Em Gwangju, nas últimas semanas todos tentavam adivinhar se a presidente Park Geun-hye iria participar das comemorações do levante do dia 18 de maio de 1980. Sua visita a essa cidade da província de Jeolla do Sul, bastião histórico dos opositores da ditadura de seu pai, Park Chung-hee (1961 a 1979), é altamente simbólica.
Aqui, diferentemente do resto do país, Park não obteve a maioria dos votos durante a eleição presidencial de dezembro de 2012. Gwangju espera dela uma mensagem de reconciliação. Os habitantes continuam marcados pela lembrança desse dia em que o povo, protestando em massa pela democracia, se deparou com a repressão dos soldados paraquedistas enviados sob ordem do chefe dos serviços secretos e futuro presidente (de 1980 a 1988), o general Chun Doo-hwan.
Trinta e três anos depois, a lembrança dos dez dias de intervenção militar permanece vívida. Em Gwangju é impossível escapar dela. A prefeitura ocupa dois prédios, um de cinco andares e outro de dezoito, uma alusão à data do levante.
Foi criado um cemitério nacional e reconstruíram um acampamento do exército, com uma riqueza de detalhes em cenas de torturas e terríveis condições de cárcere. "Éramos obrigados a ficar dezesseis horas por dias ajoelhados sem nos mexer", lembra Song Sun-tae, um dos sobreviventes da repressão. "Os soldados passavam o tempo gritando que íamos morrer".
"Essa repressão foi uma mini-guerra da Coreia"
O levante foi uma consequência das expectativas de democratização surgidas após o assassinato de Park Chung-hee em outubro de 1979. A tímida abertura decidida por seu sucessor Choi Kyu-ha foi esmagada por um golpe militar, em dezembro. A lei marcial foi imposta no dia 17 de maio de 1980. No dia seguinte, Gwangju se rebelou. O exército interveio uma primeira vez. Os soldados atiraram nos manifestantes e atacaram, retalhando com baionetas o peito de jovens mulheres.
Apesar disso, as tropas foram repelidas para fora da cidade. Os manifestantes se armaram e a cidade se organizou. "As mulheres preparavam a comida", lembra Song, "os supermercados distribuíam os alimentos de graça".
Sem eletricidade, água ou telefone, a cidade viveu alguns dias isolada do resto do país. A imprensa se limitou a reproduzir as declarações dos dirigentes que falavam em "tumulto organizado por elementos impuros" e mencionavam a presença de soldados norte-coreanos.
Por fim, no dia 26 de maio, às 16h10, e com aprovação dos americanos, o governo lançou 20 mil soldados paraquedistas sobre Gwangju. A repressão foi terrível. Mais de 2.000 prisões, centenas de mortos, muitos deles estudantes.
Song, considerado o "secretário secreto da rebelião estudantil", foi preso. Foram interrogatórios e mais interrogatórios. "Eles queriam saber quais eram minhas ligações com Kim Dae-jung, como ele se financiava", lembra Song.
Na época, o futuro presidente do país (1998-2003), oriundo de Jeolla, era um símbolo da luta pela democracia. Depois dos incidentes de Gwangju, ele foi condenado à morte. Já Song passou vários anos na cadeia. "Essa repressão foi uma mini-guerra da Coreia", ele lembra.
A tragédia, chamada pelo poeta Kim Jun-tae de "cruz para o país", foi vivida de forma ainda mais cruel na região, pois reavivava um antagonismo milenar. Na chamada época dos "três reinos", Jeolla ficava no território do antigo reino de Silla.
O primeiro rei da dinastia Goryeo (936-1392), que derrubou o reino de Silla, havia aconselhado nunca conceder altos cargos para pessoas originárias de Jeolla, uma recomendação seguida pela maior parte dos dirigentes sul-coreanos.
A modernização lançada nos anos 1960 por Park Chung-hee, oriundo de Daegu, no centro-leste, meio que ignorou a província de Jeolla. Kim Chan-ho, secretário-geral da Fundação do 18 de Maio, não hesita em lembrar que a presidente Park "vem do leste". Mas ele espera que sua vinda finalmente permita "restaurar a harmonia".
Como uma conciliação, que o julgamento e a condenação em 1997 de Chun Doo-hwan e de Roo Tae-woo, então general da repressão de 1980, nunca permitiu completamente.
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