À medida que o Japão se movimenta para reduzir a energia nuclear depois do desastre do ano passado em Fukushima, depara-se com uma dura realidade econômica: o custo de abandonar imediatamente seus reatores nucleares pode ser alto demais para algumas grandes companhias aguentarem. Se os 50 reatores nucleares fossem fechados permanentemente este ano, as companhias de energia seriam atingidas por prejuízos no total de 4,4 trilhões de yens (US$ 55,9 bilhões) deixando pelo menos quatro delas insolventes, de acordo com cálculos feitos neste verão pela Agência de Recursos Naturais e Energia do governo. Os custos extraordinários do fechamento imediato emergiram como a maior preocupação para o governo japonês, que vem lutando para equilibrar seu desejo de melhorar a segurança nuclear com as realidades orçamentárias das grandes companhias. As usinas nucleares geravam cerca de um terço da eletricidade do Japão antes do acidente de Fukushima, mas a maioria continua pelo menos temporariamente fora de funcionamento. "As pessoas falam com facilidade em fechar as usinas de energia nuclear do Japão, mas as consequências econômicas e financeiras são graves", disse Reiji Takeishi, professor de economia ambiental na Universidade Internacional de Tóquio. O governo está agora considerando pelo menos três opções para reduzir a dependência de energia nuclear do país - e todas elas dariam às companhias elétricas até 2030 para fechar permanentemente seus reatores, permitindo que elas reembolsem em grande parte os investimentos nas usinas. Em 2030, a maioria dos reatores já teria mais de 40 anos, e de qualquer forma teriam de sair de serviço de acordo com as normas japonesas. Mas uma série de novas preocupações com a segurança, incluindo possíveis falhas tectônicas ativas localizadas sob usinas, levantaram dúvidas sobre se os reatores nucleares devem ser reativados. E o cronograma proposto de 18 anos irritou o crescente movimento antinuclear do país, que reclamou que o governo está com as prioridades erradas. "Como você pode colocar a economia acima da segurança, acima da vida humana?", disse Masanori Oda, artista contemporâneo e representante do movimento, depois de uma reunião com o primeiro-ministro Yoshihiko Noda na semana passada. Uma opção que está sendo considerada pelo governo reduziria a dependência do país da energia nuclear para 20 a 25% das necessidades elétricas até 2030. Uma segunda opção cortaria o segmento para 15%, e uma terceira eliminaria totalmente a energia elétrica nuclear. Embora a proposta de 15% tenha inicialmente ganhado ímpeto, audiências públicas e pesquisas de opinião mostraram um apoio surpreendente à redução completa. Todas as propostas poderiam envolver o reinício progressivo dos reatores do país. Nos últimos dias, uma série de legisladores do partido governista e ministros de governo também expressaram seu apoio à chamada opção zero, com os olhos nas eleições nacionais que podem ser convocadas em poucos meses. O destino dos reatores nucleares faz parte de uma discussão maior e bastante carregada sobre os custos e benefícios da energia nuclear, e suas alternativas. A maior parte do argumento tende a focar nos custos econômicos mais amplos de abandonar a energia nuclear. O maior e mais influente lobby empresarial do Japão, o Keidanren, alerta quanto ao desastre. Milhares de empregos seriam perdidos, diz o grupo, e alternativas energéticas estariam repletas de problemas. As importações de combustível do Japão já aumentaram desde o desastre de Fukushima, levando o déficit comercial do país a altas recordes. Embora o Japão até agora tenha evitado blecautes neste verão, a falta de energia está pesando sobre as empresas. As emissões de gases de efeito estufa também estão aumentando, e energias renováveis como a eólica ou solar continuam em pequena escala, caras e pouco confiáveis, diz o grupo lobista. "Se não tivermos um fornecimento estável de energia a preços economicamente viáveis, a economia do Japão não poderá crescer", disse o grupo no início deste mês. Os prejuízos econômicos para as usinas podem ser ainda mais altos a curto prazo. Um painel de especialistas nomeado pelo governo alertou este ano que existe uma falha tectônica possivelmente ativa sob a Usina Nuclear Shika, 273 quilômetros ao norte de Kyoto, levantando a possibilidade de que o local pode ser declarado impróprio para uma usina nuclear. A operadora da usina, a Hokuriku Electric Power Co., seria levada praticamente à insolvência com perdas de pelo menos 313 bilhões de yens (US$ 3,97 bilhões) se fosse obrigada a fechar os dois reatores, mostram cálculos do governo. As perdas viriam dos custos extras pelo fechamento precoce, redução do valor de outras propriedades nucleares, bem como dos custos de se desfazer do lixo e do combustível nuclear da usina, de acordo com esses cálculos. Outra companhia problemática é a Chubu Electric, que está desesperada para salvar o reator número 5 de sua Usina Nuclear de Hamaoka, a mais nova unidade do local e a maior do país. A unidade foi inaugurada em 2005, mas está fora de funcionamento desde maio, quando Naoto Kan, então primeiro-ministro, ordenou efetivamente que ela fechasse por estar localizada numa costa particularmente sujeita a tsunamis. Durante o desligamento, entretanto, cerca de 4 mil litros de água do mar entraram no reator por causa da explosão de um cano, e acredita-se que ela está corroendo o núcleo do reator.
Duas usinas menores, a Hokkaido Electric e a Tohoku Electric, ficariam ainda pior: o custo de desligar seus reatores as levaria à insolvência, estima o governo. Ambas as usinas enfrentam preocupações de que seus reatores também estejam sujeitos a riscos de terremotos bem maiores do que se imaginava previamente. E a Tokyo Electric - a maior companhia do país, e operadora da usina destruída de Fukushima Daiichi - seria forçada a aceitar reduções de valor adicionais de 1,15 trilhões de yens (US$ 14,6 bilhões) se não for capaz de reabrir seus 13 reatores restantes, incluindo dois na usina de Fukushima Daiichi, atingida pelo tsunami, e mais quatro numa outra usina a apenas 16 quilômetros dali. O governo local de Fukushima está pedindo para que todos os reatores das usinas continuem fechados permanentemente. Mas o golpe seria desastroso para uma companhia que foi efetivamente nacionalizada no mês passado por causa dos custos exorbitantes do acidente e das indenizações. "De fato não vejo um cenário em que as companhias de energia serão obrigadas a ir para zero a curto prazo", diz Penn Bowers, analista que cobre as companhias de energia do Japão para a CLSA Japanese Equities. "Você teria títulos negativas para algumas dessas companhias", disse ele. "Acho que esta não é uma opção, porque não há fornecedores alternativos. Essas companhias são necessárias para continuar gerando lucro." Aqueles que são a favor da redução da energia nuclear argumentam que os custos de outro desastre superariam facilmente outras considerações. Eles estão otimistas quanto ao desenvolvimento da energia renovável, especialmente com alto investimento público, e dizem que as novas tecnologias nessa área podem cortar as emissões e criar novos empregos. "As crenças subjacentes à economia da energia nuclear não se sustentam mais", diz Terumitsu Honma, professor de economia e seguro na Univesridade Aoyama Gakuin em Tóquio. "A maior crença era a de que acidentes não aconteciam." As companhias de energia têm um incentivo forte para pressionar o governo pela permissão de reiniciar seus reatores, mesmo com riscos. Como o custo de outro desastre provavelmente seria maior do que o valor das companhias, seguradoras privadas não estão dispostas a assegurar as companhias - deixando o governo responsável por qualquer prejuízo. Dessa forma, os riscos de reiniciar os reatores japoneses, tanto financeiramente quanto em termos de segurança, seriam todos arcados pelos contribuintes japoneses, enquanto quaisquer benefícios iriam para as companhias e seus acionistas, diz J. Mark Ramseyer, professor da Escola de Direito de Harvard, que escreveu um artigo sobre a indústria nuclear japonesa este mês na revista acadêmica "Theoritical Inquiries in Law". "Elas ficam com todos os rendimentos, mas arcam com menos do que todos os custos", disse ele num e-mail.
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