domingo, 27 de novembro de 2011

A maioria dos participantes era de mulheres. Mil delas, vindas de Fukushima, voltaram a se manifestar no dia 29 de outubro nas ruas de Tóquio para exigir medidas de proteção de seus filhos, protestar contra o conluio entre o governo e os interesses privados para minimizar um risco mal avaliado, e lembrar os valores que o Estado deveria defender, a começar pela proteção da população.
A divulgação dos mapas de depósitos de material radioativo e de preocupantes medições de radiação realizadas mais ou menos oficialmente, informações como a leucemia aguda contraída por Norikazu Otsuka, apresentador de TV que consumia ao vivo produtos da província de Fukushima, alimentam a desconfiança das mães japonesas que muitas vezes têm somente um desejo: se mudar.
"Não confio nem um pouco no que o governo diz", conta Kozue Nogami, cuja filha cursa o ensino primário em Tóquio. "Nem na mídia, que só repete o discurso oficial." O que as prende: o emprego do marido, o empréstimo da casa própria.
Obrigadas a se virar, essas mães criam blogs para trocar informações ou fazem compras pela internet, onde encontram produtos vindos do oeste do Japão, supostamente mais seguros. A sra. Nogami, cujo orçamento alimentar aumentou em 15 mil ienes (R$ 355) ao mês, obriga sua filha a levar uma garrafa de água para a escola. Ela gostaria que sua filha também pudesse levar seu bentô [marmita] para não ter de comer na cantina, mas o diretor é contra.
Esses gestos simples muitas vezes se deparam com as convenções sociais japonesas, muito normativas. O ministério da Educação veicula a ideia de que nada prova o impacto direto das radiações sobre a saúde. "Está tudo bem, não se preocupem" é o discurso martelado pelas autoridades e pela mídia, que as mães não querem ouvir.
A mobilização delas lhes permitiu que obtivessem concessões, como a indicação da origem dos alimentos – a maior parte vem do leste e do norte – e das medições de radiação nas escolas.
Entre as que seguem o discurso oficial, a maioria, não é necessário muito para surgir o temor. "Não temos nenhuma informação", diz uma moradora do distrito de Nakano, próximo ao de Setagaya, onde altos níveis de radiação foram detectados. "Meus filhos comem na escola, mas estou preocupada."
As iniciativas das mães de Tóquio adquirem outra dimensão entre as da província de Fukushima. Lá, várias delas relatam sintomas preocupantes entre os filhos: sangramento nasal, diarreia, inflamação da tireoide. Sachiko Sato, mãe de quatro filhos, ativista da Rede para salvar as crianças das radiações e ambientalista que pratica agricultura orgânica em Kawamata, a 35 quilômetros da usina acidentada, chama atenção para o "abismo entre aqueles que deixaram a região e aqueles que ficaram". Que é seu caso: ela enviou seus filhos para outra cidade, mas não deixou sua casa. "A região de Fukushima é um campo de batalha entre aqueles que são loucos de pensar que podem dominar a natureza e aqueles que a adoram", ela diz.
A sra. Sato considera insuficientes as medidas de monitoramento periódico das crianças por uma ultrassonografia da tireoide. Como muitos japoneses, ela acusa o Estado de utilizar os 2 milhões de habitantes do departamento de Fukushima como cobaias para coletar dados, ao mesmo tempo em que afirmam que não existe perigo. Os dosímetros dados às crianças não são específicos. Os dados reunidos servem para estabelecer índices médios para a região.
As vítimas do desastre nuclear se sentem como as vítimas dos bombardeios de Hiroshima e Nagasaki em 1945, diz Mari Takenouchi, membro da associação que reúne vítimas de acidentes nucleares desde Hiroshima até Fukushima.
Até o tratado de San Francisco de 1952, que devolveu a soberania ao Japão "conforme as ordens do general MacArthur, comandante das forças de ocupação", o destino das vítimas "permaneceu um segredo militar" e "os médicos japoneses eram proibidos de examiná-las", lembra o Dr. Shuntaro Hida, 94, que era médico do hospital militar de Hiroshima e sobreviveu, milagrosamente. "Após o acidente de Fukushima", ele diz, "centenas de pais vieram me consultar, alarmados com os sangramentos de nariz ou com os inchaços da tireoide de seus filhos. Eu não sabia o que lhes dizer."
Para além da política, as exigências das japonesas levam o debate para o terreno emocional mais fundamental do direito à vida, analisa o antropólogo David Slater, da Universidade Sophia em Tóquio. Era nesse terreno que já se posicionava Michiko Ishimire, professora em Minamata, vítima nos anos 1950-1960 de uma intoxicação por mercúrio despejado no mar que resultou em milhares de mortos e crianças deficientes. Através de seus livros, que misturam romance, poesia e diário pessoal, ela contribuiu para uma lenta conscientização dessa trágica poluição industrial. "Em Minamata, colidiram-se dois mundos: o dos pescadores, que viviam em simbiose com a natureza, e um outro para o qual a natureza era somente um objeto a ser dominado", ela disse.
Meio século mais tarde, com a imagem do "campo de batalha" que se tornou a bela região de Fukushima (provavelmente varrida do mapa por décadas), Sachiko Sato faz a mesma triste constatação. Nenhuma lição foi aprendida com uma tragédia que revelou os riscos aos quais a corrida pelo lucro submete um povo.
A maioria dos participantes era de mulheres. Mil delas, vindas de Fukushima, voltaram a se manifestar no dia 29 de outubro nas ruas de Tóquio para exigir medidas de proteção de seus filhos, protestar contra o conluio entre o governo e os interesses privados para minimizar um risco mal avaliado, e lembrar os valores que o Estado deveria defender, a começar pela proteção da população.
A divulgação dos mapas de depósitos de material radioativo e de preocupantes medições de radiação realizadas mais ou menos oficialmente, informações como a leucemia aguda contraída por Norikazu Otsuka, apresentador de TV que consumia ao vivo produtos da província de Fukushima, alimentam a desconfiança das mães japonesas que muitas vezes têm somente um desejo: se mudar.
"Não confio nem um pouco no que o governo diz", conta Kozue Nogami, cuja filha cursa o ensino primário em Tóquio. "Nem na mídia, que só repete o discurso oficial." O que as prende: o emprego do marido, o empréstimo da casa própria.
Obrigadas a se virar, essas mães criam blogs para trocar informações ou fazem compras pela internet, onde encontram produtos vindos do oeste do Japão, supostamente mais seguros. A sra. Nogami, cujo orçamento alimentar aumentou em 15 mil ienes (R$ 355) ao mês, obriga sua filha a levar uma garrafa de água para a escola. Ela gostaria que sua filha também pudesse levar seu bentô [marmita] para não ter de comer na cantina, mas o diretor é contra.
Esses gestos simples muitas vezes se deparam com as convenções sociais japonesas, muito normativas. O ministério da Educação veicula a ideia de que nada prova o impacto direto das radiações sobre a saúde. "Está tudo bem, não se preocupem" é o discurso martelado pelas autoridades e pela mídia, que as mães não querem ouvir.
A mobilização delas lhes permitiu que obtivessem concessões, como a indicação da origem dos alimentos – a maior parte vem do leste e do norte – e das medições de radiação nas escolas.
Entre as que seguem o discurso oficial, a maioria, não é necessário muito para surgir o temor. "Não temos nenhuma informação", diz uma moradora do distrito de Nakano, próximo ao de Setagaya, onde altos níveis de radiação foram detectados. "Meus filhos comem na escola, mas estou preocupada."
As iniciativas das mães de Tóquio adquirem outra dimensão entre as da província de Fukushima. Lá, várias delas relatam sintomas preocupantes entre os filhos: sangramento nasal, diarreia, inflamação da tireoide. Sachiko Sato, mãe de quatro filhos, ativista da Rede para salvar as crianças das radiações e ambientalista que pratica agricultura orgânica em Kawamata, a 35 quilômetros da usina acidentada, chama atenção para o "abismo entre aqueles que deixaram a região e aqueles que ficaram". Que é seu caso: ela enviou seus filhos para outra cidade, mas não deixou sua casa. "A região de Fukushima é um campo de batalha entre aqueles que são loucos de pensar que podem dominar a natureza e aqueles que a adoram", ela diz.
A sra. Sato considera insuficientes as medidas de monitoramento periódico das crianças por uma ultrassonografia da tireoide. Como muitos japoneses, ela acusa o Estado de utilizar os 2 milhões de habitantes do departamento de Fukushima como cobaias para coletar dados, ao mesmo tempo em que afirmam que não existe perigo. Os dosímetros dados às crianças não são específicos. Os dados reunidos servem para estabelecer índices médios para a região.
As vítimas do desastre nuclear se sentem como as vítimas dos bombardeios de Hiroshima e Nagasaki em 1945, diz Mari Takenouchi, membro da associação que reúne vítimas de acidentes nucleares desde Hiroshima até Fukushima.
Até o tratado de San Francisco de 1952, que devolveu a soberania ao Japão "conforme as ordens do general MacArthur, comandante das forças de ocupação", o destino das vítimas "permaneceu um segredo militar" e "os médicos japoneses eram proibidos de examiná-las", lembra o Dr. Shuntaro Hida, 94, que era médico do hospital militar de Hiroshima e sobreviveu, milagrosamente. "Após o acidente de Fukushima", ele diz, "centenas de pais vieram me consultar, alarmados com os sangramentos de nariz ou com os inchaços da tireoide de seus filhos. Eu não sabia o que lhes dizer."
Para além da política, as exigências das japonesas levam o debate para o terreno emocional mais fundamental do direito à vida, analisa o antropólogo David Slater, da Universidade Sophia em Tóquio. Era nesse terreno que já se posicionava Michiko Ishimire, professora em Minamata, vítima nos anos 1950-1960 de uma intoxicação por mercúrio despejado no mar que resultou em milhares de mortos e crianças deficientes. Através de seus livros, que misturam romance, poesia e diário pessoal, ela contribuiu para uma lenta conscientização dessa trágica poluição industrial. "Em Minamata, colidiram-se dois mundos: o dos pescadores, que viviam em simbiose com a natureza, e um outro para o qual a natureza era somente um objeto a ser dominado", ela disse.
Meio século mais tarde, com a imagem do "campo de batalha" que se tornou a bela região de Fukushima (provavelmente varrida do mapa por décadas), Sachiko Sato faz a mesma triste constatação. Nenhuma lição foi aprendida com uma tragédia que revelou os riscos aos quais a corrida pelo lucro submete um povo.
O governo indiano decidiu na quinta-feira (24) permitir que varejistas estrangeiros como Walmart e Tesco abram lojas no país. É a primeira vez que os autores de políticas abrem o vasto e crescente mercado de varejo da Índia para estrangeiros.
A decisão, há muito aguardada do gabinete do primeiro-ministro Manmohan Singh, permitirá que varejistas que vendem múltiplas marcas de produtos detenham 51% de suas operações na Índia, com o restante de propriedade de um parceiro indiano; antes, esses varejistas não podiam realizar negócios de varejo no país.
Empresas como Apple e Nike, que vendem apenas uma marca de produto em suas operações de varejo, agora poderão ser proprietárias de 100% de suas lojas, não mais de apenas 51%.
Um porta-voz do Partido do Congresso do governo confirmou a decisão na televisão indiana, mas não forneceu detalhes sobre ela. A decisão enfrenta oposição dos pequenos comerciantes e de muitos partidos políticos, incluindo um que apoia o governo de Singh. Um importante ministro deverá fazer uma declaração a respeito da decisão no Parlamento na sexta-feira.
Walmart, Tesco, Carrefour e Ikea estão entre as empresas de varejo multinacionais que demonstraram interesse em investir na Índia caso a lei fosse mudada. Na quinta-feira, o Walmart saudou a decisão como “um primeiro passo importante”, acrescentando que a empresa estudaria “as condições e detalhes da nova política e o impacto que teria sobre nossa capacidade de realizar negócios na Índia”.
Analistas disseram que o fato de os autores de políticas terem seguido em frente e aberto o mercado de varejo, apesar da oposição de outros partidos, sugere que podem estar dispostos a abrir a economia ainda mais.
Nos últimos sete anos, a coalizão de governo liderada pelo Partido do Congresso adiou muitas propostas para abertura de setores domésticos, como seguros e aviação civil, para uma maior concorrência e investimento estrangeiro.
“Muitos já tinham quase perdido a esperança de que o governo tomaria uma decisão tão grande”, disse Arvind Singhal, presidente da Technopak Advisors, uma consultoria especializada no setor de varejo. “Há uma grande sensação de alívio.”
Singhal e outros analistas disseram que a Índia precisa de investimento estrangeiro significativo para ajudar a estabelecer um setor moderno de varejo e um sistema de abastecimento mais eficiente. Lojas modernas correspondem a cerca de 5% do setor de varejo de US$ 500 bilhões da Índia, com o restante correspondendo a lojas de esquina e outras pequenas empresas.
Os analistas estimam que até 35% dos hortifrutis indianos estragam antes de chegar ao mercado, em grande parte devido ao sistema de abastecimento antiquado, que inclui muitos mercados atacadistas e intermediários.
Em parte como resultado, os preços dos alimentos indianos frequentemente sobem rapidamente quando há pequenas perturbações na oferta ou na colheita de itens básicos como cebolas e batatas. A inflação dos alimentos tem pairado nos últimos meses próxima de 10%.
Apesar de algumas empresas terem começado a desenvolver redes de abastecimento em partes da Índia, Singhal disse que serão necessários de três a cinco anos de investimento para o estabelecimento de uma rede de oferta mais eficiente. As empresas precisarão trabalhar da estaca zero na construção de depósitos, compra de caminhões e no estabelecimento de relações com produtores rurais e outros fornecedores.
“Eu não vejo qualquer impacto imediato nos próximos seis meses”, disse Singhal. “O desenvolvimento da cadeia de abastecimento leva tempo. Ela avança de um Estado para outro.”
Nos últimos dois anos, o Walmart, o gigante de varejo americano, tem operado lojas de atacado na Índia que vendem apenas para outras empresas; ela atualmente conta com nove lojas. Ele também estebeleceu relacionamentos com produtores rurais em alguns Estados como o Punjab, para fornecimento de hortifrutis para os supermercados da rede de sua parceira indiana, a Bharti Retail. A Metro, uma rede de varejo alemã, também abriu lojas de atacado na Índia. A medida também ajudará empresas indianas como o Future Group, o maior varejista do país, e FlipKart.com, uma loja online que está crescendo rapidamente, que tenham interesse em levantar dinheiro junto a investidores estrangeiros para expandir suas operações.
Em muitos casos, os varejistas indianos, especialmente aqueles que possuem lojas online, vinham estabelecendo empresas de varejo e atacado separadas para contornar as restrições ao investimento estrangeiro. Seus parceiros americanos de capital de risco investem em empresas de atacado, que vendem bens e serviços para as empresas de varejo.
A decisão enfrentará forte oposição dos partidos políticos, incluindo parceiros do Partido do Congresso como o Congresso Trinamool, um partido importante no leste do país.
O principal partido de oposição no Parlamento, o Partido Bharatiya Janata, disse antes do anúncio da decisão que os varejistas estrangeiros apenas ocupariam o lugar das lojas domésticas.
“O investimento estrangeiro direto com bolsos fundos, ao entrar neste segmento, terá um impacto adverso sobre nosso setor doméstico de varejo, que está crescendo”, disse o partido.
A afegã Gulnaz, de 21 anos, enfrentou um duro dilema recentemente. Ela precisou escolher entre permanecer na cadeia cumprindo uma pena de 12 anos por ter sido estuprada por um homem casado ou se unir ao agressor, o que lhe garantiria a liberdade. Pensando na filha de dois anos, que nasceu após o estupro, Gulnaz escolheu a segunda opção.
Conforme contou à rede CNN, a afegã foi violentada pelo cunhado quando tinha 19 anos. “Ele estava com roupas nojentas, porque trabalha na construção civil. Quando minha mãe saiu, ele foi até a minha casa e fechou as portas e as janelas. Eu comecei a gritar, mas ele me calou, tapando minha boca com as mãos”, descreveu Gulnaz.
A garota preferiu não denunciar o agressor, com medo de represálias, mas poucas semanas depois descobriu que estava grávida e o segredo foi revelado à família. Gulnaz foi julgada por adultério e condenada a 12 anos de prisão, assim como o cunhado.
No Afeganistão, uma mulher somente recupera a honra e a liberdade após um estupro ou adultério caso se case com o criminoso. O casamento legitimaria Gulnaz e a filha na sociedade afegã, de acordo com a reportagem da CNN.
Na quarta-feira (23/11), porém, um tribunal de Cabul aceitou somente reduzir a pena de Gulnaz, de 12 para três anos, alegando que ela "demorou demais" para prestar queixa contra o cunhado. O porta-voz do procurador geral da capital afegã, Rahmatullah Nazari, disse à CNN que a investigação concluiu que o sexo foi consensual, por isso Gulnaz foi condenada por adultério.
"Gulnaz alega que foi estuprada. Mas devido ao fato de que ela reportou o crime somente quatro meses depois, não conseguimos encontrar nenhuma evidência do ataque", afirmou Nazari.
A jornalista egípcia Mona Eltahawy usou o Twitter para denunciar abuso por parte dos oficiais do país em meio aos protestos contra as medidas anunciadas pela Junta Militar que governa o país. Mona alega ter sofrido abusos e espancamentos enquanto esteve detida no ministério do Interior, pelas Forças de Segurança Central do Egito.
"A inteligência militar me vendou por duas horas. Eu não queria ter ido com eles, mas me disseram que eu iria ou educadamente ou de outro jeito", postou Mona que foi libertada nesta quinta-feira após 12 horas detida. Segundo ela, ao denunciar o caso as autoridades lhe disseram que não souberam explicar o motivo de sua detenção.
Também no Twitter ela postou uma foto onde aparece com os dois braços enfaixados após ter sido liberada do hospital.
Sobre a violência sexual, ela disse que "cinco ou seis me cercaram, apertaram meus seios, pegaram na minha área genital e eu perdi a conta de quantas mãos tentaram entrar nas minhas calças".
"Eles são cachorros e seus chefes são cachorros. F*, polícia egípcia", escreveu ela em referência aos soldados da Força de Segurança Central.
"Não posso imaginar como meus familiares e amigos ficaram nessas últimas 12 horas, preocupados comigo. Me desculpem", postou ela.
Mona já passou por jornais como The Washington Post, The New York Times, e The Huffington Post, e é conhecida por sua postura crítica ao governo egípcio e ativismo pelos direitos humanos.
Prabhu Kumar encontrou na Amazon.com um livro que procurava, por US$ 10. Mas teria de pagar mais de US$ 9 em frete.
Por isso Kumar agora compra na FlipKart.com -a resposta indiana à Amazon-, que às vezes leva só 24 horas para entregar, sem custo extra. E ele só precisa pagar, em dinheiro ou cartão, quando o entregador chega rapidamente à sua porta.
"Acho que isso se adéqua perfeitamente à mentalidade indiana", diz Kumar, programador de softwares digitais.
Dezenas de empresas de comércio eletrônico surgiram nos últimos tempos para aproveitar o crescente uso da internet na Índia, mas muita gente no país continua avessa ao uso do cartão de crédito em compras on-line.
Por isso, os sites de varejo se empenham em conquistar os clientes. O pagamento pode ser feito em dinheiro, no ato da entrega, e esquadrões de entregadores garantem a rapidez da distribuição das mercadorias.
A internet ainda responde por uma parcela pequena do varejo indiano -uma estimativa é de US$ 10 bilhões, em um universo de US$ 500 bilhões-, mas está crescendo rapidamente.
A FlipKart diz que faturou 500 milhões de rúpias (US$ 11 milhões) no último ano fiscal, e que hoje vende cerca de 10 milhões de rúpias por dia.
O site de descontos SnapDeal.com, que era inexpressivo em 2010, espera faturar 1,5 bilhão de rúpias neste ano. No Future Group, maior empresa indiana de varejo, executivos dizem que o faturamento on-line deve triplicar até março.
O rápido crescimento atrai investidores de risco, que despejaram US$ 183 milhões em 20 empresas de comércio eletrônico nos últimos 12 meses - o triplo do valor investido em 13 empresas nos 12 meses anteriores, segundo a empresa de pesquisas Venture Intelligence.
Os varejistas dos EUA também se interessaram. A Amazon, que tem uma unidade de desenvolvimento de software em Bangalore, está construindo um depósito e contratando funcionários para um site indiano, segundo duas fontes do setor. E, meses atrás, o Groupon adquiriu o site indiano SoSasta.com.
A empresa de pesquisas JuxtConsult, de Nova Déli, estima que o número de pessoas que compraram alguma coisa pela internet na Índia saltou de 10 milhões de pessoas no ano passado para 17 milhões em 2011. O governo local calcula que o consumo das famílias cresceu mais de dois terços em cinco anos.
"Isso parece mais ser algo real do que um mero fogo de palha", disse Kanwaljit Singh, diretor da Helion Advisors, que já investiu em uma meia dúzia de sites indianos de comércio eletrônico.
Mas os criadores da FlipKart, Sachin Bansal e Binny Bansal (que não são parentes), precisaram fazer coisas que os empreendedores americanos e europeus jamais necessitaram. Eles montaram operações de entrega em 13 grandes cidades do país, já que as transportadoras locais não estão adequadamente preparadas para despachar e monitorar as entregas. Eles planejam ampliar o sistema de entregas para 25 cidades dentro de um ano.
O executivo-chefe Sachin Bansal disse que, tendo uma equipe própria, a FlipKart evita o pagamento de uma comissão superior a 2%, cobrada das transportadoras para cobranças no ato da entrega, modalidade solicitada em cerca de 60% das encomendas. A FlipKart também consegue monitorar com mais precisão os seus pacotes, e, devido aos baixos custos trabalhistas na Índia, cada entrega custa apenas US$ 1 por volume.
"Mais de 90% das transações varejistas na Índia são em dinheiro", disse ele. "Precisamos aceitar dinheiro [para aumentar o número de clientes]."
A FlipKart não está sozinha. O site Myntra, que vende roupas pela internet, tem uma equipe de entregas em Bangalore e pretende contratar entregadores em outras cidades. A SnapDeal permite que seus clientes paguem uma parte no site, e quitem o resto diretamente junto às empresas fornecedoras.
"Hoje eles são os melhores", disse Ananth Padmanabhan, vice-presidente de vendas da Penguin India, referindo-se à FlipKart. Mas, segundo ele, funcionários da Amazon têm conversado com as editoras.
Sachin Bansal, que foi colega de Binny Bansal como desenvolvedor de software na Amazon, rejeitou a hipótese de que seria conveniente para a Amazon adquirir a FlipKart. "Estamos muito interessados em seguirmos por conta própria."
Conforme as cidades se tornam mais cheias e complexas, elas tentam manter seus moradores constantemente conectados, para continuarem sendo competitivas, animadas e governáveis.
A busca é cada vez mais por disponibilizar conexões velozes em qualquer lugar, a qualquer hora, e por um preço razoável para o consumidor.
Seul está à frente nisso. E, segundo as autoridades locais, isso ainda não é nada.
Nos próximos três a quatro anos, o programa de infraestrutura Smart Seoul 2015 irá estabelecer novas referências em termos de conectividade.
"Vamos expandir o bem estar digital para todos os cantos da cidade", disse Hwang Jong-sung, chefe do Departamento de Planejamento dos Sistemas de Informação da Prefeitura de Seul, responsável pelo Smart Seoul.
A iniciativa de US$ 792 bilhões é destinada a adaptar e democratizar os serviços municipais à era da internet móvel.
Até 2015, quando 80% dos moradores deverão ter smartphones ou tablets, a conectividade será quase tão gratuita quanto onipresente: a prefeitura está instalando pontos de acesso wi-fi grátis em todos os espaços públicos da cidade, incluindo 360 parques, 3.200 cruzamentos e 2.200 ruas em torno de centros comerciais. Quem tiver algum aparelho sem fio não precisará mais entrar em LAN houses nem esperar para chegar em casa a fim de ler e-mails ou conferir a cotação das Bolsas internacionais.
Seul já é a líder mundial em uma pesquisa sobre "governos eletrônicos" locais, feita pela Universidade Rutgers, de Nova Jersey. Nove em cada dez moradores são assinantes de uma conexão rápida sem fio.
Pela internet, os cidadãos podem fazer cópias da declaração de imposto de renda, pagar todas as contas de serviços municipais e reservar lugar num concerto do auditório municipal. Até 2015, será possível fazer isso e muito mais com smartphones.
Participantes de concorrências municipais já enviam suas propostas pela internet, e elas são divulgadas on-line.
Esse processo ajuda a reduzir a corrupção em uma prefeitura que já foi conhecida no passado como "bokmajeon", o equivalente sul-coreano da mitológica caixa de Pandora.
Até 2015, todos os estudantes sul-coreanos receberão tablets em vez de livros didáticos em papel. A lição de casa será colocada na rede, em vez de ser carregada pelos alunos na mochila.
Nesse mesmo prazo, Seul criará um serviço pelo qual pais preocupados com sequestros poderão monitorar a localização dos filhos por meio do computador doméstico ou de smartphones. As crianças participantes receberão etiquetas eletrônicas.
No total, a cidade espera também reduzir em 10% a sua taxa de criminalidade, graças à instalação de mais câmeras de vigilância, algumas das quais capazes de detectarem um grito de socorro a quilômetros de distância.
Tanta conexão está mudando as práticas de governo e a vida cotidiana desta metrópole de 10 milhões de habitantes.
Outro dia, a colegial Yoon Hyo-mi passou zunindo pela catraca eletrônica da estação Gwanghwamun do metrô, no centro de Seul. Um chip embutido no cartão de crédito dela debitou a tarifa.
Num terminal de ônibus no lado de fora, um placar eletrônico avisava que o ônibus dela chegaria em 6 minutos.
Se ela quisesse, poderia consultar uma estimativa em tempo real do horário de chegada dela em qualquer ponto de ônibus da cidade, usando o smartphone.
O aplicativo para isso foi inventado por outro colegial, usando dados da intrincada rede de ônibus de Seul, parte de um crescente conjunto de dados que a prefeitura está abrindo ao público para estimular a criação de recursos como esse.
Roland Villinger, diretor da McKinsey & Company na Coreia do Sul, diz que Seul é cada vez mais vista como um campo de testes para inovações.
A pesquisa "i-consumer", feita neste ano pela McKinsey em seis países (Alemanha, Coreia do Sul, Espanha, Estados Unidos, Reino Unido e Japão), mostrou que os sul-coreanos foram os que mais rapidamente adotaram o uso diário de smartphones.
"O que as pessoas da Coreia ou de Seul acham sobre um determinado produto tem importância global atualmente", afirmou Villinger.
Para Min Seong-joon, funcionário da Pantech, fabricante local de celulares, as novas tecnologia já implicam uma maior comodidade.
Recentemente, durante uma onda de calor, Min, no seu carro, usou o celular para ligar o ar condicionado no seu apartamento, de modo a encontrar a casa na temperatura ideal quando chegasse lá alguns minutos depois.
"No futuro próximo, você não precisará nem tocar no seu smartphone", disse Kang Shin-dong, presidente da iDosi, empresa sul-coreana de desenvolvimento de softwares.
"O software da sua casa e do seu carro vai achar onde você está e ligará as luzes, o motor ou a música a tempo de você chegar."
A trama do filme "Mala Aai Vhhaychy" (Quero ser mãe), falado em marathi, formula uma pergunta simples: Yashoda, uma mulher que se oferece como barriga de aluguel para escapar da pobreza, tem algum direito sobre o filho que está gestando contratualmente para Mary, uma "turista de fertilidade" americana?
No mundo melodramático do cinema indiano, a resposta é um caloroso "sim". Na vida real, contudo, pode não ser tão simples incluir um final feliz no roteiro.
Desde 2002, quando a maternidade substituta, ou barriga de aluguel, foi legalizada na Índia, o setor vem crescendo, tendo se tornado uma parte importante do lucrativo mercado de turismo médico do país.
Para os pais potenciais, contratar uma mulher para ser barriga de aluguel custa cerca de US$ 14 mil na Índia, contra estimados US$ 70 mil nos Estados Unidos. Um estudo de 2008 estimou que o setor da reprodução assistida na Índia movimentava US$ 450 milhões por ano.
Clínicas de fertilidade em todo o país procuram reproduzir o sucesso da Akanksha e outras clínicas situadas na pequena cidade de Anand, no Estado ocidental de Gujarat, que foi o primeiro centro de maternidade de substituição no país. Mas o boom oculta as preocupações crescentes com os direitos das mulheres, muitas delas pobres e algumas analfabetas, que optam por tornar-se mães de aluguel.
Ainda não existem na Índia leis que tratem diretamente das complexidades da maternidade de substituição, embora uma lei sobre tecnologias de reprodução assistida esteja sob discussão no Parlamento, com a expectativa de que seja ratificada até o início de 2012. Mas uma equipe de pesquisadores da Sama, uma ONG que atua com saúde feminina, levantou preocupações com a lei em um artigo recente. "As muitas questões éticas que estão surgindo em função da multiplicação irrestrita de tecnologias ainda permanecem", escrevem os pesquisadores.
A legislação procura regulamentar as clínicas e os médicos de tecnologias reprodutivas, além da relação deles com as potenciais mães de aluguel.
Embora a Sama veja com bons olhos esta tentativa de regulamentar o setor, a entidade teme que a legislação proposta priorize os direitos do casal que "encomenda" o bebê, em detrimento da mãe de aluguel. A lei deixa claro que as mulheres que atuam como barrigas de aluguel comercial não têm direito algum sobre o filho que concordam contratualmente em gestar. A lei proposta não define os valores a serem pagos à mãe de aluguel em casos de aborto espontâneo ou outras complicações da gravidez.
A lei provavelmente vai estipular que apenas mulheres de entre 21 e 35 anos possam ser mães de aluguel. Ela define o número máximo de vezes em que uma mulher pode alugar seu útero em cinco gravidezes que terminem em partos de bebês vivos, contra três em um projeto de lei anterior.
Quando as primeiras clínicas foram abertas em Gujarat, a fundadora da Akanksha, Nayna H. Patel, disse que a maternidade substituta é benéfica para todos. Muitos médicos indianos concordam, dizendo que é do interesse das clínicas cuidar bem das barrigas de aluguel.
"A maioria das clínicas garante proteção à mulher, cuidando de sua saúde, nutrição e necessidades diárias", disse Ruma Satwik, consultora do hospital Sir Ganga Ram, em Déli.
Mas hoje a responsabilidade por cuidar das mulheres cabe aos médicos e às clínicas.
"Temos documentos legais de todo tipo para proteger o casal que encomenda o bebê", disse Satwik. "Mas a mãe de aluguel pode perder, na ausência de leis concretas que a protejam."
Em 2008, Sadhna Arya, um ginecologista em Jaipur, fez parte de uma equipe médica envolvida no caso complexo de um bebê nascido de uma mãe de aluguel indiana depois de o casal de japoneses que encomendou a criança ter decidido se divorciar. Na época, Arya se manifestou publicamente contra o tratamento dado às mães de aluguel na Índia: "Vocês trataram a mãe de aluguel como um objeto, a usaram como se fosse uma fábrica".
Hoje Arya fala com franqueza: "As mães de aluguel são de origem pobre e mal têm consciência de seus direitos. A lei ART busca um equilíbrio entre o legal e o antiético, mas as práticas antiéticas não foram erradicadas."
A empregada doméstica Manju, 29 anos, de Déli, pensa em ser barriga de aluguel desde que sua cunhada deu à luz um bebê dessa forma, dois anos atrás.
"Ela ganhou muito dinheiro -mais do que eu ganho em um ano", disse Manju
Agora ela estuda uma oferta que recebeu. "Riscos? Que riscos? Qualquer idiota pode ter um filho. É preciso uma mulher inteligente para ser paga por isso."

domingo, 20 de novembro de 2011

Parte dos judeus da região central de São Paulo diz estar "bastante incomodada" com o resultado da restauração dos painéis da estação Marechal Deodoro do metrô.
O principal motivo, segundo ela, é a inclusão e destaque dado à imagem do líder palestino Yasser Arafat (1929-2004) em meio aos rostos que compõem o painel sobre a "Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão".
"Apesar de querer defender o direito de seu povo, ele o fez de maneira totalmente contrária aos direitos humanos. Fez com terrorismo" diz o médico Alexandre Matone.
"Parece perseguição proposital. Colocar essa imagem logo num bairro judaico? O metrô deveria se prestar a promover um bom transporte público e não para importar guerras", completa.
A restauração foi concluída em outubro passado pelo artista plástico Gontran Guanaes Netto, 78, o mesmo que pintou sete painéis em 1989. Ele disse ter incluído o rosto de Arafat por ser favorável à causa palestina.
Além de rostos de anônimos, Gontran já havia colocado figuras históricas como o brasileiro Carlos Marighella (1911-69), a alemã Olga Benário (1908-42) e o chileno Salvador Allende (1908-73).
O vice-presidente executivo da Federação Israelita do Estado, Ricardo Berkiensztat, disse considerar "infeliz" a ideia de colocar a imagem para representar os direitos humanos. Uma incoerência.
"Acho que há pessoas muito identificadas com direitos humanos. A história dele está envolvida na morte de muitos, a maioria é de civis inocentes", complementa.
Berkiensztat diz que vai pedir uma explicação ao metrô sobre o assunto, para entender os motivos dessa escolha, mas que não vê uma afronta à comunidade judaica. "Se fosse Adolf Hitler [1889-1945], aí sim seria uma afronta e teria uma atitude mais radical da nossa parte", afirma.
Para o xeque Jihad Hassan Hammadeh, da União Nacional das Entidades Islâmicas no Brasil, a escolha de Arafat para compor o painel é uma homenagem justa porque ele recebeu o prêmio Nobel da Paz, em 1994."Eles (judeus) podem reclamar, mas podem não cercear o artista."
"Arafat deu o primeiro passo para a paz. Cumprimentou o presidente israelita. Parte dos judeus tem boa imagem dele", diz. O Metrô informou não ter recebido queixas.
Cerca de 40 mulheres israelenses decidiram tirar a roupa para mostrar solidariedade a uma egípcia de 20 anos que causou furor no mundo árabe na semana passada ao postar uma foto de si mesma nua em seu blog. A publicação da imagem seria um protesto contra a falta de liberdade de expressão em seu país. De acordo com o site israelense "Ynet News", para apoiar a blogueira, Aliaa Magda Elmahdy, --que estaria recebendo ameaças devido à publicação da imagem-- as israelenses posaram nuas em uma foto em grupo. No entanto, elas optaram por não aparecer nuas, e sim atrás de uma faixa. A organizadora do protesto, Or Tepler, 28, abriu uma página no Facebook convidando mulheres a "demonstrarem seu apoio, de uma forma legítima e não-violenta, a uma mulher como todas as outras - jovem, ambiciosa, cheia de sonhos e, evidentemente, com um senso de humor apurado". "Garotas, vamos dar ao mundo uma boa razão para verem a beleza única das mulheres israelenses", escreveu Tepler. "Sem importar se elas são judias, árabes, heterossexuais ou lésbicas, porque aqui, como vocês sabem isso não importa. Vamos mostrar que nosso discurso internacional não depende de governos". As participantes foram fotografadas segurando uma faixa onde se lê "Amor sem limites" e "Homenagem a Aliaa Elmahdi. Irmãs em Israel."

Para muitas mulheres que moram aqui, a lista dos "100 Lugares Mais Perigosos" de Déli compilada pela Whypoll, uma rede social de cidadãos, evoca associações desagradáveis.
Dhaula Kuan, o bairro que está no topo da lista, é onde, em 2010, uma jovem funcionária de um call center que voltava de casa para o trabalho foi sequestrada e estuprada por um grupo de homens num carro. Em segundo lugar está Nelson Mandela Marg, a rua em que a jornalista Sowmya Viswanathan foi roubada e baleada por quatro homens em 2009.
A estação de metrô Ghitorni é onde, este ano, uma mulher foi arrastada para fora do carro de seus parentes e sequestrada por cinco homens em outro carro depois de uma discussão entre os dois grupos.
Quando o Escritório Nacional de Estatísticas Criminais do governo divulgou seus números para o último mês de 2010, poucos ficaram surpresos com o fato de que, mais uma vez, Déli estava em primeiro lugar na índia em casos de estupro denunciados. Uma alta incidência de outros crimes, como sequestros e assassinatos relacionados a dotes de casamento, reforça a crença generalizada de que a capital indiana pode ser perigosa para as mulheres.
Agora, a Whypoll, que foi fundada em 2008 por dois jornalistas, Hindol Sengupta e Shweta Punj, está entrando em ação. Depois de mapear os lugares mais perigosos de Déli a partir de denúncias fornecidas por mais de 50 mil cidadãos que compartilharam as experiências de assédio e violência contra mulheres, a Whypoll lançará, ainda este mês, o primeiro aplicativo de celular de emergência para mulheres na Índia.
O aplicativo FightBack tem como objetivo dar às mulheres a capacidade de reportar crimes e pedir ajuda por meio de uma variedade de plataformas, usando redes sociais como o Twitter e o Facebook, bem como o site da Whypoll.
"Ambos crescemos em Déli", disse Punj, "e a violência contra as mulheres é um problema tão óbvio e gritante. Sentíamos que deveria haver uma forma de lidar melhor com as preocupações das mulheres."
Levou um ano para desenvolver o aplicativo FightBack, que pretende combater o que muitos acreditam ser uma resistência crônica em reportar os crimes na capital. Por exemplo, a Comissão Nacional para Mulheres, uma agência do governo, registrou 526 queixas de assédio de mulheres de Déli, somente este ano, que não foram relatadas à polícia, e observou que as reclamações contra a apatia da polícia eram comuns.
O Departamento de Polícia de Déli tem uma seção dedicada aos Crimes Contra Mulheres, que foi estabelecida em 1983, em resposta à falta de treinamento para lidar com crimes contra mulheres, como escreveu o ex-comissário adjunto de polícia Kanwaljeet Deol.
"A sensibilidade do policial médio ao lidar com uma mulher assediada e assustada deixa muito a desejar", escreveu Deol num artigo sobre a conduta da polícia em 2005. Seis anos depois, a seção especial parece ter feito uma diferença, mas muitas mulheres continuam relutantes em ir à delegacia, com medo da polícia ou por pressão da família para não relatar os crimes.
É aí que o FightBack espera fazer a diferença.
"Há uma falta de dados concretos sobre os crimes contra mulheres", disse Sengupta, que acredita que a disponibilidade de mais informações - sobre a natureza da violência que as mulheres enfrentam e os lugares onde ela é mais provável - é crucial para mudar a situação.
Em seu primeiro ano, o aplicativo FightBack será um download pago, vendido por menos de 100 rúpias, ou cerca de US$ 2, e será em inglês, antes de ser lançado em hindi e outras línguas indianas.
"Pensamos em distribui-lo de graça", disse Punj. "Mas 100 rúpias é uma taxa única bem barata, e os indianos dificilmente respeitam coisas gratuitas. As pessoas levarão mais a sério se tiverem que fazer um pequeno investimento."
O aplicativo FightBack, que atualmente está sendo testado por pequenos grupos de usuários, permite às mulheres reportarem assédios ou violência de diversos níveis, quer sejam comentários obscenos ou ataques físicos. O usuário pode programar até cinco números de telefones para quem uma mensagem de texto com informações de GPS será enviada no caso de uma emergência.
"Incluímos o número de Socorro da Polícia de Déli como um dos números que as mulheres podem incluir em sua lista", diz Sengupta, "e estamos muito interessados em ver quantas mulheres escolherão esta opção."
A ideia de usar crowdsourcing para atacar a violência contra as mulheres está ganhando terreno, dentro e fora da Índia. Punj disse que a equipe da Whypoll se inspirou no HarassMap do Egito, que foi iniciado por Rebecca Chiao, uma defensora dos direitos das mulheres que começou a trabalhar em cima de uma maneira melhor de reportar a violência contra as mulheres em 2008. Naquele ano, o Centro Egípcio para os Direitos das Mulheres divulgou os resultados de um estudo que dizia que 83% das mulheres egípcias haviam sofrido assédio sexual. Como o FightBack, o HarassMap permite que os usuários reportem assédio sexual e nas ruas por meio de uma variedade de plataformas, de mensagens para o Twitter até denúncias diretas para o site do serviço.
Na Libéria, o Ushahidi (que significa "testemunho" em swahili), costuma ser citado como um exemplo de como usar a internet para reportar e mapear a violência. No Haiti, o projeto Ayiti SMS SOS encorajou as pessoas a reportarem abusos aos direitos humanos e recebeu muitas denúncias de violência contra a mulher, dando aos ativistas uma compreensão melhor sobre a violência sexual nos campos de desabrigados pelo terremoto de janeiro de 2010.
"O FightBack não é uma solução completa", disse Sengupta. "Não vou resolver o problema da violência contra as mulheres. Mas o que estamos esperando é que isso nos dê um retrato claro da amplitude do problema, e que dê às mulheres – passantes e cidadãos comuns – uma forma de se envolver."
"Se funcionar", diz Punj, "gostaríamos de trabalhar num aplicativo para combater a violência doméstica.”
A característica mais impressionante na Usina Nuclear de Fukushima, no Japão, não eram os prédios dos reatores explodidos ou as paredes improvisadas contra o tsunami, mas a bagunça caótica.
O terreno em torno dos prédios dos quatro reatores estava cheio de caminhões destruídos, vigas de metal torcidas e estruturas de prédios quebradas. Todos quase da mesma forma como estavam logo depois que um dos maiores terremotos registrados deu início a uma reação em cadeia que devastou a região e, em certa medida, o Japão. Os danos atingiram o segundo andar, num testemunho do tamanho aterrador do tsunami que atingiu os prédios dos reatores, mesmo eles estando há dez metros do nível do mar.
Num país compulsivamente organizado como o Japão, o fato de o cenário ter mudado tão pouco desde o desastre de oito meses atrás é um sinal que demonstra a intimidadora tarefa que os trabalhadores enfrentaram para controlar os três reatores danificados da usina.
A visita da imprensa ao local, a primeira desde que o desastre aconteceu em 11 de março, pareceu uma forma de a Tokyo Electric Power Co. declarar que está confiante de que está quase estabilizando a usina.
A mensagem foi transmitida pelo ministro que supervisiona a resposta do governo ao acidente nuclear, Goshi Hosono, que visitou a usina junto com os jornalistas. Dirigindo-se a centenas de funcionários espremidos no centro de resposta a crises da usina, Hosono elogiou seu trabalho duro em condições difíceis e perigosas.
"Vocês conseguiram colocar um fim à situação extremamente excruciante que enfrentamos em março e abril", disse Hosono, que usava o uniforme azul dos trabalhadores. "É por isso que conseguimos chegar onde estamos agora."
A conversa esperançosa tratou superficialmente algumas verdades mais inquietantes. Há apenas duas semanas, a Tepco anunciou que havia encontrado sinais de que um dos núcleos dos reatores pode ter tido uma nova explosão de fissão, um sinal temeroso de que a companhia pode não estar tão perto de estabilizar a usina como diz. E mesmo quando este estágio for alcançado, o país enfrentará décadas de limpeza cara antes que a região em torno da usina possa se tornar habitável novamente.
Embora ninguém tenha morrido no acidente nuclear, os custos ambientais e humanos ficaram claros durante o trajeto de 20 quilômetros pela zona de evacuação até a usina.
As plantas descuidadas do lado de fora de uma floricultura abandonada estavam secas, e mortas. Corvos tomaram conta de um posto de gasolina. Os dosímetros dos jornalistas no ônibus apitavam constantemente, registrando níveis de radiação que aumentavam a cada quilômetro: 0,7 microsieverts em Naraha, na borda da zona de evacuação; 1,5 em Tomioka, onde casas em estilo da Bavária serviam como centro de recepção para Fukushima Daiichi. Era lá que os visitantes japoneses recebiam a informação de que a energia nuclear era segura.
Atualmente o nível é cerca de 13 vezes maior que a dose máxima anual recomendada para civis.
Na usina, os jornalistas, vestidos com macacões anticontaminação, foram mantidos no ônibus por causa dos níveis muito mais altos de radiação que havia ali.
Os funcionários da companhia que estavam no ônibus estavam ansiosos para mostrar uma das principais realizações da companhia até agora: a conclusão de uma imensa superestrutura construída sobre o reator 1, destinada a limitar ou impedir o vazamento. A companhia disse que uma tampa semelhante logo será construída sobre o reator 3, severamente danificado.
Os guias da visita também apontaram para um complexo de grandes tendas brancas reforçadas na base com sacos pretos de areia para proteger os funcionários da radiação, com bandeiras norte-americanas, francesas e japonesas sobre a entrada. As tendas abrigavam um massivo sistema construído por um grupo de companhias multinacionais para descontaminar a água.
A água faz parte de um novo sistema de resfriamento que a Tepco disse que finalmente conseguiu reduzir as temperaturas no núcleo dos reatores danificados abaixo dos 100 ºC, um passo necessário para atingir o que é conhecido como "fechamento a frio". O sistema substitui as medidas desesperadas de resfriamento tomadas depois que o sistema ordinário foi destruído pelo tsunami, quando caminhões de bombeiro jogaram água nos reatores em tentativas desesperadas de evitar o superaquecimento e um derretimento ainda maior.
Dezenas de caminhões de incêndio ainda estavam na usina, bem como um campo de tanques prateados de quatro andares recém-construídos para abrigar a maior parte das 90 mil toneladas de água contaminada que foi jogada nos reatores.
Esse número ajuda a explicar a magnitude do que aconteceu em Fukushima e os desafios pela frente. Outro número que conta a história: até agora, a Tepco guardou 480 mil conjuntos de roupas de proteção, descartadas a cada vez que eram usadas pelos trabalhadores.
A estrela da coletiva de imprensa foi Masao Yoshida, gerente da usina e um homem hoje reverenciado por sua resistência depois de meses de trabalho cansativo e com frequência desanimador.
Durante a coletiva, ele, sobretudo, ateu-se à mensagem que a Tepco queria transmitir: "Não tenho dúvidas de que os reatores foram estabilizados", disse ele. Mas num eco de sinceridade que ganhou a admiração do então-primeiro-ministro, Naoto Kan, no ápice da crise, ele acrescentou uma nota de precaução: "ainda há perigo".
Esta visão é compartilhada por muitos especialistas nucleares, que dizem que ainda existem desafios sérios.
O maior é o fato de que a companhia não sabe a condição exata do combustível dentro dos reatores 1 e 3, cujos núcleos parecem ter derretido além dos recipientes internos de contenção.
"O fechamento a frio é uma indicação de que a fase de acidente terminou", disse Akira Tokuhiro, professor de engenharia nuclear na Universidade de Idaho, "mas a próxima fase de limpeza levará mais de 20 anos."
Outro desafio será limpar o prédio que abriga o reator 4, onde a piscina altamente radioativa para os tubos de combustível usados ficou muito danificada. Do ônibus, o guindaste verde sobre a piscina estava totalmente visível uma vez que todo o lado sul do prédio parece ter sido destruído por uma explosão de hidrogênio em março.
O prédio do reator 3 estava ainda mais danificado, reduzido a uma estrutura que desabou numa pilha de escombros.
O ônibus continuou andando até as áreas mais contaminadas na base dos reatores para limitar o tempo lá e, assim, a exposição à radiação. Quando ele se aproximou, um detector de radiação no ônibus saltou para 300 microsieverts por hora – alto o suficiente para atingir a dose máxima recomendada anualmente em apenas três horas.
Os únicos seres humanos visíveis na usina eram grupos de trabalhadores com roupas de proteção e capacetes amarelos ou vermelhos. Eles pareciam fora do lugar entre as florestas tranquilas de pinheiros que se espalham pela maior parte do terreno da usina, ainda povoadas por libélulas.
Um dia antes da visita, os jornalistas receberam instruções sobre como colocar suas roupas de proteção e fizeram uma visita às máquinas avançadas de detecção que monitoram a exposição dos trabalhadores à radiação. A detecção acontece no J-Village, um centro de treinamento da seleção nacional de futebol no limite da zona de evacuação que foi transformado em ponto de encontro para os funcionários da usina.
Um funcionário, Hiroyuki Shida, 57, disse que as condições na usina melhoraram muito com os novos confortos como uma sala para os funcionários e um refeitório. Mas ele disse que a batalha para estabilizar a usina ainda não terminou.
"O humor dentro de Fukushima Daiichi está bem diferente agora", disse Shida, que monitora o lixo contaminado. "Agora, os níveis de radiação não estão tão altos do lado de fora dos prédios. Mas eles ainda estão altos dentro dos prédios dos reatores. E há lugares quentes, então precisamos ter cuidado."
Essa precaução pode ser observada no único prédio dentro da fábrica onde as roupas de proteção não são necessárias. Os jornalistas visitantes passaram por uma série de salas onde equipes de trabalhadores cortavam sistematicamente as camadas de roupas protetoras com tesouras. O descarte é feito em estágios para limitar a contaminação; as botas ficavam numa sala, o macacão em outra.
Dentro do centro, as paredes estão cobertas de origamis de garça -o símbolo da realização dos desejos, nesse caso do desejo pela segurança dos corajosos funcionários e pela resolução da crise. Também há posteres cobertos com autógrafos e palavras de encorajamento.
"Fiquem firmes", diz um. "Por Fukushima, pelo Japão e pelo mundo."

sábado, 19 de novembro de 2011

Quando o romancista Murong Xuecun apareceu em uma cerimônia no ano passado para receber seu primeiro prêmio literário, ele segurava uma folha de papel com algumas das palavras mais incendiárias que já escrevera.
Era uma meditação sobre o mal estar causado pela censura. "A escrita chinesa exibe sintomas de um distúrbio mental", pretendia dizer ele. "Este é um escrito castrado. Sou um eunuco proativo, me castro antes mesmo de o cirurgião erguer o bisturi."
Os organizadores da cerimônia o proibiram de proferir o discurso. Sobre o palco, Murong fez um gesto de quem fecha a boca com zíper, e saiu sem dizer palavra.
Ele então fez com o discurso o que havia feito com três dos seus romances de sucesso, todos eles submetidos a uma rigorosa censura: colocou na internet o texto sem cortes. Os fãs foram atrás.
Murong Xuecun é o pseudônimo de Hao Qun, 37, um dos mais famosos numa safra de escritores chineses que se tornaram sensações editorais na última década graças ao uso astuto que fazem da internet.
Os livros de Murong são picantes, violentos e niilistas, com histórias de empresários e autoridades envolvendo-se em subornos, brigas, bebedeiras, jogos de azar e programas com prostitutas nas prósperas cidades chinesas.
O simples fato de seus livros serem publicados na China mostra como o setor, outrora muito controlado pelo Estado, está mais voltado para o mercado.
Mas a prosa de Murong inevitavelmente esbarra na censura. O autor se diz um "criminoso da palavra" aos olhos do Estado, e um "covarde" aos seus próprios olhos, por recorrer à autocensura. Ele contou que já abandonou pela metade dois romances que suspeitava que jamais seriam publicados.
"O pior efeito da censura é o impacto psicológico sobre os escritores", disse Murong.
"Quando eu estava trabalhando no meu primeiro livro, não me importava se ele seria publicado, então escrevi o que quis. Agora, após ter publicado alguns livros, posso sentir claramente o impacto da censura quando escrevo. Por exemplo, penso em uma frase, e aí percebo que ela certamente será suprimida. Então nem a escrevo. Essa autocensura é o pior."
Suas frustrações o levaram a se tornar um dos mais inflamados críticos da censura na China. Após fechar a boca em novembro de 2010 em Pequim, ele leu publicamente seu discurso proibido três meses depois, em Hong Kong.
Murong deve o seu sucesso comercial ao fato de ter encontrado formas de praticar a sua arte e de angariar leitores na internet, fora da indústria editorial, onde o patrulhamento é maior.
Ele aborda questões políticas em um blog e em um serviço semelhante ao Twitter. Conforme escreve os romances, vai colocando-os na internet, capítulo por capítulo, sob diferentes pseudônimos.
Quando o livro está concluído, ele assina contrato com uma editora. As edições impressas, censuradas, rendem dinheiro, mas as versões da internet são mais completas.
Em 2004, a estatal Rádio China Internacional qualificou o popular romance de estreia de Murong como "um formador de opinião cibernético". Mas autoridades da cidade de Chengdu, onde a história se passa, denunciaram a obra. A versão sem censura foi traduzida para o inglês ("Leave Me Alone: A Novel of Chengdu", que significa "deixem-me em paz: um romance de Chengdu") e indicada em 2008 ao prestigioso Prêmio Literário Asiático Man.
A internet não oferece libertação total aos escritores chineses, já que há monitoramento. Mesmo assim, ela desencadeou uma revolução editorial, permitindo novas vozes. Os editores podem caçar talentos e comprar os direitos para edições impressas.
O site Rongshuxia é particularmente influente, divulgando romances de Annie Baobei, Ning Caishen e Li Xunhuan (pseudônimo de Lu Jinbo, hoje um importante editor que apoia Murong).
"A internet criou todas -e digo todas- as tendências literárias que decolaram em 2005 e depois", disse Jo Lusby, editora-gerente da Penguin China.
Murong já escreveu quatro romances e um livro-reportagem, baseados nos anos que passou vivendo em grandes cidades chinesas e trabalhando como consultor jurídico e em outros cargos.
Ele escrevia nas horas vagas e enviava os textos para revistas, mas era sempre rejeitado. Até que topou na internet com um fórum interno da empresa de cosméticos onde trabalhava. Ali amadores colocavam poemas e contos.
"Vi um romance intitulado 'Minha Pequim', que me inspirou", disse. "Pensei: 'Também posso escrever esse tipo de coisa'."
Depois que Murong assinou contrato para publicar o romance de Chengdu, foi obrigado a cortar 10 mil palavras. Mas, depois que o livro saiu, ele colocou o original não censurado na web. "A sensação foi libertadora", afirmou.
Alguns autores são céticos quanto ao efeito dos livros não censurados na internet. Chan Koonchung, autor de "Os Anos Gordos", romance distópico publicado em Hong Kong e Taiwan, mas vetado na China continental, disse acreditar que apenas um pequeno número de pessoas na China comunista leria o livro na rede, já que ele não pode ser citado na imprensa ou em outros fóruns.
Murong começou a se amordaçar no segundo livro. "Eu já sabia onde estavam os limites", disse.
Ele originalmente planejou que os protagonistas tivessem vivido os protestos de 1989 na praça Tiananmen. Mas disse que não se atreveu a ultrapassar essa "intocável linha vermelha". A versão completa da história está online.
"Agora que estou ciente das minhas tendências à autocensura, tento compensar isso na hora de escrever", disse Murong. "Posso escrever uma versão, e publicar uma versão 'mais limpa'."
Sua amizade com os editores o leva a se curvar à censura. "Não quero colocar meus amigos em apuros", afirmou. "Se eles dizem algo é arriscado, ou que eles podem perder o emprego por causa disso, eu os deixo suprimirem o que quiserem."
A luta mais dolorosa de Murong contra a censura ocorreu quando ele trabalhava com um editor na preparação do seu livro mais recente, "China: Na Ausência de Um Remédio", que documenta os 23 dias que ele passou investigando clandestinamente um esquema de pirâmide. O livro saiu no ano passado, e foi aclamado. A revista "Literatura Popular", fundada por Mao Tse-tung, o premiou.
Mas sua edição envolveu inacabáveis negociações. Até termos como "chineses" tiveram de ser trocados por "algumas pessoas". Murong gritou com o editor e socou uma parede da sua casa. "Em 2008, a censura foi dolorosa, e pude suportá-la. Mas, em 2010, eu não aguentava mais."
Zhang Jingtao, o editor, disse que queria "tornar o livro mais adequado à nossa sociedade e aos nossos tempos". "Meu trabalho é ser o controle de qualidade ideológico", afirmou.
Em novembro do ano passado, na véspera da cerimônia de premiação da "Literatura Popular", Murong passou oito horas preparando o seu discurso.
Ele escreveu: "A única verdade é que não podemos falar a verdade. O único ponto de vista aceitável é que não podemos expressar um ponto de vista".
O discurso tinha 4.000 palavras. Mas nem uma só foi pronunciada naquela noite.
Barrigão Vermelho, com suas pernas fortes, nutridas por uma dieta de fígado, tofu e gengibre, era um dos adversários. Mas, sob o olhar perplexo do seu treinador, o jovem lutador rondou nervosamente o rival, mais ameaçador, e então se encolheu num canto do ringue, sob vaias da meia dúzia de espectadores.
"Imprestável", rosnou seu empresário, Chang Hongwei, um engenheiro mecânico aposentado, enxotando Barrigão Vermelho da arena. "O próximo!"
Incontáveis grilos têm se enfrentado nos becos da capital, num milenar esporte chinês.
Estimulada pelos imperadores da dinastia Tang, a rinha de grilos foi proibida durante a Revolução Cultural (1966-76), por ser vista como uma predileção burguesa.
A atual retomada é liderada por uma geração mais jovem, ávida por passatempos chineses.
No ano passado, mais de 400 milhões de yuans (US$ 63 milhões) foram gastos na compra e criação de grilos, segundo o Instituto Ningyang de Pesquisas com Grilos, na província de Shandong.
Xangai tem atualmente mais de uma dúzia de mercados de grilos, e várias cidades, incluindo Pequim, realizam competições públicas.
"Com o aumento do padrão de vida, as pessoas têm mais tempo e dinheiro para despender, e querem hobbies ricos em história e significado", disse Wang Suping, dono da loja Delícias de Outono.
O estabelecimento é repleto de artigos para grilos - de gaiolas ricamente entalhadas, que custam centenas de dólares, até tigelas pintadas à mão para os minúsculos reis da luta.
Apostas ilegais atraem legiões. Em setembro, a polícia da província de Jiangsu estourou uma rinha, detendo 79 pessoas e apreendendo 100 lutadores.
Segundo a polícia, os proprietários apostavam 10 mil yuans (US$ 1.600) em cada combate. As apostas dos espectadores presentes superavam os 100 mil yuans.
A rinha de grilos continua sendo coisa de homens mais velhos. "Ela nos lembra da nossa infância, quando todo mundo era pobre, e você podia apanhar os grilos nos campos, logo depois dos muros da cidade", disse Chen Huihua, 72.
Embora hoje em dia balanças digitais dividam os lutadores em categorias separadas por centésimos de grama, os treinadores dos grilos continuam seguindo muitas das regras e recomendações de um manual do século 13.
Há um complexo sistema para alimentar, julgar as lutas e descrever os estilos de combate - "Rasteja como um tigre, luta como uma cobra", é a descrição de um golpe.
A temporada começa mesmo no verão, quando camponeses procuram os candidatos a gladiadores. Então começa o trabalho de formar um guerreiro.
As dietas podem incluir camarão, feijão e fígado de cabra. Os mais mimados podem de vez em quando tomar um banho de ervas, e degustar um ou dois vermes logo antes da grande luta.
Os adversários são jogados em lados opostos de um ringue. Quando a divisão é erguida, os respectivos donos usam gravetos para atiçar os insetos.
Às vezes leva apenas um minuto para se determinar se um aspirante dá para a coisa, se leva jeito e tem habilidade suficiente para o combate. A resistência às lutas é outra virtude valorizada
Um bom combatente dá um grito estridente, escancara as mandíbulas e ataca o adversário com coragem. Após dois ou três rápidos confrontos, o perdedor geralmente foge.
O vitorioso é recolhido com uma rede e jogado de volta no seu pote, para lutar num outro dia.
Além do presente e do futuro por si só desanimadores, as vacilantes autoridades daqui têm de lidar com o passado turbulento: quatro décadas de crimes de Estado cujas feridas demandam atenção.
Com os assassinatos, desaparecimentos e execuções públicas em massa perpetrados pelo Tribunal Popular, a Agência de Segurança Interna e o Tribunal de Segurança do Estado, as vítimas do coronel Muammar Gaddafi chegam a dezenas de milhares, segundo defensores dos direitos humanos na Líbia e no exterior. Como os líbios entrarão em acordo com seu passado?
Os líderes provisórios já estão estudando opções de como expor o longo catálogo de assassinatos e tortura, com base em exemplos da África do Sul, Europa e América Latina. Segundo eles, sua convicção é de que não se pode construir uma nova nação sem lançar luz sobre os aspectos sombrios do passado do país.
Medidas específicas estão em elaboração, assim como tudo o mais em um país que parece agora estar começando a despertando de um longo pesadelo.
No entanto, o ministro interino da Justiça, um veterano de combates legais internos e externos com o governo Gaddafi, disse que há um plano esboçado: investigação, audiências públicas e ações penais. A investigação cobriria desde a ascensão do coronel Gaddafi ao poder em 1969.
"Examinando os casos do Chile, da Argentina e da África do Sul, pendemos mais para o modelo sul-africano", disse o ministro interino da Justiça, Mohammed al Alagi, referindo-se à abordagem da Comissão de Reconciliação e Verdade daquele país, que deu mais ênfase à descoberta e responsabilização dos fatos do que a punições.
Alagi afirmou que um comitê investigativo será formado "para mostrar ao público o que aconteceu, a realidade".
"Depois", continuou, "haverá julgamentos justos para todos."
Obviamente, em um país carente de instituições, com um sistema judiciário que precisa ser totalmente reformado e milícias armadas ainda por todo o país, um acerto de contas legal com o passado parece algo distante. Alagi, porém, fez questão de afirmar que a ênfase não será para a retaliação. Suas palavras indicam um reconhecimento de que todos, em maior ou menor grau e de alguma maneira, colaboraram com a velha ordem e que é essencial promover uma catarse.
"Não é punição nem vingança", insistiu Alagi. "Quem é responsável por aquele estupro? As pessoas devem saber e depois virão os julgamentos."
A seguir, disse Alagi, "talvez possamos pensar em uma lei para perdoá-los".
Um assistente rapidamente fez uma ressalva. "Exceto em casos de homicídio e estupro", disse Nureddin M. Ejledi, diretor do departamento jurídico do Ministério de Relações Exteriores.
Alagi opina que os promotores públicos deveriam se concentrar nas várias dezenas de funcionários de Gaddafi responsáveis pelas piores transgressões.
"O mais importante para nós são os mandantes desses crimes", disse ele, "e eles não passam de 20 a 25 pessoas."
Autoridades líbias admitem a necessidade de "montar um sistema de justiça" para deter a sede de vingança.
"Há meses estamos dizendo às pessoas para terem clemência, em vez de se vingar", afirmou.
Essa abordagem desperta uma certa impaciência. O Conselho Nacional de Transição ainda não discutiu "a contento" os crimes do passado, disse Jalal el-Gallal, porta-voz do conselho.
"Isso não reflete o estado de espírito da população", comentou Gallal. "As pessoas já sofreram tempo demais. A maioria das que estavam com o regime anterior ainda circula por aí, o que é um bom sinal de tolerância." No entanto, ele sugeriu que nas ruas havia um desejo por retaliação.
Em uma atitude defensiva, o Conselho Nacional de Transição emitiu uma lista desses crimes depois que organizações internacionais manifestaram preocupação com o que pareceu a execução sumária do coronel Gaddafi pelos rebeldes que o capturaram.
O conselho chamou o coronel de "tirano" e o responsabilizou por um massacre de militares em 1977, por enforcamentos públicos de estudantes universitários, e por outros enforcamentos durante o Ramadã em 1984 e o assassinato de mais de 1.200 presos, muitos deles por motivos políticos, em um só dia na prisão Abu Salim em 1996.
A mensagem do conselho para o mundo pareceu clara: qualquer tratamento indevido dado ao coronel Gaddafi empalidece diante de seus crimes.
Alagi promete um "tribunal humanitário para proteger os direitos humanos", assim como uma caça aos membros do círculo próximo do coronel Gaddafi que fugiram para o exterior.
"Eu quero que toda a comunidade internacional veja esses julgamentos", declarou Alagi.