Num dos maiores protestos pró-democracia em Hong Kong, na noite de 4
de outubro, a cantora pop local Denise Ho apresentou uma nova canção,
"Raise the Umbrella", referência aos guarda-chuvas que muitos
manifestantes do local vêm usando para se proteger contra spray de
pimenta. Dezenas de milhares de pessoas extáticas agitaram no ar seus
celulares ligados.
Mas é pouco provável que Ho cante a mesma música na China continental,
de onde, conforme revelou outro dia, ela recebe 80% de sua renda,
principalmente de shows. Ela não recebe convites para cantar na China
desde o verão, quando começou a demonstrar publicamente seu apoio ao
movimento pró-democracia.
Recentemente, uma grife de moda cancelou um trabalho com ela, sem citar qualquer motivo especial para isso.
Anthony Wong, outro cantor de Hong Kong, contou que dois shows que ele
faria em novembro na China continental foram "adiados por tempo
indeterminado" pelos organizadores e que não tem mais convites pendentes
para se apresentar lá.
"É só um palpite, mas acho que querem nos proibir porque têm medo de
ouvir posições divergentes", disse Wong. "Têm medo que possamos difundir
nossas posições. É uma tentativa de nos punir, claro."
Wong, Ho e outras figuras artísticas de Hong Kong e Taiwan -incluindo
atores como Chow Yun-fat e Tony Leung e um cineasta, Shu Kei- estão
entre os rostos mais reconhecíveis vistos nos protestos que ocupam
partes de Hong Kong há semanas. Representantes da mídia estatal chinesa
os acusam de deslealdade a seu país.
Fotos de uma lista que continha os nomes de Anthony Wong, Denise Ho e
outros artistas circularam recentemente nas mídias sociais. Consta que
seria uma lista negra enviada a veículos de mídia noticiosa e empresas
de entretenimento da China continental, com instruções de não mencionar
ou citar os artistas incluídos.
Uma celebridade americana, o saxofonista de jazz Kenny G, parece ter se
envolvido em controvérsia quando postou na internet fotos dele próprio
em um dos locais dos protestos.
Mais tarde, o músico, que tem muitos fãs na China continental, deletou
as fotos e divulgou declarações dizendo que não teve a intenção de
manifestar apoio aos protestos. Num comentário, a agência de notícias
estatal, a Xinhua, deu a entender que haverá outras consequências para
as celebridades de Hong Kong.
"Vocês violaram os princípios de 'um país, dois sistemas', contestaram a
autoridade do partido central, ignoraram a Lei Básica e ganharam muito
dinheiro, mas depois se voltaram contra sua pátria e a repreenderam",
diz o comentário, citando por nome Denise Ho, Anthony Wong e um ator de
Hong Kong, Chapman To. "É assim que tratam o país que deu à luz a vocês e
os criou?"
"Chapman To e todos, não pensem que podem comer nossa comida e destruir nossas panelas ao mesmo tempo", avisou o comentário.
Não está claro com que rigidez será aplicada uma lista negra, se é que
ela existe. Por exemplo, a emissora pública CCTV não cancelou a
transmissão do filme "Mr. Cinema", de 2007, protagonizado pelo ator
Anthony Wong Chau-sang, cujo nome estaria na lista negra, mas livros do
autor popular Giddens Ko foram tirados das estantes das principais
livrarias da China continental.
Os protestos criaram uma divisão entre as celebridades de Hong Kong.
Muitas delas ficaram em silêncio, enquanto outras criticaram os
protestos abertamente. Numa mensagem postada no Sina Weibo o diretor de
cinema Wong Jing declarou que estava tirando Denise Ho, Chapman To e
Anthony Wong, o cantor, de sua lista de amigos.
Wong prometeu continuar a apoiar os protestos.
"Isso nos afeta muito porque boa parte de minha renda vem da China -mais
da metade", disse. "Mas acho que é isso que precisamos fazer. Nosso
mercado e dinheiro na China não são mais importantes que a necessidade
de dizer o que pensamos."
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