Novos casos de trabalho ilegal em pastelarias chinesas preocupam o MTE-RJ (Ministério do Trabalho e Emprego do Rio de Janeiro). O
MTE aguardava receber, na última semana, os documentos que comprovassem
vínculo legal de pasteleiros flagrados na Operação Yulin, realizada em
conjunto com o Procon-RJ no dia 17 de abril. Apenas uma carteira de
trabalho foi apresentada –mas pelo menos outras sete eram esperadas.
A ausência dos documentos pode ser apenas mais uma ponta visível de uma
complexa rede de tráfico de chineses para o Rio. Os trabalhos do MTE
apontam que os estrangeiros vêm de uma mesma região da China, Guangdong,
muito próxima a Hong Kong.
Relatos de chineses apontam para a existência de anúncios espalhados na cidade convocando trabalhadores para serviço no Brasil. Para custear a viagem, essas pessoas estariam contraindo dívidas com agências ainda na Ásia.
Relatos de chineses apontam para a existência de anúncios espalhados na cidade convocando trabalhadores para serviço no Brasil. Para custear a viagem, essas pessoas estariam contraindo dívidas com agências ainda na Ásia.
Para quitá-las, entram no Brasil com visto de turista, mas trabalham em
condições degradantes em pastelarias do Estado do Rio. Em vez de
pagamento em dinheiro, em alguns casos, esses trabalhadores recebem
apenas comida e alojamento.
"É muito grave o problema. Não se trata nem só de um crime de
escravidão, é um crime de tráfico de pessoas. São agentes que estão
operando lá na China em conluio com pessoas aqui no Brasil, traficando
essas pessoas que ficam triplamente vulneráveis, pelos fatores
econômico, geográfico e do idioma", disse a auditora do MTE Márcia
Albernaz.
Já são três casos flagrados de escravidão em pastelarias. O primeiro
foi descoberto em 2013, em Parada de Lucas, na zona norte da capital
fluminense. Yan Queng Quan trabalhava 17 horas por dia e era agredido
pelo seu primo e patrão, Yan Ruilong, que foi condenado a dois anos e
meio de prisão.
O segundo caso ocorreu em Muriqui, distrito de Mangaratiba. Um jovem de
15 anos, cujo nome ainda está sob proteção, chegou à pastelaria em 2012
e, até 2014, trabalhou 14 horas por dia, sem descanso, sem receber
salário.
Após fugir a pé por mais de 20 km e chegar à cidade de Itaguaí,
encontrou ajuda e se comunicou usando o tradutor do Google. O patrão do
jovem possui pelo menos mais dez outros estabelecimentos como esse e,
obrigado pelas autoridades brasileiras, pagou um valor equivalente a
todo o período. A Secretaria de Direitos Humanos do Estado do Rio, a
Polícia Federal e a Interpol trabalham para saber se o jovem, agora com
18 anos, tem segurança para voltar a seu país.
Neste ano, mais um caso grave foi descoberto em Copacabana, na zona sul
do Rio. Três jovens chineses revelaram que o patrão, entre outras
irregularidades, retinha o salário combinado e só repassava parte da
quantia, sem periodicidade, o que é ilegal no Brasil.
O MTE enquadrou a relação como análoga à escravidão e, por isso, os
jovens ganharam um visto de trabalho especial. Após receberem do
empregador mais de R$ 30 mil cada um, decidiram seguir trabalhando no
mesmo local.
Algo que também tem chamado atenção na investigação é que, em muitos
casos, os donos formais dessas pastelarias --na maioria, chineses--
também sofrem com as baixas condições de trabalho, ao dormir em
alojamentos e ter pouco dinheiro para si. Parte deles não consegue nem
mesmo se comunicar em português.
O dono de uma pastelaria em Vila Isabel revelou que não consegue ficar
com dinheiro algum após pagar R$ 5.000 para quem estaria arrendando o
ponto. Assim, os auditores do MTE passaram a considerar o dono formal da
pastelaria também como empregado.
Em um caso em Belford Roxo, na Baixada Fluminense, chineses fugiram em
uma camionete luxuosa após a chegada da fiscalização. A suspeita é que
os donos dos estabelecimentos também possam estar sendo explorados. O
MTE prossegue com as investigações e prevê novas operações.
Além da situação trabalhista, a higiene das pastelarias da cidade -- não só as chinesas– preocupa a Vigilância Sanitária. "É um segmento que não preza muito pela higiene. Das 29 pastelarias inspecionadas, 24 foram multadas. Dez foram interditadas totalmente, e outras três parcialmente", afirmou Luis Carlos Coutinho, superintendente de alimentos da Vigilância Sanitária da cidade do Rio.
Além da situação trabalhista, a higiene das pastelarias da cidade -- não só as chinesas– preocupa a Vigilância Sanitária. "É um segmento que não preza muito pela higiene. Das 29 pastelarias inspecionadas, 24 foram multadas. Dez foram interditadas totalmente, e outras três parcialmente", afirmou Luis Carlos Coutinho, superintendente de alimentos da Vigilância Sanitária da cidade do Rio.
Não há dados oficiais que apontem quantas pastelarias chinesas existem
na cidade do Rio, mas o número é estimado pela Vigilância Sanitária em
150. Recentemente, circulou a informação de que carne de cães era
armazenada para consumo em uma pastelaria em Parada de Lucas, na zona
norte. A informação, no entanto, não é confirmada oficialmente. Mesmo
assim, a Vigilância colheu 30 amostras de carne na cidade.
Procurada, a Polícia Federal não revelou se investiga qualquer atividade criminosa envolvendo as pastelarias do Rio. Apenas informou que, em 2014, 72 mil chineses chegaram ao país, enquanto 71 mil saíram. O Consulado-Geral da China na cidade pediu para a reportagem procurar a Embaixada, que, por sua vez, pediu para entrar em contato com o Consulado.
Procurada, a Polícia Federal não revelou se investiga qualquer atividade criminosa envolvendo as pastelarias do Rio. Apenas informou que, em 2014, 72 mil chineses chegaram ao país, enquanto 71 mil saíram. O Consulado-Geral da China na cidade pediu para a reportagem procurar a Embaixada, que, por sua vez, pediu para entrar em contato com o Consulado.
A gravidade do assunto e a limitação do idioma dificultaram a
aproximação da reportagem com os chineses em pastelarias, que se
recusaram a conceder entrevista. Bem perto do prédio do Ministério do
Trabalho no Rio, num fim de tarde na última semana, uma roda de pagode
acontecia em frente a uma pastelaria chinesa. Ao ser questionada sobre
se música na rua também é comum na China, a jovem desamarrou um sorriso e
balançou a cabeça em negativo. "Lá é só karaokê, né?"
Nenhum comentário:
Postar um comentário