sábado, 22 de agosto de 2015


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À medida que conquistou mais territórios no Afeganistão neste ano, o Taleban juntou sua ofensiva militar a uma ofensiva publicitária. Seu argumento é mais ou menos o seguinte: aprendemos as lições de quando estivemos no poder e estamos preparados para ser mais moderados.
Nas conferências internacionais, delegados do Taleban -famoso por proibir as meninas de irem à escola durante o seu regime, que durou de 1994 a 2001- salientaram sua disposição em se reunir com autoridades do sexo feminino. As posições linha-dura foram se suavizando.
No entanto, para entender como o Taleban governaria, é preciso considerar o caso do distrito de Baghran, na província de Helmand. Lá, onde os talebans nunca deixaram o poder, as velhas políticas rigorosas dos anos 1990 ainda estão em pleno vigor.
Homens são presos se rasparem a barba, e há controles policiais para verificar se algum corte de cabelo extravagante se esconde sob turbantes. As mulheres não têm liberdade para viajar.
"Em Baghran, você se sente como se estivesse em um miniemirado do Taleban", disse o comerciante Esmatullah Baghrani, 45.
O celular não funciona em Baghran, refletindo os desejos do Taleban. Em vez disso, as pessoas se comunicam com o resto do mundo em alguns "escritórios de chamadas públicas" -telefones em lojas perto do bazar.
Em mais de uma dúzia de entrevistas com os homens que atenderam a esses telefones e também com homens que estavam por perto, um raro esboço da vida no reduto mais protegido do Taleban começou a surgir. O "The New York Times" também entrevistou pessoalmente moradores de Baghran em Lashkar Gah, a capital provincial.
Provavelmente não há nenhum outro lugar no Afeganistão mais submetido ao regime do Taleban do que Baghran. "Você tem que obedecer às regras", disse o comerciante Omar Khan, 35. "Você precisa viver da maneira que o Taleban quer que você viva: precisa vestir a roupa adequada e um turbante, deixar crescer a barba, fazer suas preces numa mesquita cinco vezes por dia, evitar ouvir música e evitar conversas desnecessárias com as pessoas."
Ainda assim, o governo taleban tem se mostrado atraente, ou pelo menos tolerável, para muitos camponeses afegãos que vivenciaram décadas de guerra. Moradores de outras partes de Helmand têm procurado a relativa segurança de Baghran, migrando para lá.
As execuções públicas foram interrompidas em Baghran em 2007, após um ataque aéreo americano que matou um grande número de talebans e moradores que se reuniam para assistir a uma delas, conforme lembraram alguns entrevistados. Mas, na maioria dos aspectos, as restrições sociais que fizeram o Taleban se tornar um pária internacional durante o seu regime foram ressuscitadas na íntegra em Baghran.
As mulheres só saem de casa com seus maridos ou familiares do sexo masculino, e mesmo assim só para irem ao médico ou a alguns outros destinos autorizados. Não há escolas para meninas -a educação se limita ao sexo masculino. O Taleban transformou escolas em madrassas (escolas corânicas), que os meninos geralmente frequentam por três anos antes de voltarem às lavouras das suas famílias.
O Ministério para a Promoção da Virtude e Prevenção do Vício, outrora famoso por espancar mulheres que saíam de casa e homens que tocavam música, retomou as patrulhas em Baghran. Agentes de prevenção do vício costumam andar com tesouras para eliminar cortes de cabelo considerados excessivamente vaidosos.
Apesar das regras, muitos moradores de Baghran assumem os riscos e continuam a se reunir para jogar baralho. Os rádios são onipresentes e tolerados, apesar das novas emissoras, como a BBC Pashto, a rádio Mashal e até a Voz da América. "Não deveríamos ouvir música, mas, às vezes, quando os talebans estão todos recolhidos, nós escutamos", disse um homem. Ainda assim, a principal prisão de Baghran costuma ter entre 100 e 200 detidos por infrações desse tipo, como é o caso de Nazir Ahmad, 19, que passou três dias preso por causa dos seus cabelos cacheados.
O Taleban, que tem um robusto braço de propaganda, raramente fala sobre Baghran. Isso pode ser em parte por causa da importância da região no lucrativo negócio de narcóticos da insurgência.
Algumas autoridades do Taleban sugerem que o movimento se tornou mais moderado. Por exemplo, o grupo não se empenha tanto em combater a televisão e a música, agora que os celulares estão por toda parte. Ringtones com temas alusivos ao Taleban se tornaram comuns. O próprio departamento de propaganda do Taleban, que fornece vídeos e fotos de comandantes insurgentes e de militantes suicidas no campo de batalha, zomba da antiga proibição da fotografia.
"Os talebans perceberam que impor leis islâmicas pela força não vai fazer as pessoas nos admirarem", disse um comandante do Taleban chamado Fazlullah, que opera no extremo noroeste do Afeganistão. "É o bom governo que irá conquistar os corações e as mentes das pessoas."
Apesar de as formas mais severas terem prevalecido em Baghran, as queixas dos moradores muitas vezes têm a ver com privações presentes em todo o país: a falta de bons médicos e a necessidade de viajar a outros distritos para comprar alimentos básicos.
Alguns se disseram tristes pela falta de oportunidades para seus filhos, muitos dos quais trabalham nas plantações de ópio. Muitos moradores disseram que em geral estão satisfeitos com o governo do Taleban. "Eu acho que eu gosto do jeito do Taleban", disse Baghrani. "Você vive de forma simples, do jeito que foi criado."
Nem todos, no entanto, conseguem viver com tamanha simplicidade. Nos últimos anos, a minoria étnica hazara pôde passar por Baghran com relativa segurança. Mas, há um mês, isso mudou: anciões hazaras e outros disseram que o comandante distrital do Taleban, o mulá Ghulam Hazrat Shahidmal, advertiu que os hazaras já não poderão mais passar.
O único elo que resta entre o governo de Cabul e Baghran é simbólico: o governo ainda nomeia autoridades para o distrito de Baghran. Todos eles servem no exílio. "Eu nunca fui até lá", disse o governador do distrito de Baghran, Salim Rodi, que vive em Lashkar Gah. "Este trabalho é uma piada."

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