No auge da seca, o jardineiro israelense Chabi Zvieli temeu por sua
subsistência. Um pesado imposto havia passado a incidir sobre o consumo
excessivo de água para fins domésticos. Muitos dos clientes de Zvieli
aderiram à grama sintética e trocaram as flores sazonais por plantas
nativas, mais resistentes. "Eu me preocupava com o que iria acontecer
com a jardinagem", disse Zvieli, 56.
Em todo o país, os israelenses foram orientados a tomar banhos de no
máximo dois minutos. Lavar carros com mangueiras foi proibido, e só quem
era rico o suficiente para absorver o custo da manutenção de um gramado
foi autorizado a regá-lo -ainda assim, só à noite. "Estivemos numa
situação muitíssimo próxima de alguém abrir a torneira em algum lugar do
país e não sair água", disse Uri Schor, porta-voz da Autoridade Hídrica
do governo.
Isso foi há cerca de seis anos. Hoje, há água em abundância em Israel. "O medo passou", disse Zvieli.
A revolução aconteceu em Israel. Um grande esforço nacional para
dessalinizar água do Mediterrâneo e reciclar águas residuais
proporcionou ao país água suficiente para todas as suas necessidades,
mesmo durante as secas graves. Mais de metade da água destinada às
famílias, à agricultura e à indústria em Israel atualmente é produzida
artificialmente.
"Não há hoje em dia nenhum problema com a água", disse Shaul Ben-Dov,
engenheiro agrônomo de Ramat Rachel. "O preço é mais elevado, mas
podemos viver uma vida normal em um país que está no meio do deserto."
Israel sofreu por décadas com a escassez e superexploração de seus
recursos hídricos. A água doce natural à disposição de Israel em um ano
médio não atende o uso total, em torno de 2 trilhões de litros. A
demanda por água potável deverá aumentar do atual 1,2 trilhão de litros
para 1,95 trilhão até 2030.
A reviravolta veio com uma seca de sete anos, iniciada em 2005, que
atingiu o seu auge no inverno boreal de 2008 para 2009. As principais
fontes naturais de água do país -o mar da Galileia, ao norte, e os
aquíferos das montanhas e da costa- foram esvaziados, o que ameaçou
causar uma deterioração irreversível na qualidade da água. Medidas para
aumentar a oferta e reduzir a procura foram aceleradas, sob a supervisão
da nova Autoridade Hídrica.
Quatro grandes usinas privadas de dessalinização entraram em operação ao
longo da última década. Uma quinta deve estar pronta dentro de alguns
meses. Juntas, elas produzirão mais de 492 bilhões de litros de água
potável por ano, com a meta de chegar a 757 bilhões de litros até 2020.
Israel, nesse período, tornou-se líder mundial na reciclagem de águas
residuais para a agricultura. O país trata 86% do seu esgoto doméstico,
reciclando-o para uso agrícola -volume que representa cerca de 55% de
toda a água utilizada na agricultura. A Espanha, segunda colocada nesse
ranking, recicla 17% de seus efluentes, segundo dados da Autoridade
Hídrica israelense.
O governo de Israel começou fazendo cortes nas quotas anuais de água aos
agricultores, encerrando décadas de uso extravagante e fortemente
subsidiado de irrigação agrícola.
A sobretaxa para o uso doméstico foi adotada no final de 2009, e um
sistema tarifário com duas alíquotas passou a vigorar. O uso regular da
água para fins domésticos agora é subsidiado pelo imposto ligeiramente
superior que os usuários pagam quando ultrapassam o consumo básico.
Funcionários da Autoridade Hídrica foram de casa em casa oferecendo a
instalação em chuveiros e torneiras de dispositivos gratuitos que
injetam ar no fluxo de água, reduzindo o consumo em cerca de um terço e
ainda dando a sensação de um fluxo mais forte.
Autoridades dizem que o uso mais consciente da água levou a uma redução de até 18% no consumo das famílias.
Empresas locais substituíram autoridades municipais na manutenção da
rede de água de cada cidade. O dinheiro arrecadado com a cobrança da
água é reinvestido na infraestrutura.
A Mekorot, empresa nacional de águas, construiu há 50 anos um sistema
destinado a transportar água do mar da Galileia, ao norte, até o árido
sul, passando pelas áreas populosas do centro. Atualmente, a companhia
constrói uma nova infraestrutura para levar água da costa do
Mediterrâneo para o interior do país.
A dessalinização, durante muito tempo rejeitada devido ao elevado
consumo de energia do processo, está se tornando mais barata, mais limpa
e mais eficiente do ponto de vista energético, graças ao avanço
tecnológico. Sidney Loeb, cientista americano que inventou o popular
método de osmose reversa, veio morar em Israel em 1967 e ensinou os
técnicos daqui.
A usina de dessalinização Sorek destaca-se no solo arenoso, cerca de 15
km ao sul de Tel Aviv. Apontada como a maior usina desse tipo no mundo,
produz 151 bilhões de litros de água potável por ano, o suficiente para
cerca de um sexto da população de Israel, de aproximadamente 8 milhões.
Sob um arranjo complexo, as usinas serão transferidas para a propriedade
estatal após 25 anos. Por enquanto, o Estado compra água dessalinizada
da Sorek a US$ 0,58 por metro cúbico, um preço relativamente baixo.
Alguns israelenses ironizam a atual revolução hídrica. Tsur Shezaf, que
cultiva vinhas e azeitonas no Negev, no sul, argumenta que a
dessalinização é essencialmente uma privatização do abastecimento da
água em Israel, beneficiando alguns magnatas, enquanto a reciclagem para
a agricultura permite que o Estado venda duas vezes a mesma água.
Ambientalistas israelenses dizem que a febre da dessalinização ocorreu
em detrimento de alternativas como o tratamento das reservas hídricas
naturais que foram poluídas por fábricas, em especial as indústrias
militares. Eles também dizem que o método de colher a água para
dessalinização em alto-mar, como fazem as usinas israelenses, pode
destruir a vida marinha, ao sugar ovas e girinos.
Num lugar seco como o Oriente Médio, a água também tem implicações
estratégicas. Disputas entre Israel e seus vizinhos árabes pelos
direitos da água na bacia do rio Jordão contribuíram para as tensões que
levaram à Guerra dos Seis Dias, em 1967.
Israel, que partilha o aquífero das montanhas com a Cisjordânia, diz
fornecer aos palestinos mais água do que seria a sua obrigação conforme
os acordos de paz em vigor. Os palestinos dizem que o volume não é
suficiente e é muito caro. Uma nova era de generosidade hídrica poderia
ajudar a fomentar as relações com os palestinos e com a Jordânia.
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