Autoridades do Iraque têm feito uma "caça às bruxas" contra os homossexuais, com perseguição sistemática e mortal a homens e mulheres, revela uma reportagem investigativa da BBC.
Ativistas dizem que centenas de homossexuais foram mortos nos últimos anos, enquanto o governo, que conta com apoio ocidental, tem ignorado o assunto. Para as Nações Unidas, a negligência quanto à violência torna o Estado iraquiano um dos responsáveis pelos crimes.
A investigação da BBC mostra que no Iraque pós-Saddam Hussein ser homossexual - ou mesmo parecer homossexual - pode significar uma sentença de morte no país.
Em alguns casos, homossexuais foram mortos pelos próprios familiares, nas chamadas "mortes pela honra", ou pela ação de milícias. Mas a perseguição também parece ocorrer sob os mandos de forças de segurança oficiais - ainda que o governo se recuse a admiti-lo.
Dezessete homossexuais entrevistados pela reportagem se disseram perseguidos individualmente, e todos dizem ter amigos ou parceiros mortos.
Ainda que o governo diga que desarticulou milícias que fazem esse tipo de perseguição, um ex-policial, que conversou com a BBC em condição de anonimato, disse ter abandonado a corporação depois de ter recebido ordens diretas para prender dois homossexuais. Um deles foi morto na cidade onde era "procurado".
"Durante a ocupação americana, estávamos muito ocupados. Agora, com tempo livre, a polícia passou a perseguir gays", disse o ex-policial.
Com isso, a comunidade gay do Iraque fica cada vez mais escondida e assustada. Uma vez que um homossexual entra na "lista de procurados", ele ou ela não tem para onde escapar.
Muitos relatam buscas oficiais em suas casas, além de casos de estupro. Outros temem ser identificados nas dezenas de postos de checagem que têm como objetivo garantir a segurança de Bagdá. "Não tenho liberdade. Não posso viver a minha vida", disse um deles à BBC.
Há apenas um abrigo para homossexuais em Bagdá, com capacidade para três pessoas. Outros abrigos foram alvos de ofensivas e fechados pelo governo.
Segundo um relatório de 2009 da ONG Human Rights Watch, é possível que centenas de homossexuais homens tenham sido mortos desde a invasão americana, em 2003.
Mas o Ministério de Direitos Humanos do Iraque afirma não poder ajudar os homossexuais, porque o grupo não é considerado uma minoria sob os olhos do governo. Alega, porém, que denúncias de morte foram encaminhadas ao Ministério do Interior.
O premiê iraquiano, Nuri al-Maliki, que tem comando direto sobre o Ministério do Interior, não respondeu aos pedidos de entrevista. Seu porta-voz, no entanto, disse à BBC que não existe nenhuma perseguição sistemática a homossexuais e que estes devem "viver suas vidas normalmente".
Ao mesmo tempo, no distrito de Cidade Sadr, em Bagdá, um clérigo islâmico disse à BBC que o "terceiro sexo" - como a homossexualidade é chamada - é "totalmente rejeitado pelo islã".
Ainda assim, a cultura religiosa e conservadora do Iraque não explica por si só a perseguição aos gays, dizem analistas.
No Líbano, por exemplo, o grupo radical Hezbollah é razoavelmente tolerante à homossexualidade. No Irã, onde a prática homossexual é ilegal e comumente punida, a cena "underground" gay também é tolerada. Até na ultraconservadora Arábia Saudita a perseguição não parece chegar nos níveis do Iraque.
Durante o governo de Saddam (1979-2003), homossexuais desfrutaram de algum grau de liberdade e segurança e, após a invasão americana, grupos liberais esperavam que essa liberdade aumentasse.
Mas forças conservadoras islâmicas que ganharam o poder se mostraram resistentes a aceitar valores supostamente ocidentais, incluindo a homossexualidade.
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