Poucos lugares parecem fora de alcance para o chefe do governo
chinês, Xi Jinping, que já viajou às capitais europeias e a pequenas
ilhas no Pacífico e no Caribe em busca dos interesses estratégicos de
seu país.
Por isso, talvez não tenha causado surpresa quando ele apareceu no fim
de 2014 nesta cidade à beira do oceano Antártico (ou Meridional) para
colocar um marco de longa distância em outra região longínqua, a
Antártida, a mais de 3.000 quilômetros ao sul deste porto na Austrália.
De pé no convés de um quebra-gelo que transporta cientistas chineses
desta última escala antes do continente gelado, Xi prometeu que a China
continuará se expandindo em um dos poucos lugares da Terra que continua
inexplorado.
Ele assinou um acordo de cinco anos com o governo australiano que
permite que navios chineses e, futuramente, aeronaves sejam
reabastecidos antes de rumar para o sul.
Isto facilitará o acesso a uma região que se acredita ter vastos
recursos de petróleo e minérios; enormes quantidades de vida marinha com
alto teor de proteína; e, para tempos de possível necessidade no
futuro, água doce contida nos icebergs.
Foi somente em 1985, cerca de 70 anos depois que Robert Scott e Roald
Amundsen apostaram corrida até o Polo Sul, que uma equipe representando
Pequim hasteou a bandeira na primeira base de pesquisas antárticas do
país, a Estação Grande Muralha, na ilha King George, ao lado da América
do Sul.
Hoje a China parece decidida a se recuperar, mas crescem as preocupações
sobre suas intenções. O país abriu sua quarta estação de pesquisa no
ano passado, escolheu um local para a quinta e investe em um segundo
navio quebra-gelo e novos aviões e helicópteros adaptados.
Suas operações já são as de maior crescimento dentre os 52 signatários
do Tratado Antártico de 1959, que proíbe a atividade militar na região e
visa preservá-la como uma das últimas regiões selvagens; um pacto
relacionado proíbe a mineração.
Mas a visita de Xi foi mais um sinal de que a China está se posicionando
para aproveitar o potencial de recursos do continente quando o tratado
expirar em 2048, ou caso seja rasgado antes.
"Até agora, nossa pesquisa se baseia na ciência natural, mas sabemos que
há cada vez mais preocupação sobre a segurança dos recursos", disse
Yang Huigen, diretor-geral do Instituto de Pesquisa Polar da China.
A Austrália observa a escalada chinesa na Antártida com uma mistura de
gratidão -a presença da China oferece apoio ao programa de ciência
antártica da Austrália, que tem pouco dinheiro- e preocupação.
"Não devemos ter ilusões sobre a agenda mais profunda -que ainda não foi
acordada pelos cientistas chineses, mas é conduzida por Xi, e
provavelmente seus sucessores", disse Peter Jennings, diretor-executivo
do Instituto Australiano de Políticas Estratégicas.
"Isto faz parte de um padrão maior de abordagem mercantilista em todo o
mundo. Um grande motor da política chinesa é garantir o fornecimento de
energia e alimentos em longo prazo."
No mês passado, uma grande empresa agrícola chinesa anunciou a expansão
de suas operações de pesca na Antártida para apanhar mais krill
-pequenos crustáceos ricos em proteínas.
Como a soberania da Antártida não é clara, os países tentam reforçar
suas reivindicações sobre o continente construindo bases de pesquisa e
dando nomes a acidentes geográficos.
Os cartógrafos chineses deram nomes chineses a mais de 300 lugares, em
comparação com os milhares de locais no continente com nomes ingleses.
Cientistas chineses se esforçam para serem os primeiros a perfurar e
recuperar um núcleo de gelo contendo pequenas bolhas de ar que ofereçam
um registro da mudança climática de até 1,5 milhão de anos. É um esforço
caro e delicado em que outros, incluindo a União Europeia e a
Austrália, falharam.
A China aposta em que encontrou o melhor local para perfurar, uma área
chamada Dome A, ou Dome Argus, o ponto mais alto na camada de gelo da
Antártida Oriental e considerado um dos lugares mais frios no planeta,
com temperaturas de -90°C.
"A comunidade internacional perfurou em muitos lugares, mas sem sorte
até agora", disse Xiao Cunde, membro do primeiro grupo a alcançar o
local. "Pensamos que no Dome A teremos uma visão direta do núcleo de
gelo de um milhão de anos."
Anne-Marie Brady, autora do livro "China as a Polar Great Power" [China
como grande potência polar], disse que o interesse do país por encontrar
minérios foi apresentado "claramente para o público doméstico" como o
principal motivo para investir na Antártida.
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