Numa das principais avenidas de Herat, cidade no extremo oeste do Afeganistão, há vários prédios com uma bandeirinha do Irã cravada na porta.
Um dos edifícios é uma clínica médica. Outro, na mesma calçada, abriga uma instituição de caridade. No lado oposto da rua, a bandeira iraniana indica uma escola islâmica xiita. Mais ao norte fica um centro de ensino técnico.
Financiadas pelo Irã, essas instituições são a face mais visível da tentacular presença iraniana na terceira maior aglomeração urbana afegã, situada a uma hora e meia de carro da fronteira entre os dois países.
Herat é cada vez mais vista como portão de acesso da influência de Teerã no Afeganistão, onde opera uma agenda política, econômica e religiosa contrária aos interesses americanos na região.
Nem sempre sinalizada com bandeira, a atuação do Irã dissemina-se também de forma mais discreta.
É preciso observar a embalagem dos produtos no comércio de Herat para notar que quase tudo leva a marca "Made in Iran", provocando uma grande irritação no empresariado local.
"Herat tem um polo industrial que produz de tudo, de refrigerante a remédios, mas o Irã nos inunda com itens fabricados a custo menor, destruindo a economia e o emprego", diz Hamidullah Khamem, diretor da Associação Industrial de Herat.
O número de operários nas fábricas locais caiu de um total de 45 mil em 2006 para atuais 15 mil devido ao suposto dumping iraniano, segundo relata Khamem.
Laços históricos e culturais favorecem Teerã. Parte do Império Persa até o século 19, Herat mantém forte presença da etnia hazara, que fala farsi e segue o islã xiita -ramo predominante no Irã mas que é minoritário na população afegã.
Boa parte dos clérigos de Herat, cidade mais pacífica do Afeganistão, são formados em Meshed, capital espiritual do Irã.
Herat pavimenta o caminho iraniano até a capital Cabul, onde a inserção toma outras formas.
O serviço secreto afegão sustenta que as emissoras de TV Tamadon e Noor, entre as maiores do país, são bancadas por Teerã. Um jornalista que se demitiu da Tamadon corroborou a acusação.
A inteligência também avalia que ao menos 40 dos 249 deputados recebem dinheiro para votar em favor da agenda iraniana.
Em 2010, o próprio presidente Hamid Karzai, um aliado dos EUA, admitiu publicamente receber malas de euros de Teerã em nome da governança nacional.
Mas autoridades afegãs também já fizeram duras críticas aos iranianos pelo suposto envio de armas ao Taleban, grupo insurgente que combate a presença dos norte-americanos e de seus aliados no Afeganistão.
Embora inimigos históricos com agendas opostas, inclusive no aspecto religioso, o Taleban e o Irã selaram um pacto antiamericano, segundo analistas e diplomatas que conhecem a região.
Teerã nega apoiar o Taleban e diz que a instabilidade afegã é causada pela ocupação militar estrangeira, não pelo investimento realizado por iniciativa dos iranianos no país.
O Irã afirma ter gasto ao menos US$ 500 milhões em favor do desenvolvimento do Afeganistão -como estradas e escolas, entre outras coisas- e cita como exemplo de boa vontade o abrigo dado a 800 mil refugiados afegãos, que foi elogiado por representantes da ONU.
Às vésperas da retirada americana do Afeganistão, em 2014, a deputada Arian Youn resume o sentimento de muitos afegãos: "Só caminharemos sobre nossos pés quando alcançarmos a reconciliação com rebeldes e explorarmos nossos recursos econômicos. Hoje até a eletricidade é importada do Irã".
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