Helicópteros do governo lançaram uma chuva de bombas sobre vilarejos
em toda a Síria no início de março, exterminando civis e demolindo
casas. Centenas de combatentes morreram em batalhas que não mudaram as
linhas de frente de lugar. Ativistas disseminaram nas redes sociais
vídeos mostrando sírios famintos e exaustos devido à guerra.
"Não podemos nos mexer. Não podemos andar", disse um idoso exaurido em
um vídeo filmado perto da capital, Damasco. "Esta situação não vai
funcionar."
Mas uma das indicações mais marcantes das consequências dos quatro anos
de conflito no país veio do Espaço, com novas imagens de satélites
mostrando que a destruição maciça e o deslocamento populacional apagaram
mais de quatro quintos das luzes do país.
A revelação veio de uma análise feita por Xi Li, da Universidade Wuhan (China) e da Universidade de Maryland.
O conflito sírio começou quatro anos atrás com protestos pedindo
reformas políticas. As manifestações foram inspiradas pelos levantes da
Primavera Árabe ocorridos em outros países do Oriente Médio. De lá para
cá o conflito se transformou: o ditador Bashar Al-Assad lançou mão de
soldados e capangas para sufocar os protestos; a oposição pariu grupos
rebeldes armados; potências estrangeiras enviaram assistência militar, e
a violência resultante disseminou o caos por grandes trechos do
território sírio, permitindo que grupos extremistas estabelecessem bases
e aumentassem seu poder.
A Síria ingressa em seu quinto ano de conflito com poucos sinais de que a
guerra vá terminar em breve. Esforços internacionais para reunir as
partes para negociações de paz estagnaram, e o enviado das Nações
Unidas, Staffan de Mistura, conseguiu poucos avanços mesmo para a
modesta meta de obter um cessar-fogo de curto prazo em apenas uma das
muitas cidades que se converteram em campos de batalha.
Em vez disso, as atenções internacionais se deslocaram para a ação
militar contra extremistas da facção Estado Islâmico, que controla
partes da Síria e do Iraque.
Organizações humanitárias dizem que a ascensão do Estado Islâmico não
apenas impôs miséria e violência às comunidades dominadas pela facção,
mas também desviou a atenção internacional de uma crise humanitária
crescente que vem se fazendo sentir cada vez mais longe das fronteiras
da Síria. No ano passado, por exemplo, o número de migrantes ilegais que
atravessam o Mediterrâneo em direção à Europa alcançou níveis recordes.
Muitas das pessoas que tentaram fazer a travessia, frequentemente
letal, eram sírias.
Cerca de metade da população síria de antes da guerra já abandonou o
país, segundo a ONU, e quase 4 milhões de pessoas se tornaram refugiadas
no exterior, impondo ônus pesados a países vizinhos como a Turquia, a
Jordânia e o Líbano.
Um estudo do Centro Sírio de Pesquisas Políticas concluiu que a educação
no país se encontra em "estado de colapso", que 6% dos sírios foram
mortos ou feridos e que a expectativa de vida caiu 20 anos desde 2010.
"Os números são estarrecedores", disse Valerie Amos, coordenadora de
assistência emergencial da ONU que está próxima de deixar o cargo. "São
tão estarrecedores que praticamente deixaram de fazer sentido para as
pessoas."
A vida se tornou difícil mesmo em áreas que não são diretamente
ameaçadas pela violência. Moradores de Damasco, sob controle firme de
forças governamentais e milícias ligadas ao governo, já se acostumaram
às filas longas, aos preços em alta constante e à escassez de gasolina,
de óleo para aquecimento e até mesmo de pão. Muitos dizem que a guerra
feriu a ordem social, conferindo a homens armados uma vantagem sobre
todo o resto da população.
As esperanças de que a situação pudesse melhorar cresceram por pouco
tempo um ano atrás, quando o Conselho de Segurança da ONU aprovou sua
primeira resolução sobre a Síria, pedindo acesso livre à assistência
humanitária. Outra resolução autorizou envios de ajuda humanitária por
fronteiras não controladas pelo governo sírio.
Recentemente, porém, uma coalizão de 21 organizações humanitárias
divulgou um relatório dizendo que as resoluções não chegaram a fazer
muita diferença.
"Há mais morte, mais deslocamentos, um aumento das restrições impostas
por países vizinhos, e a situação dos refugiados e dos deslocados
internos na Síria se tornou ainda mais desesperadora", disse Daniel
Gorevan, responsável pela política para a Síria da Oxfam, um das
entidades que participou do relatório.
A maioria dos refugiados sírios no Líbano diz que ainda espera voltar
para casa algum dia, mas alguns acham que isso não vai acontecer.
"Eu já desisti da esperança de voltar algum dia", comentou Farid Qassim, 29. "A guerra na Síria nunca vai acabar".
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