O dia começou de forma bastante corriqueira para um dirigente de um
país às voltas com a desaceleração econômica. Em 24 de julho, Zhou
Benshun participou de uma reunião para promover um plano de crescimento
econômico do presidente Xi Jinping que consiste em construir uma
"supercidade" ao redor de Pequim.
No entanto, às 18h10, a carreira de Zhou havia terminado, e ele se viu
na iminência de passar vários anos na prisão. O órgão de combate à
corrupção do Partido Comunista havia anunciado uma investigação contra
ele por "suspeita de graves violações da disciplina partidária e da
lei".
A repentina queda em desgraça de Zhou ilustra a incerteza que permeia a
elite comunista num momento em que ela precisa lidar com dois
acontecimentos preocupantes: uma desaceleração econômica que parece ser
pior do que as autoridades anteviam e uma campanha oficial anticorrupção
que continuou por mais tempo e que alcançou escalões mais elevados do
que muitos esperavam.
Os mercados ao redor do mundo estão sendo sacudidos pelos temores de que
a China não consiga se manter como o poderoso motor do crescimento
econômico global.
Após o fechamento dos mercados chineses na terça (25), as autoridades de
Pequim tomaram medidas para estabilizá-los, cortando as taxas de juros e
reduzindo o volume financeiro que os bancos são obrigados a manter como
reserva contra riscos.
O homem no centro desta crise é Xi, que assumiu o comando do partido há
quase três anos e vinha implementando uma pauta ambiciosa, mas repleta
de desafios políticos. Agora, esses desafios parecem ter crescido, e há
sinais de que Xi e seu estilo voluntarioso de liderança enfrentam
resistências internas no partido.
Xi se posicionou como o principal arquiteto da política econômica atual,
expondo-se a ser responsabilizado se o crescimento continuar
claudicante. Ao mesmo tempo, o presidente está ganhando inimigos por
causa de uma campanha anticorrupção que já derrubou alguns dos homens
mais poderosos do país e deixou no ostracismo mais de 100 mil
funcionários públicos de escalões inferiores.
Há rumores de que altos funcionários do partido estariam alarmados com a
situação da economia, que no primeiro semestre de 2015 cresceu no ritmo
mais lento em um quarto de século e agora parece estar cada vez mais
descontrolada. Num sinal da sua ansiedade, a liderança promoveu a maior
desvalorização da moeda chinesa em mais de duas décadas, levando os
mercados globais a despencar.
A reputação de Xi também foi abalada por causa da forte queda nas
Bolsas, antes apresentadas pelo governo como uma boa opção de
investimento para os cidadãos chineses.
Veteranos do partido discretamente haviam aconselhado Xi a se focar no
fortalecimento da economia, de acordo com um assessor do partido e do
governo e com o editor de um órgão público de imprensa -ambos pediram
anonimato. O apelo dos dirigentes foi visto como um sinal de
insatisfação com a gestão econômica de Xi e como uma crítica à repressão
a casos de corrupção nos altos escalões, que mancharam o legado desses
dirigentes e atingiram protegidos seus.
Recentemente, dois importantes veículos da mídia estatal publicaram
editoriais incomuns, insinuando haver turbulência interna. O primeiro
saiu em 10 de agosto no influente "Diário do Povo", alertando claramente
os líderes aposentados a se manterem afastados da política. Sem
identificar ninguém, o texto acusava "alguns quadros dirigentes" de
representarem "um dilema para os novos líderes, deixando-os de mãos
atadas para fazerem um trabalho ousado" e "abalando a coesão do partido e
sua força de combate".
Em 19 de agosto, um comentário no site da emissora estatal CCTV
descreveu a feroz resistência contra as políticas de Xi e convocou seus
simpatizantes a intensificarem os esforços para levá-las a cabo.
Xi prometeu amplas reformas pró-mercado para favorecer o crescimento de
longo prazo da economia chinesa. Isso incluía planos para enfraquecer os
monopólios das estatais, reduzindo a importância econômica dos
ineficientes investimentos promovidos pelo Estado, e uma liberalização
dos mercados financeiros, para permitir que o yuan possa concorrer em pé
de igualdade com o dólar.
No entanto, houve pouco progresso rumo a essas metas, e, quando o
crescimento começou a se desacelerar, o governo adotou medidas
-incluindo a intervenção agressiva para sustentar o mercado acionário-
que contrariam os apelos de Xi para que as forças de mercado desempenhem
um "papel decisivo" na economia. Por trás dessa confusão há uma
ansiedade enraizada no seio da liderança sobre uma possível
instabilidade social caso a fase de supercrescimento chinês termine.
O PIB da China cresceu mais de 26 vezes nos 37 anos desde que o país
começou a abrir sua economia, fortalecendo o partido e tirando mais de
600 milhões de pessoas da pobreza.
O assessor político do partido e do governo disse que os temores de que a
desaceleração econômica leve a uma agitação social levaram o Politburo,
em uma reunião de 30 de julho, a aprovar um conjunto de medidas para
reforçar o crescimento.
A campanha de Xi contra a corrupção goza de amplo apoio numa nação onde o
fosso cada vez maior entre ricos e pobres é atribuído à capacidade de
uma pequena minoria de prosperar por abusar de posições governamentais
ou usar conexões políticas. Quando a economia hesita, porém, os riscos
para Xi se multiplicam, disse um funcionário aposentado da instituição
acadêmica do partido.
"O principal é a economia. Se a economia continuar declinando, as
pessoas vão ter cada vez mais acusações a fazer e haverá cada vez mais
pressão sobre a liderança", disse essa fonte, que falou sob condição de
anonimato. "E, neste momento, a economia de fato está em declínio."
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