Os trocados de Yusa Nishimura podem estar minando o plano econômico
do primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe. Sempre que pode, Nishimura,
23, guarda moedas de 500 ienes, que valem um pouco menos de US$ 5, numa
espécie de livro que facilita sua contagem.
Juntar um pé-de-meia como o de Nishimura fazia sentido num Japão que
crescia lentamente, onde durante 15 anos de deflação o dinheiro dela
valia cada vez mais com o passar do tempo.
Seus planos de fazer uma extravagância num spa provavelmente ficariam mais baratos se ela esperasse mais.
Mas, na sua luta para tirar o Japão da deflação, Abe está fazendo um
chamado aos poupadores, como Nishimura, para que mudem seu modo de
pensar -para o bem da economia e também para o seu próprio bem.
Nishimura, como boa parte dos japoneses, não está convencida. "Nunca
vivenciei inflação. Não me parece real", disse Nishimura, que trabalha
numa empresa de tecnologia em Kobe.
O resultado dessa incerteza poderia ser uma recuperação econômica
difícil para o Japão, que tem experimentado certo ressurgimento sob Abe.
Dados recentes apontam para um fraco crescimento econômico no quarto
trimestre. O governo disse que a economia tinha crescido ainda mais
lentamente do que o previsto, apenas 0,7% no acumulado de um ano,
afetada por um consumo ainda menor que o esperado.
Se mais pessoas previssem um futuro de preços e salários em alta, avalia
Abe, elas gastariam agora, antes de as mercadorias ficarem mais caras.
Para combater a alta dos preços, elas também colocariam seu dinheiro em
investimentos de rendimento mais alto. As empresas, confiantes em uma
nova era de maiores vendas e lucros, iriam elevar preços e salários. Um
grande obstáculo no caminho do Japão, diz Abe, são as atitudes
arraigadas. "Não é fácil alterar uma mentalidade de deflação que está em
vigor aqui há mais de 15 anos", afirmou o premiê.
No Japão, os preços em geral não sobem desde o fim dos anos 1990. Um Big
Mac custa aqui aproximadamente o mesmo que em 1988: cerca de 300 ienes,
ou quase US$ 3. O preço de outra opção de fast-food -a tigela de arroz e
carne da rede Yashinoya- caiu de 400 ienes no final dos anos 1990 para
280 hoje.
A renda média do trabalhador também diminuiu.
Abe adotou políticas agressivas para pôr fim à deflação. Sua primeira
medida, que duplicou a oferta de moeda, já elevou os preços ao
enfraquecer o iene e empurrar para cima o custo da energia e dos
alimentos importados.
Mas mesmo uma elevação ínfima nos preços foi recebida com perplexidade.
As empresas que estão promovendo aumentos demonstram pesar. "Dói
realmente em nossos corações anunciar que em breve revisaremos nossos
preços", disse a cervejaria Kidoizumi, em Chiba, a leste de Tóquio, num
anúncio recente.
O lento avanço no combate à deflação reflete as dificuldades de superar
expectativas e comportamentos enraizados, especialmente entre os
japoneses mais jovens, que nunca vivenciaram aumentos de preços, disse
Taro Saito, economista sênior do Instituto de Pesquisa NLI, em Tóquio.
Gerações mais velhas ainda se lembram dos "choques do petróleo" dos anos
1970, que fizeram os preços no varejo darem um salto e também
provocaram a bolha nos ativos do país nos anos 1980. Mais recentemente,
eles se lembram de como o Japão caiu na deflação depois que a sua bolha
econômica estourou, no início da década de 1990.
Uma pesquisa feita no ano passado pelo governo demonstrou disparidades
intergeracionais extremas: famílias chefiadas por pessoas dos 60 aos 69
anos elevaram seus gastos em 2,7%, ao passo que as famílias chefiadas
por japoneses com menos de 30 reduziram-nos em 0,8%.
Alguns economistas estão começando a questionar se os obstáculos para
derrotar a deflação estão nas políticas de Abe, não entre os
consumidores.
No restaurante Manrai, adorado pelos moradores de Tóquio por sua sopa de
porco e alho-poró -e pelo antigo compromisso com os preços
baixíssimos-, o ambiente era de consternação quando os preços
recentemente subiram pela primeira vez em mais de duas décadas, de 200
para 250 ienes.
"Não acredito", disse Ryo Bobayashi, funcionário de uma agência de
recrutamento. "Se os preços começarem a subir em todo lugar, não poderei
mais comer fora de casa."
O Manrai elevou os preços não por estar confiante no futuro das vendas, mas porque estava sob a pressão dos custos mais altos.
Em vez de dar início a um renascimento da economia, essa inflação
"empurrada pelos custos", como os economistas a definem, poderá se
tornar uma crescente ameaça aos japoneses aferrados a uma mentalidade
deflacionária. Eles poderão ver suas economias serem corroídas, alertou
Yukio Sakurai, analista de moradia em Tóquio.
As opções que faziam sentido durante a deflação -alugar, por exemplo, em
vez de comprar- poderão sobrecarregá-los com custos cada vez maiores e
barrar seu acesso a quaisquer benefícios de uma economia mais forte.
"Os japoneses mais jovens precisam mudar agora sua mentalidade ou
ficarão para trás", disse Sakurai. "Eles fariam bem em conversar com os
pais e avós."
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