãs lhe escrevem para manifestar seu alívio; os críticos às vezes zombam de suas roupas por ser atraentes demais.
"Para mim", insiste Zagarpur, "ser recatada e chique é muito compatível."
Chique não parece ter sido a preocupação de Lubna Hussein, no Sudão, quando foi presa no ano passado acusada de indecência por usar calças, um crime passível de punição por 40 chicotadas sob a versão sudanesa da lei xariá. O tribunal acabou suspendendo a tortura, mas impôs uma multa de aproximadamente US$ 200. Quando Hussein se recusou a pagar, foi enviada para a prisão.
Na Índia, cuja sociedade está se modificando rapidamente, as mulheres têm de fazer opções delicadas o tempo todo.
Suhasini Haidar, uma âncora de televisão, usa um blazer feito sob medida quando está trabalhando. Mas sabe que para um jantar oficial do governo deve vestir um sári. "Existem vários lugares onde seria indelicado aparecer em roupas ocidentais", diz.
Para Dayal, o sári é reservado para momentos de reconhecimento. "Quando eu mais preciso de autoconfiança, tenho de usar um sári", ela diz. "Quando não posso assumir riscos, preciso usar sári -apesar de ter Armanis e Guccis e centenas de Anupamas em meu guarda-roupa."
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