Quando uma mulher de 78 anos se matou em agosto bebendo pesticida na frente de uma prefeitura, sua história chamou a atenção para um problema que até recentemente fora abafado: na Coreia do Sul, onde o respeito pelos mais velhos é um dos esteios da ordem social, idosos estão cometendo suicídio em um ritmo alarmante.
A mulher, uma viúva que vivia sozinha, recebia uma pensão do Estado até julho, quando o governo municipal soube que seu cunhado há muito tempo desempregado havia encontrado um emprego em um estaleiro. As autoridades ignoraram seus apelos de que ela não podia mais pagar o aluguel, citando regulamentos que negam benefícios a pessoas cujos filhos adultos são considerados capazes de sustentá-las.
"Como vocês podem fazer isso comigo?", dizia o bilhete que ela deixou, segundo a polícia. "A lei deve servir às pessoas, mas não me protegeu."
Uma estatística envergonha os sul-coreanos: o índice de suicídios no país -medido para cada 100 mil pessoas- é o mais alto entre os membros da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico. Ele aumentou de 13,6, em 2001, para 31,2, em 2010. Mas ainda mais perturbador é o índice de suicídios entre os sul-coreanos maiores de 65 anos. No mesmo período, ele inchou de 35,5 para 81,9.
A tendência é resultado da ruptura do tradicional contrato social da época de Confúcio, no qual os mais velhos podem contar com o respeito e o apoio de seus filhos e netos.
Como um investimento nos cuidados que receberiam na velhice, os coreanos hoje idosos se dedicaram obsessivamente à educação e ao sucesso profissional dos filhos.
"Os filhos eram tudo o que eles tinham para o futuro -para tratamentos de saúde, apoio financeiro e uma vida confortável na velhice", disse Park Jiyoung, professora de assistência social na Universidade Sangji, em Wonju.
Mas a transição da sociedade coreana de agrícola para industrial espalhou a geração mais jovem para as cidades ou para o exterior, dissolvendo a base de apoio familiar de forma mais rápida do que a criação de uma rede de segurança financiada pelo Estado.
O sistema nacional de aposentadorias só começou em 1988, por isso muitas pessoas hoje na faixa de 80 anos não tiveram oportunidade de aderir.
O programa de assistência social do governo continua baseado no princípio de que cuidar dos idosos é responsabilidade das famílias. Mas a vida dos próprios filhos ficou mais precária, especialmente desde a crise financeira asiática dos anos 1990. O número de idosos que vivem sozinhos mais que duplicou desde 2000.
"Os velhos sentem-se traídos ou pensam que são um peso para seus filhos, principalmente os que têm doenças crônicas cujas contas médicas os filhos lutam para pagar", disse Park. "Sua crença na família como uma entidade com um destino comum os leva a afastar-se dela, removendo o peso."
Kim Sungwhan, diretor do distrito de Nowon, em Seul, foi um dos primeiros administradores a abordar a crise dos suicídios.
Ele treinou cerca de mil voluntários para reconhecer sinais de advertência e conectar idosos com tendências suicidas aos serviços sociais.
Kim Man-jeom, 73, foi uma dessas pessoas. Depois da morte de seu marido, no ano passado, ela caiu em depressão. Ficou decepcionada porque seus filhos não a convidaram para morar com eles, mas também temia tornar-se um fardo para a família.
"Quando vi uma gravata, pensei em me enforcar", disse.
A população da Coreia do Sul está envelhecendo mais depressa do que a de outros países desenvolvidos. Sociólogos dizem que o baixo índice de nascimentos deriva da relutância dos jovens casais a imitar seus pais e gastar suas economias na educação dos filhos, deixando pouco para sua velhice.
"Nossa sociedade deu ênfase à eficiência econômica ao custo da condição humana", diz Kim.
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