Mulheres da Arábia Saudita, um dos regimes mais conservadores do planeta, fizeram ontem uma rara mobilização, com o objetivo de acabar com a proibição de dirigirem carros.
O país não tem lei formal que veta mulheres na direção. Mas não emite habilitação a elas com base em interpretações austeras do islã, sustentadas pela população saudita mais moralista.
As ativistas não convocaram uma ação em massa. Em vez disso, deram início ao movimento com uso de redes sociais como Facebook e Twitter e blogs.
Não há um balanço de quantas aderiram ao protesto, mas teriam sido "dezenas" por todo o país. Também não houve relatos a respeito de prisões ou repressão.
A página Women2Drive, no Facebook, afirma que a ação continuará por tempo indeterminado.
Muitas mulheres aprenderam a dirigir fora do país. Uma mulher foi presa depois de postar na internet um vídeo em que estava ao volante.
Manal al-Sherif foi acusada de "prejudicar a reputação do reino no exterior e agitar a opinião pública". Mas foi liberada depois de dez dias sob juramento de não dirigir novamente.
Atualmente, uma mulher só pode sair de carro na Arábia Saudita com um motorista acompanhando. "Tudo o que queremos é sair livres sem depender de ninguém", disse a autora de um vídeo postado ontem.
A vontade de dirigir exposta pelas sauditas na Internet não é nova. Em 2008, a ativista Wajeha al-Huwaidar já publicava imagens suas ao volante de um carro.
Mas o movimento está cada vez mais organizado, culminando na sincronia de vídeos iniciada ontem.
"Nós queremos que as mulheres de hoje comecem a exercer seus direitos", afirmou Wajeha. "Hoje as estradas estão abertas em uma longa campanha. E nós não vamos voltar atrás".
Em grande parte do mundo, uma multa de trânsito é motivo para decepção e angústia. Mas no Reino da Arábia Saudita, onde a tradição não permite que as mulheres guiem seu próprio carro, o registro de uma infração transformou Maha al Qatani em uma heroína, quando ela se tornou a primeira saudita multada de que se tem notícia.
A informação da multa aplicada a Maha foi divulgada por ela mesma no Twitter e registrada também pela revista "Time", que acompanhou o trajeto percorrido pela mulher e por seu marido - no banco do passageiro - pelas ruas de Riad nesta sexta.
"É meu direito, eu não cometi nenhum crime, não matei ninguém, não vendi drogas. Essas pessoas precisam estar na cadeia; não eu por estar exercendo meus direitos", explicou Maha à jornalista Aryn Baker no percurso.
A Arábia Saudita é o único país no mundo em que o governo proíbe as mulheres de dirigir. Nenhuma lei específica veta que as mulheres sejam motoristas, mas um edito religioso apoiado pelo ministério do Interior impede que elas sequer tenham aulas de direção. Para sair de casa, elas dependem de um motorista ou de um parente homem.
"Eu odeio o trânsito. Mesmo que eu tivesse permissão, eu ainda pediria para Mohammad guiar", comenta Maha, despertando as risadas do marido. "A questão é poder ter escolha".
Esse é o espírito da campanha "Women2drive", que ganhou força nas redes sociais defendendo que as mulheres tenham os mesmos direitos que os homens, inclusive o direito de dirigir. A mesma campanha incentivou as mulheres sauditas a sentarem atrás de um volante e desafiarem as autoridades.
Foi o que fizeram dezenas de outras sauditas, cujas histórias já começam a aparecer em posts e vídeos publicados na internet (veja três exemplos abaixo). Entre elas, o caso de Maha ganhou destaque por seu desfecho: parada por um guarda de trânsito que não sabia como lidar com a situação, a saudita acabou ganhando uma multa por guiar sem carteira de motorista.
"É uma multa!", comemorou Maha, segundo a descrição feita na reportagem da "Time". "Escreva aí: eu sou a primeira mulher saudita a ganhar uma multa de trânsito".
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