Spa, piscina olímpica, sala de ginástica e suítes conjugadas... O
Centro Mohammed-Bin-Nayef, situado no subúrbio de Riad, lembra os
palácios situados às margens do Golfo Pérsico. Mas esse complexo aberto
em 2013 e batizado com o nome do atual ministro saudita do Interior não
abriga nem empresários nem estrelas do show business. Ele é destinado à
reabilitação de jihadistas locais, ex-membros da Al Qaeda que foram
presos ao saírem de Guantánamo ou em operações antiterroristas dentro do
reino.
Esses ex-seguidores de Osama Bin Laden, depois que
cumprem sua pena de prisão, precisam passar alguns meses nesse lugar
estranho, que é uma mistura de sanatório com centro de recuperação.
Entre reuniões de família, aulas de religião, acompanhamento
psicológico, oficinas de pintura e práticas de esporte, é feito de tudo
para recolocar os residentes no caminho certo.
"Em dois anos,
3.000 ex-terroristas islamitas saíram de nossas prisões e só tivemos 10%
de reincidentes", afirma o general Mansour al-Turki, porta-voz da
polícia saudita. "Estamos conseguindo desconstruir os fatores sociais,
psicológicos e religiosos que levam ao extremismo."
A ideia surgiu em meados dos anos 2000. Era a época em que a monarquia
passava por uma onda de atentados e sequestros contra suas forças de
segurança ou alvos ocidentais.
Bin Laden, ele mesmo de origem
saudita, fazia um apelo para derrubar esse regime "ímpio", aliado dos
Estados Unidos. Mohammed Bin Nayef, que era então chefe da inteligência
interna, conduziu a contra-insurreição com punho de ferro. Milhares de
militantes islamitas ou supostamente islamitas foram pegos, às vezes
torturados, e os combatentes que não foram mortos se exilaram no Iêmen
ou no Afeganistão.
Ciente de que a truculência não resolveria, o
chefe do antiterrorismo deu seu aval à criação de um tratamento mais
brando. Era o programa de reabilitação, que acabou se tornando um dos
orgulhos do reino.
O convidado que hoje entra no centro
Bin-Nayef, ainda que um simples jornalista, é acompanhado do começo ao
fim por uma equipe de televisão interna. "Nós recebemos quase 300
personalidades estrangeiras desde 2007", se empolga Mansour al-Qarni,
diretor do "Al-Mounassaha" ("o Conselho"), nome oficial do programa.
"Até o ministro americano da Justiça veio."
O percurso começa
com uma xícara de café amargo em um imenso diwan, salão típico das
sociedades árabes do golfo. Depois o visitante é levado para um
auditório, onde uma apresentação em Power Point o ajuda a se
familiarizar com os métodos da casa.
Em um país tão conservador
quanto a Arábia, estes evidentemente são impregnados em grande parte
pela religião. Sheiks devidamente selecionados são recrutados para
endireitar os fiéis desgarrados.
Durante conversas organizadas
no centro, muitos deles se espantam, por exemplo, com o fato de que o
jihad afegão contra o Exército soviético, nos anos 1980, tenha sido
considerado lícito (halal), enquanto o mesmo engajamento contra os
Estados Unidos no Iraque nos anos 2000 foi decretado ilícito (haram),
assim como aquele contra o regime sírio de Bashar Assad hoje.
"É
bom que os muçulmanos se ajudem, mas existem condições para ser
autorizado a fazer o jihad", proclama Sahl al-Otaibi, um dos religiosos
do centro. "O líder do país precisa dar seu consentimento e os pais, sua
permissão."
Outro tema recorrente de frustração dos residentes é
o sentimento de que o Ocidente está conduzindo uma guerra contra o
islamismo. "Eu lhes digo que cabe ao rei resolver esses problemas.
Depois que um deputado holandês insultou nossa religião, ele ordenou que
fossem restringidas as relações econômicas com esse país."
A
desradicalização à moda saudita é antes de tudo um recondicionamento, um
lembrete das regras nas quais se baseiam o regime de Riad: aos Saud
cabe a política, e ao clero wahhabita, a religião.
O programa também se esforça para recriar um verdadeiro casulo em torno
dos ex-proscritos. Já na prisão e em um ritmo mais contínuo no centro
de reabilitação, eles recebem várias visitas: pai, tio, chefe de tribo,
policial, professor de história. São todas figuras de autoridade que
cercam os futuros arrependidos, assim como os funcionários do centro,
repletos de paternalismo.
"Os recrutas da Al Qaeda se isolam de
sua comunidade", analisa o psicólogo Ali al-Afnan. "Nosso objetivo é
facilitar a reintegração deles."
Depois do "Mounassaha", Khaled
al-Jihani, que combateu em Tora Bora com os talebans antes de passar
quatro anos em Guantánamo, foi recebido por Mohammed Bin Nayef. "Sempre
me lembrarei de suas palavras: 'Você é nosso filho'. Aquilo me
surpreendeu muito. No Afeganistão, haviam me dito que os dirigentes
sauditas não eram muçulmanos."
Logo depois ele recebeu das mãos
de Bin Nayef um carro novinho em folha e um cheque de US$ 800 (cerca de
R$ 1.800), que lhe seria pago todo mês até que ele encontrasse um
emprego. O Ministério do Interior também pagou integralmente as despesas
de seu casamento. "É um programa patriarcal, adaptado a uma sociedade
patriarcal", diz um diplomata estrangeiro.
E não seria o índice
de fracasso superior aos 10% apresentados pelas autoridades? No mês de
maio, uma suposta célula jihadista foi desmantelada, envolvendo cerca de
60 membros, sendo metade deles reincidente. Em fevereiro, 29 sauditas,
suspeitos de pertencerem à Al-Qaeda na Península Arábica (AQPA), haviam
sido extraditados para Riad pelas autoridades iemenitas, sendo que
alguns deles também tinham passagem pelo centro Mohammed Bin Nayef.
A mistura de "mimo" com doutrinação praticada por essa organização atua
sobre perfis como o de Khaled al-Jihani, que foi para o Afeganistão
mais pelo gosto de aventura do que por um zelo religioso. Mas, junto aos
mais fanáticos, essa abordagem parece menos eficaz. Said al-Chihri, um
dos fundadores da AQPA em 2009, morto por um ataque de drone americano
quatro anos mais tarde, também havia sido "reabilitado."
Para
tratar o câncer jihadista, algumas vozes isoladas têm pedido por uma
reforma do sistema de ensino saudita, que é notoriamente arcaico. "É a
raiz de nossos problemas", admite Fouad al-Farhan, um blogueiro liberal.
O Ministério da Educação, que por muito tempo esteve dominado por
fundamentalistas wahhabitas, recentemente foi confiado a um moderado,
Khaled al-Fayçal. Mas levará tempo para mudar a mentalidade das pessoas.
"Meu filho, que tem 10 anos, um dia chegou em casa declarando que
música era 'haram'", conta Mansour al-Turki, o porta-voz da polícia,
frustrado. "´Foi um de seus professores que lhe colocou essa ideia na
cabeça."
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