Para muitos casais chineses, este Ano do Dragão é um incentivo para ter um filho, pela crença milenar de que crianças que nascem neste período são dotadas de sorte e sabedoria. Só em Xangai, a expectativa é que 180 mil bebês venham ao mundo este ano, um aumento de 10% em relação ao ano passado, de acordo com a comissão de planejamento familiar.
Neste contexto, um mercado acaba ganhando destaque no país: o de barrigas de aluguel. Segundo reportagem do jornal inglês The Guardian, cerca de 10% dos casais chineses sofrem de infertilidade, taxa que apresenta tendência de crescimento, de acordo com uma pesquisa do Ministério da Saúde. Com isso, há um gigantesco mercado em potencial para mães de aluguel.
“Pais que moram em Xangai ou Pequim precisam viajar para cidades distantes, como Wuhan, Harbin e Hohhot para encontrar uma mãe de aluguel e um hospital que se disponha a concluir o transplante”, diz Zhou, um intermediário que pediu que apenas seu sobrenome fosse divulgado.
O contato com os pais interessados no serviço geralmente é feito por meio da internet. Em geral, os agentes precisam encontrar uma ou duas mães de aluguel por mês e ganham cerca de R$ 546 em cada contato, segundo Zhou.
Em dezembro do ano passado, o caso de pais que pagaram cerca de R$ 230 mil para ter oito bebês ganhou repercussão na China, país em que vigora uma política de planejamento familiar que permite apenas um filho por casal. Entretanto, é comum que famílias ricas recorram a outros métodos para terem mais de um filho.
A chinesa Gao (nome fictício) foi uma das mães de aluguel contratadas pelo casal. Aos 32 anos, ela demonstra preocupação com o relógio biológico e quer encontrar novos clientes ainda este ano. Há dois anos, ela recebeu aproximadamente R$ 45 mil para gerar um bebê para um casal de meia idade que não podia ter filhos.
Em geral as mulheres que atuam como barriga de aluguel ganham em torno de R$ 60 mil, quantidade 120 vezes maior que o salário de muitos profissionais com diploma universitário em Pequim.
Em 2001, o governo chinês baniu o comércio de óvulos fertilizados e embriões e passou a proibir hospital de realizar procedimentos que envolvam barrigas de aluguel. A medida não barrou o mercado clandestino, que tem uma estrutura própria, descrita pelo The Guardian.
Durante a gestação, as mães contratadas muitas vezes são obrigadas por contrato a morar em locais determinados, onde dividem o quarto e devem seguir normas rígidas. Na agência de Zhou, é considerada uma violação, por exemplo, acordar depois das 9h30. Quebrar as regras pode resultar em multa de R$ 136.
Muitos casais pagam qualquer preço para ter um filho. “Você sofre uma tortura psicológica pelo medo da possibilidade de nunca ter uma criança”, diz Li (nome fictício), 42, pai de uma criança nascida de uma mãe de aluguel. “Depois você teme que algo vá acontecer quando a mãe de aluguel estiver grávida. E mesmo quando você tem seu bebê nos braços, você começa a ficar preocupado que alguém possa descobrir a verdade”. Dono de uma rede de restaurantes, ele já tem uma filha de sete anos, mas planeja ter outro filho neste ano do dragão.
Apesar de o governo determinar que mesmo o uso de métodos de reprodução como a fertilização in vitro deve seguir a política de planejamento familiar, a barriga de aluguel é uma forma encontrada por casais ricos para burlar a regra.
“Eu acho que a prática deveria seguir alguma lei ou regra”, diz o diretor da escola de sociologia e população da Universidade Renmin, Zhai Zhenwu. “É injusto para cidadãos pobres, para quem fica parecendo que os ricos podem ter quantos filhos quiserem. É um sinal negativo para a sociedade que o dinheiro pode comprar tudo”.
Para mulheres como Gao, no entanto, a decisão de ser uma mãe de aluguel não está relacionada à ética: ela proporciona para sua família uma renda essencial, mesmo acompanhada de um alto custo emocional. Na próxima gravidez, Gao planeja mudar de cidade: “Meus parentes e vizinhos não vão acreditar se eu disser de novo que o bebê nasceu morto”.
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