Quando o Museu Nacional da China e o Museu Britânico decidiram colaborar numa exposição em Pequim para celebrar dois eventos importantes de 2012 -as Olimpíadas de Londres e o centenário do museu chinês-, optaram por focar algo que exerceu papel crucial na sorte dos dois países: a porcelana.
"A China se orgulha muito de ter inventado a tecnologia da fabricação de porcelana", disse Jan Stuart, diretora do departamento da Ásia no Museu Britânico. "Ela quis destacar esse fato para o público internacional e chinês."
Foram ceramistas da dinastia Song (960-1279) em Jingdezhen que descobriram o segredo da produção da porcelana, quando acrescentaram caulim à pedra chinesa usada para produzir outras cerâmicas e aqueceram os fornos a temperaturas superiores a 1.300°C. O material resultante era branco, forte, translúcido e brilhante, permitindo a produção de vasilhames cheios de detalhes que possuíam potencial ímpar para decoração e que deram lugar a uma demanda sem precedentes.
"A porcelana foi a primeira mercadoria realmente global", disse Stuart. "Ela passou a ser transportada para todo lado, como parte da economia moderna e do comércio de prata."
A porcelana exerceu um impacto espetacular em quase todo lugar para onde foi. Sua beleza etérea e resistência surpreendente levaram alguns a lhe atribuir poderes mágicos. Em uma cultura do sudeste asiático, acreditava-se que ela fosse "filha" de estrelas cadentes, em outra, dizia-se que ela curava os doentes e convocava os espíritos.
O Oriente Médio, que tinha sua tradição própria de cerâmicas sofisticadas, foi durante anos o maior mercado externo da cerâmica Song. A região aderiu rapidamente à porcelana e aos mercadores muçulmanos chineses que administravam a chamada "rota da cerâmica", que passava pelo mar, introduziram o cobalto do Oriente Médio que possibilitou a criação da porcelana azul e branca, marca registrada da dinastia Ming.
À medida que a demanda aumentava, as oficinas de Jingdezhen foram ficando mais e mais especializadas: cada objeto de porcelana passava pelas mãos de cerca de 70 artesãos. Alguns deles se limitavam a pintar as beiradas azuis nos vasos.
Pelo menos uma peça de porcelana tinha chegado à Europa até o ano de 1300, mas as maiores exportações só começaram no século 16, quando mercadores primeiro portugueses, depois holandeses e ingleses começaram a realizar o transporte dela -muitas vezes como lastro em embarcações carregadas de chá e seda-, desencadeando a "paixão pela porcelana" que deu nome à mostra atual.
A exposição, que ficará até 6 de janeiro, também tem a curadoria do Museu Victoria & Albert -é a primeira vez que essas instituições exibem suas coleções de porcelana chinesa em conjunto. A primeira parte da exposição é dedicada às cerâmicas Ming e Qing para exportação. Embora a maioria fosse azul e branca, algumas foram feitas por encomenda de europeus ricos.
Uma seção da exposição é dedicada a porcelanas chinesas antigas colecionadas por europeus. Alguns colecionadores compravam ao atacado e usavam porcelana para decorar virtualmente tudo, chegando a erguer "palácios de porcelana", mas outros adotavam uma abordagem mais estudada, formando coleções de valor inestimável.
Mas os colecionadores chineses nunca demonstraram o mesmo interesse pela porcelana britânica ou a de outros fabricantes europeus. Em vez de porcelana, era prata que deixava os cofres britânicos para comprar o chá e a porcelana cobiçados por cada vez mais cidadãos britânicos -até que comerciantes britânicos estancaram a sangria de prata, enviando ópio à China, uma ofensiva comercial que acabou levando à guerra.
A mostra "Paixão pela Porcelana" exibe o lado positivo desses intercâmbios culturais.
"Quero que as pessoas entendam quão importante a China tem sido na imaginação dos ocidentais, mas que também vejam alguns dos estilos particulares do Ocidente", disse Stuart.
"Esta é uma oportunidade para pessoas na China verem como algo que os chineses iniciaram acabou por ganhar vida própria."
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