Iates balançam ao longo da orla. Nas mesas das calçadas, sobre toalhas impecavelmente brancas, garrafas de vinho suam dentro de baldes de prata.
A baía de Zaitunay, novo playground do luxo, é a mais nova aposta do Líbano para voltar ao período pré-guerra da década de 1960 -quando Brigitte Bardot era frequentadora habitual e Beirute era um lugar da moda. Para os visitantes árabes que buscam um alívio da tensão na região e para os libaneses satisfeitos por serem poupados da tempestade, Beirute está de volta.
"O Líbano reúne o europeu, o mediterrâneo, o Oriente e o Ocidente", disse Noor al Tai, passeando pelo calçadão com minissaia de couro, botas até as coxas e um colete de pele. Ela explica por que Beirute foi o destino lógico quando ela fugiu da violência no Iraque, o seu país. "Há uma atmosfera muito amistosa aqui."
Os moradores de Beirute mal se dão conta de que a baía de Zaitunay fica sobre a Linha Verde, a letal terra de ninguém que separava o leste do oeste da cidade durante os 15 anos da guerra civil libanesa.
Na cabeça de muitos ocidentais, o Líbano continua congelado em antigas imagens: massacres sectários, reféns amarrados a radiadores, a invasão israelense, a fumaça se erguendo sobre os prédios da orla. Mas, ao menos para os ricos, o país há muito tempo recuperou seu espírito de diversão e glamour.
"Este país não muda. As pessoas gostam da vida", disse a psicóloga síria Sonia Bailouni, tomando sol.
As mesmas divisões que causaram a guerra civil libanesa podem ter ajudado o país a se isolar das revoltas árabes do último ano. A guerra terminou em 1990, após uma rígida partilha do poder entre os grupos religiosos.
O sistema é ineficiente e propenso a crises, mas permite a dissidência e mantém o Estado fraco, com pouca capacidade para intimidar ou se impor. Em meio à desconfiança mútua entre as facções libanesas, não há uma autoridade única contra a qual se insurgir.
E não é que o turismo no Líbano não tenha se ressentido. A ocupação hoteleira caiu de 68% em 2010 para 55% nos primeiros nove meses de 2011, segundo a empresa Ernst & Young.
Muitos ocidentais não percebem que o Líbano continua seguro e divertido. Turistas árabes e iranianos receiam em passar de carro pela Síria, de longe a rota mais barata.
Mas a crise seria bem mais grave se não fosse pelos viciados na "joie de vivre" de Beirute: os libaneses da diáspora (os sauditas e jordanianos em suas peregrinações sazonais para fugir do calor) e os moradores ricos de Beirute. Para esses nichos, até a guerra de 2006 contra Israel foi apenas uma perturbação temporária e bares, restaurantes e hotéis reabriram suas portas enquanto ainda havia destroços dos bombardeios israelenses nas ruas.
Há benefícios decorrentes do fato de o Líbano ser um refúgio para os sírios, o que ajuda a compensar os prejuízos hoteleiros. O ministro libanês do Turismo disse a um jornal local que os sírios vão passar o fim de semana em Beirute para evitar os confrontos após as preces da sexta-feira.
Beirute é também um destino para o capital. Empresários sírios têm transferido dinheiro para bancos libaneses e investidores fugindo da crise financeira de 2008 em Dubai contribuem para manter os preços imobiliários elevados. A iraquiana Tai disse que ela e seus irmãos transferiram sua empresa de contabilidade para Beirute em 2004, depois que o bairro deles em Bagdá virou um campo de batalha, com a invasão das tropas americanas ao Iraque.
Bailouni está trazendo parentes de Aleppo, na Síria, na crença de que o conflito não se espalhará para o Líbano. "Já passamos por tudo e pelo pior", disse ela.
Mas alguns libaneses anseiam por uma ebulição num país que, apesar de tanta diversão, continua corrupto e estagnado. Um jornalista libanês explicou assim a ausência de uma "Primavera Libanesa": "Somos preguiçosos e somos sectários".
Os líderes libaneses se esforçam para manter a paz política. O mais poderoso partido do país, o Hizbollah, oficialmente apoia o presidente da Síria, Bashar Assad. Na semana passada, porém, o líder da legenda, Hassan Nasrallah, admitiu em entrevista a um canal russo de TV ter tentado mediar um cessar-fogo com a oposição síria.
Partidos rivais ficaram ao lado dos rebeldes sírios e até o líder druso Walid Jumblatt (parceiro de coalizão do Hizbollah) chama Assad de carniceiro. No entanto, tais disputas mal interferem na política local: os partidos relutam em desafiar o sistema no qual disputam cargos.
Na orla da baía de Zaitunay, Dina Erfan, uma agente de viagens do Cairo, cumprimentava amigas libanesas jogando beijos no ar. Ela havia acabado de chegar, para dar um tempo da tensão política no Egito.
"Aonde mais eu iria?", disse ela. "Síria? Líbia?" Uma amiga riu. "Talvez no ano que vem", disse.
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