Com a chegada do
secretário de Estado americano John Kerry ao Japão, o primeiro-ministro Shinzo
Abe está causando agitação. Conhecido por seus esforços agressivos para reviver
a economia do Japão, sua retórica nacionalista e por sua abertura ao poderio
militar, ele também está pressionando o Japão a ser mais assertivo em direitos
humanos.
Apesar de uma
democracia vibrante em casa, os diplomatas que guiam a política externa do
Japão são famosos por sua cautela em direitos humanos. Para evitar perturbar
relações amistosas com outros países, prejudicar os interesses econômicos do
Japão ou correr o risco de ouvir críticas ao sobre o passado de guerra do
Japão, eles discutem direitos humanos, se é que o fazem, apenas discretamente,
atrás de portas fechadas. Tóquio geralmente vota com seus aliados ocidentais em
assuntos de direitos humanos na ONU, mas quase nunca toma a iniciativa, com
medo de se expor.
Abe pode estar
mudando isso. Logo após chegar ao poder, ele ordenou aos diplomatas japoneses
para que assumissem a liderança no esforço do Conselho de Direitos Humanos das
Nações Unidas para estabelecer uma comissão de inquérito para reunir evidências
dos crimes da Coreia do Norte contra a humanidade.
Os governos
japoneses sempre enfrentaram pressão doméstica para resolver os casos de seus
cidadãos abduzidos por Pyongyang décadas atrás, aparentemente para ensino da
língua japonesa para espiões coreanos. Mas de volta à iniciativa da ONU, Abe
teve que aceitar que o destino dos abduzidos refletia a negação sistemática dos
direitos de qualquer um na Coreia do Norte. Essa é uma conclusão razoável, mas
nenhum governo japonês anterior esteve disposto a chegar a ela.
Muitos outros
governos se mostraram desinteressados a respeito de uma comissão de inquérito
para a Coreia do Norte. Alguns reprovavam a despesa (modesta). Outros
questionavam sua utilidade. Outros temiam desviar a atenção do programa nuclear
norte-coreano.
Trabalhando com
a Coreia do Sul, o Japão confrontou esse ceticismo. E foi bem-sucedido. No mês
passado, o Conselho de Direitos Humanos lançou por unanimidade uma comissão de
inquérito. Os líderes norte-coreanos agora estão notificados de que evidências
de seus crimes serão oficialmente coletadas, o que significa a possibilidade de
julgamentos internacionais se não mudarem seu comportamento.
Essa nova
assertividade em direitos humanos foi prenunciada em um discurso feito por Abe
em janeiro. Ele abraçou uma política externa construída em torno dos
"valores fundamentais da liberdade, democracia, direitos humanos básicos e
o estado de direito". Um líder japonês raramente fez um pedido desses,
muito menos agiu a respeito.
Mas Abe terá
muita dificuldade para implantar sua visão. No mês passado, a poderosa
burocracia da política externa do Japão resistiu a uma resolução paralela da
ONU a respeito do fracasso do Sri Lanka em investigar seriamente os ataques
indiscriminados por seus militares, que causaram a morte de 40 mil civis nos
meses finais de seu conflito com o grupo rebelde Tigres da Libertação do Tâmil
Eelam, quatro anos atrás.
A resolução foi
aprovada por grande maioria. Mas o Japão, agindo com sua cautela tradicional,
se absteve.
Nós perguntamos
ao principal diplomata do Japão no Sri Lanka a respeito de como o Japão pode
estar tão fora de sincronia com seus pares. Ele apresentou várias desculpas,
mas o fator principal parecia ser o desejo de manter boas relações com o Sri
Lanka, apesar da falta de evidência de que a diplomacia discreta do Japão tenha
mais influência do que a pressão visível da ONU.
Talvez o maior
desafio de direitos humanos do Japão seja a China. Dado o passado de guerra do
Japão, ele teve particularmente dificuldade em levantar preocupações de
direitos humanos na China, mas após quase 70 anos, é hora de um líder forte
superar esse obstáculo.
Como muitos
outros, o Japão limita o assunto a aproximadamente um "diálogo sobre
direitos humanos" uma vez ao ano. Geralmente envolve burocratas se
encontrando sem nenhuma pessoa de fora presente e com pouca revelação sobre o
que foi dito. Durante o restante do ano, as autoridades podem citar essa
charada para evitar tratarem da repressão na China.
O resultado não
faz bem aos direitos do povo chinês e nem para a reputação do Japão. Resta ao
povo chinês pensar no Japão como preocupado em supostamente tentar roubar
"suas ilhas", mas indiferente em relação aos seus direitos. Na era do
Sina Weibo, a versão chinesa do Twitter, e ataques permitidos pelo governo
contra a embaixada japonesa, a opinião pública chinesa importa.
Por décadas, a
política externa do Japão foi construída em torno do país como uma nação
doadora, com poucas condições impostas. O Japão foi extraordinariamente
generoso, mas a China agora também pode jogar esse jogo, com bolsos bem mais
profundos.
Abe parece
reconhecer que o Japão está desperdiçando seu maior ativo na política externa –
sua democracia. Construir uma política externa em torno da promoção da
democracia – e dos direitos essenciais para ela – exigirá a superação do ponto
de vista esclerosado dos mandarins do Ministério das Relações Exteriores. A
resposta à iniciativa do Japão para a Coreia do Norte mostra que grande parte
do mundo apreciará Tóquio assumindo esse papel de liderança. John Kerry deve
encorajar isso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário