Os mais de 3.000 mil migrantes de Bangladesh e Mianmar que chegaram à
Indonésia e à Malásia encerraram semanas de pesadelo no mar apenas para
cair em um limbo administrativo que poderá demorar anos -ou até
décadas.
Em um potencial avanço na crise que envolve todo o Sudeste Asiático, a
Malásia e a Indonésia concordaram em abrigar os migrantes que foram
resgatados, e outros milhares que podem ainda estar no mar, sob a
condição de que eles sejam devolvidos para seus países ou reassentados
em outros dentro de um ano.
Mas poucas nações parecem dispostas a aceitar os migrantes, nem mesmo os
que se qualificam como refugiados e merecem asilo. Há também um enorme
número de candidatos a reassentamento, e as agências que lidam com o
problema estão sobrecarregadas.
"Mesmo que consigamos o status de refugiados da ONU, ainda não sabemos
quanto tempo teremos de esperar para sermos reassentados", disse Hasinah
Ezahar, 28, que sobreviveu a doença, fome e ameaças dos contrabandistas
a quem ela pagou pela viagem por mar com três de seus filhos, vindos do
oeste de Mianmar. "Até lá, nossas vidas ficam à espera."
Sua família faz parte da onda de migrantes de Bangladesh e Mianmar que
buscam escapar da pobreza e, no caso da etnia rohingya como Hasinah, da
perseguição religiosa.
Há pelo menos 200 mil migrantes rohingyas de Mianmar em Bangladesh e
apenas 32.600 deles receberam proteção da ONU como refugiados que fogem
de perseguição, segundo o Alto Comissariado da ONU para Refugiados.
Várias centenas deles foram reassentados de campos de refugiados em Bangladesh para outros países.
Na Malásia, os que estão decididos a demandar status de refugiado e
pedir reassentamento, processo que poderá levar anos, estarão se
juntando a mais de 45 mil rohingyas que já são classificados como
refugiados e esperam para ser levados a outro país.
Eles não recebem ajuda do governo enquanto esperam nem podem trabalhar
legalmente. Tampouco podem mandar seus filhos a escolas do governo.
Eles ficam suspensos em um limbo social e jurídico que entidades
beneficentes locais e trabalhos informais aliviam apenas
temporariamente.
"É muito frustrante para nós", disse Anwar Ahmad, rohingya que vive na
Malásia há 18 anos e ganha a vida no mercado de trabalho informal.
"Estamos gratos por podermos ficar aqui e gratos pela ajuda que
recebemos, mas sem uma posição oficial mais forte não tenho futuro na
Malásia."
Até mesmo conseguir o reconhecimento como refugiado pela Agência de Refugiados da ONU tornou-se extremamente demorado.
Amy Smith, diretora-executiva da Fortify Rights, grupo de direitos
humanos que atua principalmente no Sudeste Asiático, disse que a ONU deu
prioridade aos que estão detidos.
Cerca de mil recém-chegados estão abrigados no centro de detenção de
imigração no nordeste da Malásia. Esses, segundo Smith, poderão ter seus
casos decididos em sete ou nove meses. Os outros vão esperar ainda
mais.
Especialistas em migração dizem que aproximadamente metade da última
leva de migrantes é de bengaleses fugindo da pobreza. Eles não cumprem
os requisitos para serem considerados refugiados e devem ser enviados de
volta ao seu país de origem, segundo os governos indonésio e malásio.
No entanto, Bangladesh pode recusar sua volta.
Os rohingyas, povo muçulmano apátrida que há muito tempo enfrenta
discriminação e é privado de direitos humanos básicos em Mianmar,
provavelmente preencherão os critérios de refugiados sob o direito
internacional. Caso seja reconhecido que eles possuem "um medo bem
fundado" de perseguição por motivos de raça, religião ou nacionalidade
em seu país natal, eles terão direito a reassentamento em outros países.
Os ministros das Relações Exteriores da Tailândia, Malásia e Indonésia
disseram no final de maio que seus países não abrigariam refugiados em
caráter permanente.
O primeiro-ministro da Austrália, Tony Abbott, também disse que seu país não receberá refugiados do atual êxodo.
Cerca de mil rohingyas foram reassentados nos Estados Unidos no último
ano. A Gâmbia se dispôs a receber todos os migrantes rohingyas, mas
especialistas questionaram se o país, da África ocidental, tem essa
capacidade.
A Europa enfrenta sua própria crise migratória. Mais de 1.700 migrantes
da África e do Oriente Médio morreram tentando entrar na Europa por mar
nos primeiros quatro meses deste ano. Outros 26 mil conseguiram chegar
ao continente.
Hasinah, que vive com seu marido e os três filhos em um único quarto em
uma casa compartilhada, tem uma preocupação mais premente: um filho de
13 anos que ela deixou para trás porque não podia pagar para que os
contrabandistas levassem todos. Sua família busca obter meios e dinheiro
para levá-lo à Malásia.
"Aonde quer que sejamos levados, quero estar com meu filho", disse ela.
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