Como muitas crianças de seis anos, Pankaj Disht fica tímido ao falar com um estranho. Mas desde que mudou para uma escola privada, ele se tornou mais extrovertido e diz que gosta da escola e tem muitos amigos.
Em circunstâncias normais, o pai de Pankaj, Madan Singh Disht, cozinheiro doméstico, só poderia ter enviado seu filho para uma escola pública onde, como no resto da Índia, sofreria com as ausências dos professores, com a falta de infraestrutura e de recursos.
Entretanto, por causa de uma lei aprovada pela Suprema Corte nesta última primavera e da tenacidade da patroa de Disht, Seema Talreja, que organizou a inscrição do menino, Pankaj está frequentando uma escola privada, a Mother`s International School, onde recebe atenção individual de professores motivados.
Talreja, que é patroa de Disht há cinco anos, queria ajudar na educação da família. Ela aproveitou a legislação recente, que exige que as escolas privadas da Índia admitam 25% de seus alunos das idades de 6 a 14 de famílias que ganham menos de $ 100.000 rúpias por ano, ou seja, em torno de R$ 3.600.
Desde que Pankaj começou a frequentar a nova escola, “houve uma mudança completa na autoconfiança e na autoestima dele”, disse Talreja por telefone.
Os pais de Pankaj, que deixaram a escola aos 10 anos, concordaram. Disht disse que queria que o filho fosse médico. “Nessa escola, ele vai estudar e receber bons valores”, disse ele.
A lei que abre a educação privada para alunos de famílias de baixa renda faz parte do Direito das Crianças à Educação Gratuita Obrigatória, da Lei do Direito à Educação, que foi aprovada pelo governo indiano em 2009.
A lei assegura o acesso à escola para crianças entre seis e 14 anos e estabelece várias regras para educação pública e privada, inclusive a razão entre alunos e professores, horas de trabalho dos professores, necessidades de educação especial e registros.
O item que exige que as escolas privadas admitam crianças de baixa renda atingiu um nervo sensível entre os pais mais ricos, e as escolas pouco se mexeram para cumprir a lei.
No ano passado, uma associação de escolas privadas questionou a lei formalmente na justiça.
Em abril, a Suprema Corte manteve a constitucionalidade da lei, pavimentando o caminho para o cumprimento das quotas de 25%.
Há ainda um longo caminho a ser trilhado, e o número de crianças que se beneficiam do novo acesso às escolas privadas será relativamente pequeno. É proibida a discriminação no processo de admissão, mas isso não abre as inscrições a todos: os pretendentes têm que ter um pai ou responsável com muita tenacidade para fazer a inscrição.
Os críticos da lei acusaram o governo de se esquivar da responsabilidade das 80% das escolas que são financiadas pelo governo. Das 188 milhões de crianças admitidas no ensino fundamental na Índia, 70% estudam em escolas públicas. Nas aldeias, 84% das crianças frequentam escolas do governo, de acordo com o Sistema de Informação Distrital da Educação, um banco de dados do governo.
Os problemas nas escolas públicas, além das faltas dos professores e da fraca infraestrutura, incluem a discriminação por sexo, e muitas escolas não têm banheiro para meninas. Um artigo publicado em junho pela revista “The Economic and Political Weekly”, apontou uma série de estudos que concluíram que, mesmo depois de cinco anos de escolaridade, alguns alunos não sabem ler, escrever ou a matemática básica.
“A educação pública vem descendo a ladeira nas últimas décadas”, disse Kiran Bhatty, ex-coordenador nacional de monitoramento da Lei do Direito à Educação. “Há uma divisão entre as escolas públicas e privadas por causa da falta de qualidade nas escolas do governo. A lei está tentando abordar essas questões. É uma mudança de paradigma que não é fácil”.
Enquanto as escolas privadas do país parecem estar gradualmente aceitando a lei, há preocupação sobre como ela será aplicada.
“Queremos participar”, disse Benaifer P. Kutar, da J.B. Petit High School, uma escola de 150 anos para meninas em Mumbai. “A lei vai transformar a sala de aula na Índia. Vamos adotá-la no melhor espírito. Mas espero que tenhamos alguma autonomia em como vamos implementá-la”.
Uma questão que ainda está ambígua é o custo. Tipicamente, as escolas privadas que seguem o currículo do conselho escolar indiano cobram de $ 60.000 a $ 100.000 rúpias por ano. As escolas que seguem o programa de Baccalaureate Internacional cobram até cinco vezes mais.
O governo estipulou que cobriria os custos das escolas privadas para as crianças pobres até a quantia que custaria se estivessem cursando uma escola pública, que varia por Estado. (Em Déli, por exemplo, o governo contribui com cerca de $ 1.200 rúpias por criança por mês). A lei não está clara sobre quem vai arcar com o restante, e muitos pais temem que as escolas vão elevar a mensalidade para os pais mais abastados pagarem a diferença.
“As implicações financeiras são gigantescas”, disse Avnita Bir, diretora da Escola R.N. Podar, no subúrbio de Mumbai. “As escolas terão necessidade de fundos e os pais vão dizer ‘por que somos obrigados a subsidiar as outras crianças?’”
Kutar, da J.B. Petit, disse que não tinha sido informada sobre quem pagaria pelos livros, uniformes, excursões e horas de instrução extracurriculares para crianças que ingressarem pela quota.
As ramificações sociais em uma sociedade tão estratificada quanto a Índia também estão causando debate.
“As pessoas dizem que estão preocupadas com o impacto social e psicológico sobre as crianças”, disse Bir da escola R. N. Podar. “Pessoalmente, não estou preocupada com isso. Se a filosofia da escola for inclusiva, funcionará”.
Também houve resistência por parte dos pais de alunos de escolas privadas. Funcionários de escolas em Nova Déli que pediram para não ser identificados disseram que os pais estão exigindo que seus filhos não se sentem ao lado de colegas mais pobres ou estão dizendo aos filhos para não fazerem amizade com os alunos mais pobres.
Sunil e Elizabeth Mehta, que dirigem um grupo sem fins lucrativos Muktangan, que oferece aulas de inglês para 1.800 crianças pobres de escolas públicas em Mumbai, disseram que, se os pais tivessem consciência da importância de expandir o acesso à educação de qualidade, os preconceitos eventualmente se dissipariam.
“As pessoas são socialmente sensíveis quando a situação é explicada”, disse Mehta. “Mas você não pode esperar que mudem de uma hora para outra”.
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