O pior dia de gravação de "Proibido na Síria", segundo seus atores,
foi quando um franco-atirador os atacou em junho. Um pesquisador de
locação se preparava para a filmagem do dia, na cidade de Aleppo, quando
uma única bala o matou instantaneamente.
O elenco e a equipe continuaram sem vacilar. Esse é o acordo quando você
assina o contrato para participar de uma série de TV rebelde em tempos
de guerra: pouco pagamento e nenhuma segurança.
Não foi a única morte. Outro membro da equipe foi ferido em fogo cruzado
e morreu dias depois. É comum que bombas de estilhaços e morteiros
atrapalhem as cenas. Por respeito, a filmagem só para para a passagem de
funerais. No final de cada dia, os técnicos lutam contra as lentas
conexões de internet para enviar as cenas filmadas para os editores do
outro lado da fronteira, em Gaziantep.
Os criadores de "Proibido na Síria", programa que parodia todos os lados
da guerra civil no país, estão desesperados para que seu trabalho tenha
sucesso como um entretenimento lucrativo -e como sátira política.
A maioria das cenas ocorre nas ruas cobertas de detritos de Aleppo ou em
edifícios arruinados. O programa critica o ditador Bashar al-Assad e
seu governo, assim como grupos religiosos que assumiram grande parte da
rebelião. Ele zomba até dos rebeldes do Exército Livre da Síria, que lhe
fornecem segurança quando o programa é filmado em locação.
"Nós caçoamos do modo como eles tratam os civis, mas eles não têm opção
além de nos proteger", disse Yamen Nour, um dos astros do programa.
Nour, 37, que liderou manifestações no país em 2011, considera seu
trabalho no teatro e na televisão uma continuação da revolução por
outros meios.
Tony el-Taieb, 24, o produtor, disse que ele e os cerca de 55 atores e
membros da equipe que trabalham para sua companhia, a Lamba Productions,
acreditam que os revolucionários da Síria devem estabelecer
alternativas culturais àquelas geradas pelo governo de Damasco. "Não
podemos deixar o campo do teatro para o regime", disse ele.
Taieb insistiu que a filmagem, a produção teatral e a maior parte dos
programas de rádio ocorrem em Aleppo, uma cidade que já foi a locomotiva
econômica da Síria e hoje simboliza as divisões intratáveis e a
terrível destruição dos quatro anos de guerra.
A maioria das séries de televisão produzidas por rebeldes não é
registrada entre as novelas e os seriados pelos quais a Síria há muito
tempo é famosa em todo o mundo árabe. "Proibido na Síria" vai ao ar no
Aleppo Today, um canal para revolucionários, mas Taieb disse que a série
é mais vista no YouTube. Comentários no YouTube e no Facebook sugerem
que membros do governo e soldados estão entre seus fãs.
Enquanto a milícia rebelde é majoritariamente sunita, a Lamba
Productions reflete a diversidade étnica e sectária da Síria, com
membros da equipe representantes de alauítas, cristãos, drusos e curdos.
A autenticidade é importante para os produtores, mas também o respeito
ao orçamento. O elenco e a equipe disseram que apoiam a filmagem da
série dentro do que consideram a "Síria libertada", mas também percebem
que não podem pagar por muitos takes.
As complicações resultantes são visíveis em "Gênio, gênio", um dos
episódios mais populares desta temporada, que mostra um gênio abobalhado
que recebe desejos pungentes mas cômicos de moradores de uma Aleppo
apocalíptica. "O passaporte que você me deu era falso!", queixa-se um
sírio infeliz, interpretado por Jihad Saka Abu Joud, 32, que encontrou
uma lâmpada mágica.
"Desculpe", responde o gênio, interpretado por Nour. "Meu fornecedor é um idiota."
Um morteiro de verdade explode ao fundo, e uma nuvem de fumaça aparece
no quadro. O gênio diz sua fala seguinte sem fazer pausa. Abu Joud pisca
os olhos e depois se recupera. A tomada continua.
A maioria dos atores é procurada pelo governo. Enquanto filmar durante uma guerra civil não é ideal, há pelo menos um benefício.
"Se não houvesse guerra, nosso trabalho demoraria muito mais", disse Nour.
"Pode imaginar quanto tempo levaria para construir o cenário de um
prédio destruído?", disse Abu Joud. "Graças à guerra, tudo está pronto
para filmar."
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