Folha de São Paulo
Terça-feira, 17 de setembro de 2013
China fecha o cerco na internet com lei contra 'rumores'
Governo alega que objetivo da nova legislação é coibir a difamação, mas dissidentes reclamam de perseguição
Segundo ativistas, cerca de cem pessoas foram presas nas últimas semanas por comentários na web
Segundo ativistas, cerca de cem pessoas foram presas nas últimas semanas por comentários na web
MARCELO NINIO
DE PEQUIM
Está aberta a caça à difamação na internet chinesa.
Uma nova lei destinada a coibir "rumores" na internet entrou em vigor na
semana passada, e ativistas acusam o governo de criar um pretexto para
apertar o cerco à liberdade de expressão no país.
Pelo código de conduta imposto pela Justiça chinesa, quem faz
comentários na rede corre o risco de ser enquadrado em quatro crimes:
difamação, criação de distúrbios, prática de negócios ilícitos e
extorsão. A pena pode chegar a três anos de prisão.
A nova interpretação da lei de difamação tem como alvo não só o conteúdo das mensagens, mas seu grau de disseminação na rede.
Os autores de comentários considerados difamatórios serão processados se
eles forem acessados por 5.000 ou mais usuários ou repetidos acima de
500 vezes.
A repressão oficial na internet já vinha se tornando mais rígida antes
da adoção da lei. Segundo ativistas, cerca de cem pessoas foram presas
nas últimas semanas por comentários em microblogs.
A imprensa estatal lançou uma ofensiva para defender a medida. Críticos
da lei devem entender que "liberdade de expressão não é liberdade de
difamação", afirmou um artigo no "Diário do Povo", o jornal do Partido
Comunista.
As explicações não convenceram muitos juristas e intelectuais, que consideraram a lei inconstitucional.
Pu Zhiqiang, advogado especializado em direitos humanos, diz que a lei
contra "rumores" na verdade serve como justificativa para o governo
prender dissidentes.
"Estou furioso", desabafou o advogado à Folha. "Os maiores disseminadores de rumores na China são o Departamento de Propaganda, a mídia oficial e a polícia".
Além de verem na lei um instrumento de perseguição política, críticos
dizem que ela é arbitrária e ignora a fluidez da internet, pois os
usuários não controlam a popularidade de seus comentários.
Os protestos se estenderam a intelectuais que integram o coração do
Estado comunista --como Cai Xia, professora da Escola do Comitê Central
do Partido. Ela alertou que a repressão crescente na internet poderá
levar a uma explosão de protestos de rua, justamente um dos maiores
temores do governo.
A ofensiva da mídia oficial para respaldar a lei incluiu a confissão
pública de um dos mais populares comentaristas da internet chinesa.
Charles Xue, um investidor bilionário, angariou 12 milhões de seguidores
no Weibo (versão chinesa do Twitter) com comentários controvertidos
sobre temas sociais e políticos.
Mantido em prisão domiciliar desde agosto acusado de contratar
prostitutas, Xue apareceu na emissora estatal CCTV reconhecendo "os
perigos" da liberdade de expressão sem limites.
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