Para um estrangeiro, aprender a ler na China pode ser como o jogo dos
sete erros, aquele em é preciso encontrar as diferenças entre duas
imagens quase idênticas.
Compare, por exemplo, o caractere para "especial" (特) e o para "apertar" (持):
é o mesmo, a não ser pelo tracinho a mais na parte superior esquerda
do primeiro, e pelo tracinho horizontal no pé esquerdo do segundo. Essas
(para o olho estrangeiro) mínimas diferenças conferem significados
distintos a cada um deles. Também são pronunciados de forma diferente: o
primeiro, "te" (som fechado), e o segundo, "chi" (som aberto). Na
primeira vez que me deparei com os dois caracteres, minha resposta foi
apenas " não é justo".
Memorizar milhares de caracteres não é fácil. Durante os seis
anos de estudo obrigatórios, os alunos de escolas chinesas passam várias
horas por dia decorando pelo menos 3 mil caracteres, o mínimo para se
ler o jornal. No fim do ciclo, as variações no domínio da leitura são
muitas.
Infelizmente, há uma minoria que não aprende a ler como
deveria - na China e em muitos outros lugares. A dislexia é considerada
um problema grave de leitura entre estudantes de inteligência normal. De
acordo com a Dyslexia Internacional, organização de apoio a disléxicos,
entre 5% e 15% da população sofrem com esse distúrbio, dependendo do
critério usado para se definir dislexia. Isso significa que 700 milhões
de pessoas em todo o mundo apresentam traços desse problema.
Até pouco tempo atrás, assumia-se que a dislexia tinha origem
biológica, independentemente do idioma de leitura. Mas ser disléxico na
China é diferente de ser disléxico nos Estados Unidos, segundo Wai Ting
Siok, da Universidade de Hong Kong. Seu grupo de estudo mostrou que
tanto a leitura como a dislexia ativam partes diferentes do cérebro em
usuários de alfabetos de letras, como o inglês, e de alfabetos icônicos,
como o chinês. A leitura em chinês usa mais a parte frontal do
hemisfério esquerdo do cérebro, enquanto a leitura em inglês usa mais
uma parte posterior do órgão.
Aprender a ler com um alfabeto de letras implica conhecer o
som das palavras, a visão mapeia o som de cada vocábulo. Quando se trata
de um alfabeto iconográfico, como o chinês, a visão mapeia a imagem do
caractere para memorizar seu sentido. A fonética de cada caractere
chinês não corresponde necessariamente à sua forma, enquanto para ler em
inglês, é preciso decodificar o som de cada segmento da palavra.
"O fato dos disléxicos ocidentais e chineses apresentarem
diferenças na ativação do cérebro durante a leitura pode indicar que
estamos falando de distúrbios diferentes de acordo com a cultura",
analisa Siok. Outra conclusão de seu estudo é que o leitor chinês
disléxico não é necessariamente disléxico em outro idioma com alfabeto
de letras. O contrário também é verdadeiro: alguns ocidentais não
disléxicos podem apresentar o distúrbio ao aprender o chinês ou outro
idioma com alfabeto iconográfico.
Nenhum comentário:
Postar um comentário