segunda-feira, 30 de junho de 2014



Um homem simples, de uma família pobre na Índia, revolucionou a saúde menstrual em países de baixa renda ao inventar uma máquina que produz absorventes baratos. Para testar seu produto, até mesmo criou um "útero" artificial, com uma bexiga e sangue de cabra. Num país extremamente conservador e supersticioso, os experimentos de Arunachalam Muruganantham para desenvolver sua invenção tiveram grande custo pessoal - ele quase perdeu sua mulher, sua mãe e chegou a ser expulso de onde vivia. Mas manteve seu senso de humor. "Tudo começou com a minha mulher", diz. Em 1998, ele era recém-casado e seu mundo girava em torno de sua esposa, Shanthi, e sua mãe viúva. Um dia ele viu que Shanthi estava escondendo alguma coisa dele. Ficou chocado ao descobrir o que era - "trapos asquerosos" que ela usava durante a menstruação. Quando ele perguntou por que ela não usava absorventes higiênicos, ela disse que não sobrariam recursos para comprar o leite.
Querendo impressionar sua jovem esposa, Muruganantham foi à cidade para comprar-lhe um absorvente. O produto foi entregue a ele apressadamente, como se fosse contrabando. Ele o pesou em sua mão e se perguntou porque 10 gramas de algodão, que na época custava 10 paise (o equivalente a menos de um centavo de real), eram vendidos por 4 rúpias (cerca de R$ 0,40) - 40 vezes mais. Ele decidiu que poderia fazer absorventes mais baratos. Ele produziu um absorvente caseiro de algodão e deu a Shanthi, exigindo retorno imediato. Ela disse que ele teria que esperar por algum tempo - só então Muruganantham se deu conta de que a menstrução era mensal. "Eu não posso esperar um mês para cada avaliação, vai demorar duas décadas (para aperfeiçoar o produto)!" Ele precisava de mais voluntárias. Muruganantham descobriu, então, que quase nenhuma mulher nas aldeias vizinhas usava absorventes - menos de uma em cada 10. Suas descobertas foram comprovadas por uma pesquisa realizada em 2011 pela AC Nielsen, encomendada pelo governo indiano, que constatou que apenas 12% das mulheres em toda a Índia usavam o produto. Muruganantham diz que nas áreas rurais o uso é ainda mais raro. Ele ficou chocado ao saber que as mulheres não só usavam trapos velhos, mas outras substâncias anti-higiênicas, como areia, serragem, folhas e até cinzas. As mulheres que fazem uso de panos muitas vezes sentem vergonha de secá-los ao sol, o que significa que eles não são desinfectados. Aproximadamente 70% de todas as doenças reprodutivas na Índia são causados por falta de higiene menstrual - que também pode influenciar a mortalidade materna. Encontrar voluntárias para testar seus produtos não foi tarefa fácil. Suas irmãs se recusaram. Então, ele teve a idéia de se aproximar de mulheres estudantes na faculdade de medicina local. Apesar dos obstáculos culturais que dificultam esse tipo de abordagem, ele conseguiu convencer 20 alunas a experimentar seus absorventes. Só que no dia em que ele foi recolher os formulários de avaliação, viu três delas respondendo às pressas. Essas opiniões não eram confiáveis, pensou. Foi então que ele decidiu testar os produtos em si mesmo. "Eu me tornei o homem que usava um absorvente", diz ele . Ele criou um "útero" fazendo alguns furos em uma bexiga de futebol e enchendo-a com sangue de cabra. Um ex-colega de classe, um açougueiro, passava em sua porta e tocava a campainha da bicicleta sempre que ele ia matar uma cabra. Muruganantham recolhia o sangue e misturava com um aditivo que recebeu de outro amigo em um banco de sangue para evitar que coagulasse muito rapidamente - mas isso não melhorava o cheiro. Ele caminhava, pedalava e corria com a bexiga de futebol debaixo de suas roupas tradicionais, constantemente bombeando sangue para testar as taxas de absorção de seu absorvente. Todo mundo pensou que tinha enlouquecido. Ele costumava lavar suas roupas ensanguentadas em um poço público e toda a aldeia concluiu que ele tinha uma doença sexual. Amigos passaram a evitá-lo. "Eu tinha me tornado um pervertido", conta ele . Ao mesmo tempo, sua esposa se encheu e saiu de casa. "Então você vê o senso de humor de Deus", diz ele no documentário Menstrual Man (Homem Menstruado). "Eu comecei a pesquisa para minha esposa e, depois de 18 meses, ela me deixou!" Mas ele perseverou nos seus objetivos e resolveu analisar absorventes usados. Esta idéia trazia ainda mais risco em uma comunidade tão supersticiosa. "Mesmo se eu pedir apenas um fio de cabelo de uma senhora, ela suspeitaria que eu estou fazendo alguma magia negra para hipnotizá-la", observa. Ainda assim, ele conseguiu ajuda mais uma vez das estudantes de medicina. O problema é que sua mãe, ao vê-lo trabalhando com aquilo, ficou horrorizada, chorou e também o deixou. "Foi um problema para mim. Eu tinha que cozinhar minha própria comida", disse. Mas mais ainda estava por vir. Muruganantham teve que abandonar a cidade para evitar ser pendurado de cabeça para baixo em uma árvore por seus vizinhos que acreditavam que assim o currariam dos maus espíritos que o haviam possuído. O maior mistério para ele era descobrir do que os absorventes que funcionavam com sucesso eram feitos, mas era difícil conseguir que a indústria revelasse seu segredo. Ainda assim, mandou algumas mostras para análises laboratorias, fez contato com empresas do setor e, após dois anos e três meses, descobriu que o insumo necessário era a celulose, retirado de casca de árvore. Mas ainda havia um obstáculo - a máquina necessária para transformar este material em pastilhas custava muitos milhares de dólares. Ele teria que criar o seu próprio. Quatro anos e meio depois, ele conseguiu criar um método de baixo custo para a produção de absorventes. O processo envolve quatro etapas simples. Em primeiro lugar, uma máquina semelhante a um moedor de cozinha transforma a celulose dura em um material esponjoso, que é em seguida embalado em bolos retangulares com outra máquina. Os bolos são então envoltos com uma espécie de tela e desinfectados em uma unidade de tratamento ultravioleta. Todo o processo pode ser aprendido em uma hora. O objetivo da Muruganantham era criar uma tecnologia amigável, fácil de usar. O objetivo não era apenas aumentar o uso de absorventes higiênicos, mas também para criar empregos para as mulheres na área rual - mulheres como sua mãe. Após a morte de seu marido em um acidente de estrada, a mãe de Muruganantham teve que vender tudo que possuía e trabalhar como lavradora. Ganhava apenas um dólar por dia, que não era suficiente para sustentar quatro filhos. É por isso que, com 14 anos, Muruganantham deixou a escola para encontrar trabalho. As máquinas são deliberadamente simples e tem estrutura aberta para facilitar a manutenção pelas mulheres. Quando ele mostrou o primeiro modelo, feito basicamente de madeira, os cientistas do Instituto Indiano de Tecnologia (IIT) foram céticos - Como este homem vai competir com as multinacionais? Mas seu objetivo não era realmente competir. "Estamos criando um novo mercado", disse. Sem que ele soubesse , o IIT inscreveu sua máquina em uma competição por um prêmio nacional de inovação. Ele ficou em primeiro lugar, entre os 943 competidores. Ele recebeu o prêmio do então presidente da Índia, Pratibha Patil - de repente, ele estava no centro das atenções . "Foi a glória instantânea, mídia piscando na minha cara, tudo", lembra ele. "A ironia é que, depois de cinco anos e meio, eu recebo uma ligação - a voz rouca diz: Lembra de mim?" Era sua esposa, Shanthi. Ela não estava completamente surpresa com o sucesso de seu marido. "Toda vez que conhece algo novo, quer saber tudo sobre", diz ela. "E então quer fazer algo que ninguém mais fez antes." No entanto, não era fácil conviver com este tipo de ambição. Não só ela ficou chocada pelo seu interesse em tal assunto, mas ele investiu todo o seu tempo e dinheiro - na época, eles quase não tinham recursos para comer corretamente. E os problemas foram agravados pela fofoca. "A coisa mais difícil foi quando os moradores começaram a nos tratar muito mal", contou. "Havia rumores de que ele estava tendo casos com outras mulheres e por isso estava fazendo essas coisas." Ela decidiu voltar para casa para viver com sua mãe. Após Shanthi, a própria mãe de Muruganantham e os antigos vizinhos - que o haviam criticado - voltaram atrás. Muruganantham poderia ficar rico patenteando sua invenção - uma máquina de fazer absorventes baratos. "Mas eu não queria, porque eu sei que nenhum ser humano morre por causa da pobreza, tudo acontece por causa da ignorância. "O inventor acredita que o grande negócio é um parasita, como um mosquito, enquanto ele prefere o toque mais leve, como o de uma borboleta. "Uma borboleta pode sugar o mel de uma flor sem danificá-la ", diz ele. Há ainda muitos tabus em torno da menstruação na Índia. As mulheres não podem visitar templos ou locais públicos, elas não estão autorizados a cozinhar ou tocar o abastecimento de água, por exemplo. Muruganantham levou 18 meses para construir 250 máquinas, que ele destinou para a região mais pobre da Índia, no norte do país. Ele acreditava que se conseguisse difundir seu produto em um local tão conservador, conseguiria em qualquer outro lugar. Para falar com as mulheres, era preciso permissão do pai ou marido. Há também mitos e medos que envolvem o uso de absorventes - que as mulheres que usam ficam cegas, por exemplo, ou nunca vão se casar. Mas, lentamente, aldeia por aldeia, houve aceitação cautelosa e, ao longo do tempo, as máquinas atingiram 1.300 aldeias, em 23 estados. São as mulheres que produzem e vendem o produto diretamente às clientes e explicam seu uso, pois lojas são geralmente gerenciadas por homens. As compradoras muitas vezes nem pagam com dinheiro, mas trocar os absorventes por cebolas e batatas. A maioria dos clientes da Muruganantham são ONGs e grupos de auto-ajuda femininos. Uma máquina manual custa cerca de 75.000 rúpias indianas (cerca de R$ 2,800) - uma semi-automática é mais cara. Uma máquina atende as necessidades de 3.000 mulheres e dá emprego a 10. Eles podem produzir 200 a 250 absorventes por dia, cuja unidade é vendida em média por 2,5 rúpias (R$ 0,01). Cada local de produção, pode criar sua própria marca. Muruganantham também trabalha com escolas - 23% das meninas abandonam a educação, uma vez que começam a menstruar. Agora as estudantes fazem seus próprios absorventes. "Por que esperar até que eles sejam adultas? Por que não dar poder às meninas?" O governo indiano anunciou recentemente que iria distribuir produtos sanitários subsidiados para as mulheres mais pobres. Foi um golpe para Muruganantham que não foi escolhido para o trabalho. Mas agora ele tem os olhos no resto do mundo. "Meu objetivo era criar um milhão de postos de trabalho para as mulheres pobres, mas por que não 10 milhões de empregos em todo o mundo?", pergunta ele. Ele está expandindo o modelo para 106 países, incluindo Quénia, Nigéria, Filipinas e Bangladesh. Muruganantham agora vive com sua família em um apartamento modesto. Ele não tem nenhum desejo de acumular bens. "Eu tenho acumulado nenhum dinheiro, mas um monte de felicidade", diz ele. "Se você fica rico, você tem um apartamento com um quarto extra - e então você morre."

domingo, 29 de junho de 2014








https://www.kickstarter.com/projects/627140406/in-the-name-of-the-moon-a-sailor-moon-documentary

 
Um cartaz com diversas possibilidades de orientação sexual foi o jeito encontrado por uma escola japonesa da cidade de Saitama (na região metropolitana de Tóquio) para falar sobre sexualidade a adolescentes. A medida foi adotada em um momento em que o Japão vive um grande aumento de casos envolvendo bullying contra estudantes LGBTs. 
De acordo com uma pesquisa realizada pelo grupo  Inochi Risupekuto Howaito Ribon Kyanpen (Campanha do Laço Branco pelo Respeito à Vida, em tradução livre), com sede na capital do país, e divulgada pelo Japan Times em maio, 70% dos estudantes homossexuais japoneses já sofreram algum tipo de bullying e 30% já pensaram em cometer suicídio. Além disso, 11% disseram ter sofrido abuso sexual.
O cartaz da escola secundária da Prefeitura de Saitama, intitulado “de quem você vai gostar”, apresenta diversos tipos de relações afetivas: heterossexuais, homossexuais, bissexuais e inclusive os assexuados. O material visual é parte de uma série de informações sobre saúde e explica ainda que as orientações são inatas à pessoa e não podem ser modificadas por pressões externas.
A adolescência é quando geralmente é realizada a descoberta da orientação sexual e, para isso, deve-se levar “tanto tempo quanto for necessário”, aconselha o material.
O texto introdutório do cartaz diz que, “quando os jovens chegam à puberdade, eles muitas vezes gostam de outras pessoas e isso é chamado atração sexual. Dependendo de quem a pessoa goste, esta é sua orientação sexual. A maioria é heterossexual, mas as pessoas que são homossexuais e bissexuais não formam um grupo pequeno. A orientação sexual é inata e não pode ser modificada por intervenção, por isso não é preciso mudar suas preferências”.




http://guia.folha.uol.com.br/passeios/2014/06/1477739-festival-de-cultura-japonesa-traz-fotos-sobre-a-felicidade-ao-redor-do-mundo.shtml


As partidas da Copa estão fazendo mal (sim, mal) a torcedores bem específicos: os asiáticos. Na China, o problema já tem até nome: é a Síndrome da Copa do Mundo.
Muitos fanáticos por futebol na China estão sofrendo de sintomas como cansaço excessivo, insônia e falta de atenção. Isso porque enquanto as partidas aqui são transmitidas à tarde, os torcedores chineses que desejam assistir a elas ao vivo têm de ficar acordados madrugada afora. Que dó, que dó!
A cidade de Chengdu, no sudoeste na província chinesa de Sichuan, tem até uma clínica especial criada para atender quem sofre da Síndrome da Copa do Mundo.

Além dos sintomas ligados a distúrbios do sono, os torcedores fanáticos também apresentam dores de estômago, perda de apetite (será pelo excesso de pipoca e salgadinhos?), ansiedade e paranoia. Como efeito colateral, alguns sofrem também com a queda do sistema imunológico.
Wang Fu Wong, 35, supervisor de um depósito de peças de carros, é um dos torcedores que sofreu da Síndrome da Copa do Mundo. Ele disse ao site chinês Cnhubei que se sentiu mal durante a partida entre Uruguai e Itália. "Fiquel mal do estômago quando o Suárez [Luis] mordeu o cara italiano e fiquei quebrado."
Wong disse que não conseguia comer, nem se concentrar. "Senti meu mundo desabar apenas por uma partida de futebol". Depois de 48 horas de descanso na clínica, ele se recuperou. "Agora eu assisto a uma partida a cada dois dias."


sábado, 21 de junho de 2014




http://www.denofgeek.com/movies/music-in-film/30787/music-in-film-the-sound-of-godzilla-from-1954-to-2014

O Japão aprovou nesta quarta-feira (18) uma legislação que proíbe a posse de pornografia infantil, uma medida exigida há alguns anos por grupos da sociedade civil.
Mas a nova legislação no país não inclui a representação de fantasias sexuais envolvendo crianças em quadrinhos mangá e animê e em jogos de videogames.
A forte pressão dos produtores dos populares mangás (tipo de história em quadrinhos característica do Japão) e animês (desenhos e filmes de animação) os isentou da proibição.
Os turistas que viajam ao Japão observam quase imediatamente a quase onipresente indústria pornográfica do país.
Até então, somente a produção e a distribuição de pornografia infantil estavam proibidas pelo governo e eram punidas no país, mas não a simples posse.
O Senado japonês aprovou com folga o texto, que prevê penas de prisão de até um ano e multa de até um milhão de ienes (R$ 22 mil) para quem possuir material sexual com crianças.
Para estimular os eventuais proprietários desse tipo de material a destruir os arquivos, as punições começarão a ser aplicadas um ano depois da entrada em vigor da lei, prevista para julho.
O texto aprovado nesta quarta considera ilegal a posse de fotos ou de vídeos de menores de 18 anos "com o objetivo de satisfazer desejos sexuais".
Antes da nova legislação, o Japão era o único país do G7, grupo de países mais ricos do planeta, no qual a posse de pornografia infantil ainda era legal.






http://www.theguardian.com/world/2014/jun/18/north-korea-dr-stranger



http://www.paulgravett.com/index.php/articles/article/coco_wang1





www.youtube.com/watch?v=HkMNOlYcpHg


terça-feira, 10 de junho de 2014

LETÍCIA QUE MANDOU:

Queridos,
Com prazer, convido vocês para a estréia da performance Caibo-me? da Mariana Piza!
Eu estou colaborando com o olhar externo e direção corporal.
Somente esta semana!
Abraços
Leticia Sekito

domingo, 8 de junho de 2014


https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiYVuskripejpwrOTa_WALriwkX-rU4OxosOJZpog0lXzFqCaT7AyzWrIGjonlQw5lom1go98_jieV4hDA-svIEnqMKbtyyYActSW1raTaNCKnLIJCj5xlnNCSPPjNlzUnsQ11aBUfAb6kK/s800/girardot+rocco.jpg







https://www.youtube.com/watch?v=tcA85vxUDN4&index=2&list=UUsdeqK1Ng4CKAVW1Pl3AiUg

http://24.media.tumblr.com/tumblr_lu1pali66j1qf7r5lo1_500.jpg





http://www.theguardian.com/world/2014/jun/08/israel-soldiers-speak-out-brutality-palestine-occupation

Folha de São Paulo
Domingo 8 de junho 2014
'Santo', Khomeini domina o Irã, 25 anos depois de sua morte
Desde 1989, país consolidou o Estado islâmico, registrou progressos socioeconômicos e manteve viés autoritário
SAMY ADGHIRNI DE TEERÃ Seu rosto grave estampa notas de dinheiro e domina murais no Irã. Praças, escolas e o principal aeroporto levam seu nome. Insultá-lo é crime passível de cadeia.
No 25º aniversário de sua morte, na última terça-feira (3), o aiatolá Ruhollah Khomeini continua onipresente na república islâmica que fundou em 1979.
A vida política e religiosa é ritmada até hoje pela evocação da sua memória. Ele é oficialmente chamado de imã (santo, na acepção xiita), e tanto conservadores como reformistas se dizem seus fiéis seguidores.
Para analistas e cidadãos ouvidos pela Folha, o legado mais pujante da era Khomeini é a consolidação do Estado islâmico que era seu projeto de vida.
Desde os anos 60, quando era um clérigo do interior, Khomeini militava para substituir a monarquia pelo "governo dos juristas islâmicos".
Perseguido pelo xá Mohammad Reza Pahlavi, o aiatolá firmou-se no exílio como maior líder de uma oposição que unia de religiosos a comunistas. Comandou a revolução à distância e voltou ao país para fazer triunfar seu modelo de teocracia.
A Constituição, adotada em referendo meses após a queda do xá, selou bases de um sistema inédito, que mescla instituições democráticas inspiradas no iluminismo e órgãos absolutistas de poder divino.
Autoproclamado "guia da revolução" (líder supremo), Khomeini enfrentou a invasão do Irã pelas tropas iraquianas de Saddam Hussein, que tinham apoio de um Ocidente apavorado com o novo regime.
A teocracia sobreviveu à longa guerra (1980-1988) e, em seguida, à própria morte de Khomeini --de câncer aos 86 anos, em 1989. Foi sucedido, após deliberação de juristas e clérigos, pelo aiatolá Ali Khamenei.
Desde então, o regime resistiu a megaprotestos em 1999 e 2009, esmagados pela força, e a sanções ocidentais implacáveis contra o programa nuclear e violações a direitos humanos. "Sob tanta pressão, é um milagre [a república islâmica] ainda estar no poder", diz o analista reformista Said Laylaz.
Khomeini descumpriu a promessa de garantir luz, água e combustível gratuitos a todos. Mas sua teocracia assistencialista obteve êxito no combate à miséria e ao analfabetismo.
De carona nas políticas iniciadas pela dinastia Pahlavi, a república islâmica fez disparar indicadores socioeconômicos.
O Irã é um dos países que registraram maior salto do IDH (que mede o padrão de vida médio) de 1980 e 2012: 67% no período, diz a ONU.
A disparada acentuou-se com a morte de Khomeini, que abriu caminho para um governo mais pragmático e próspero, graças aos petrodólares.
"O que mudou [desde 1989] é a consolidação da república islâmica, que foi deixando de ser um Estado revolucionário", diz a cientista política Farideh Farhi, da Universidade do Havaí.
No plano externo, o regime ampliou o leque de países com quem dialoga, incluindo vários europeus, mas manteve a resistência anti-EUA. Hoje, estende tentáculos geopolíticos da Síria ao Afeganistão.
Para Mohammad Marandi, analista da Universidade de Teerã próximo dos conservadores, graças às ideias de Khomeini, "o Irã é o país mais independente e influente desta parte do mundo".
AUTORITARISMO
Embora menos ideológico hoje, o regime manteve viés autoritário. Críticos acusam Khamenei de dar poder demais à Guarda Revolucionária e ter transformado cidadãos comuns em inimigos. Khomeini perseguia principalmente partidários do xá e grupos dissidentes que praticavam terrorismo, como o marxista MKO.
"Khomeini sabia recuar se necessário. Khamenei é diferente. Em nome da estabilidade, ele se põe muitas vezes contra a população", diz o jornalista reformista Isa Saharkhiz.
Ele cita como exemplo o conturbado pleito de 2009, no qual Khamenei declarou guerra ao Movimento Verde, que tomou as ruas de Teerã contra supostas fraudes na reeleição de Mahmoud Ahmadinejad.
Para alguns iranianos, Khamenei é mais conservador. "Khomeini permitiu operações de troca de sexo. Hoje é impensável", diz o engenheiro Payman K. Mas Khomeini cassou várias liberdades individuais, femininas principalmente.
O analista Laylaz descarta comparações: "Pouquíssimos líderes podem fazer uma sociedade segui-los, e Khomeini era um deles. Nenhum substituto jamais faria tanta diferença".

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O boato, não confirmado, diz que estudantes na vila de Gush Halav atualizaram a técnica milenar de trapacear nas provas escolares.
Um padre local diz à Folha que alguns alunos ali anotam informações na língua aramaica como se fossem preces cristãs. São trechos do conteúdo das aulas.
Os professores não entendem nada, já que o aramaico está em desuso há séculos, vivo apenas em uma versão moderna, falada em pequenas comunidades em países como a Síria e o Líbano.
A manobra é um dos efeitos colaterais dos esforços da comunidade maronita (ramo do cristianismo) dessa vila no norte de Israel. Ela tenta tornar comum o idioma semítico que foi uma língua franca nos tempos de Jesus Cristo. Líderes comunitários introduziram, com apoio do governo israelense, os estudos de aramaico no currículo escolar local. Padres ensinam a língua também a seus seguidores e afirmam que até 10% dos 1.600 maronitas de Gush Halav já entendem esse idioma coloquialmente. Diante de sua família, Carla Aisa, 11, prefere não conversar sobre a escola. Mas ela se diz entusiasta das aulas, em que aprende "a conversar na língua de Jesus".
Só que a questão do idioma aramaico não é, em Israel, apenas linguística. É também uma das maneiras de essa comunidade afirmar sua identidade, cercada pelo conflito entre o governo israelense e líderes palestinos.
"Meus amigos me dizem que, se eu falo árabe, sou árabe", diz Carla. "Mas não sou árabe, sou arameia."
Seu avô, Labib, 79, ainda se lembra de quando, nos anos 1940, funcionários do governo israelense vieram ao vilarejo de Gush Halav para registrar a população.
Os moradores, segundo Labib, se declararam "arameus". Na falta dessa opção na lista, porém, eles foram marcados como "árabes".
O episódio, contado com um quê de lenda pelo ancião da vila, resume uma ideia corrente na região, que faz fronteira com o Líbano– a de que os cristãos maronitas de Gush Halav têm sua etnia específica, a partir da tradição aramaica.
"Nós sempre sentimos que éramos diferentes dos árabes", afirma Carla Aisa.
A definição, ali, não é inofensiva. Ao definir sua identidade em oposição à cultura árabe, os maronitas de Gush Halav também se opõem ao movimento palestino e preferem, assim, aliar-se às autoridades israelenses.
Nacionalistas palestinos consideram os maronitas "traidores" de uma causa cultural maior.

domingo, 1 de junho de 2014


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A construção do Cinema Art Deco Liberty no sul de Mumbai começou em 1947, o ano em que a Índia conquistou a independência em relação à Inglaterra. Ele continua sendo um símbolo de liberdade.
Na noite de quarta-feira, em um bar no andar de cima, mulheres vestindo o tradicional salwar kameez e homens usando kurtas se misturavam, enxugando as testas na umidade de Mumbai e dando beijos no ar, sem encostar o rosto.
Uma cineasta transgênero usando um vestido preto brilhante conversava sobre seu último curta-metragem, enquanto um punhado de diplomatas ocidentais de terno se esgueiravam entre a multidão. 
Era a noite da festa de abertura do Festival Internacional Kashish de Cinema Gay de Mumbai, o maior festival de cinema gay da Índia. Agora em seu quinto ano, o festival, com cerca de 1.700 frequentadores, de acordo com os organizadores, ocorreu durante o domingo e mostrou 154 filmes -- entre eles curta-metragens e documentários -- de 31 países no Cinema Liberty bem como na Aliança Francesa de Mumbai, ali perto.
O slogan deste ano era: "ouse sonhar".
"Esta é a época em que os gays não são mais esquisitos e não há nenhuma vergonha em ser LGBT", disse o diretor do festival, Sridhar Rangayan em seu discurso de abertura. 
Em uma Índia que continua sob muitos aspectos profundamente tradicional, mesmo enquanto seu poder econômico cresceu, o festival assumiu um significado maior este ano.
O movimento pelos direitos dos homossexuais havia conquistado uma imensa vitória legal há cinco anos quando o Alto Tribunal de Déli revogou uma lei da era colonial que proibia o sexo gay, apenas para vê-la reinstaurada pelo Supremo Tribunal da Índia em dezembro passado.
Agora os ativistas temem que a eleição do novo governo do Partido Bharatiya Janata (BJP), um partido nacionalista hindu que é mais dinâmico economicamente, porém mais conservador socialmente do que o partido do Congresso Nacional que está deixando o poder, possa acarretar mais um revés para o movimento.
"O quadro mais amplo para os gays na Índia", diz Shobhna S. Kumar, dona da Queer Ink, uma editora e livraria online, "está no limbo neste momento."
O BJP apoiou a proibição do sexo gay no passado, embora os ativistas observem que o novo primeiro-ministro, Narendra Modi, não tem se pronunciado sobre o assunto.
Na Índia, os laços familiares continuam coesos e as expectativas da sociedade são rígidas – e muitos homossexuais indianos casam e têm filhos enquanto mantêm secreta sua identidade sexual. O movimento gay do país emergiu em meados dos anos 90 a partir dos grupos que fornecem serviços para os portadores de HIV e Aids. Eles argumentavam que embora a lei que proibia "o intercurso carnal contra a ordem da natureza" – reinstaurada em dezembro – fosse raramente aplicada, sua existência impedia seu trabalho, transformando até mesmo aqueles que distribuíam camisinhas em potenciais cúmplices em um crime. 
O próximo desafio, dizem os ativistas gays, é fazer um lobby no parlamento para revogar a lei.
"É preciso lugar pela liberdade. A vigilância deve ser eterna", disse Ashok Row Kavi, um dos primeiros homens a se declarar gay publicamente na Índia, em 1986, e presidente do Humsafar Trust, que fornece serviços de saúde para portadores de HIV e Aids. "Você nunca sabe quem pisará nos seus direitos."
Com a volta da proibição, significa que este ano, o festival de cinema, embora legal – os organizadores têm uma permissão do Ministério de Informação e Difusão da Índia – mostrou na tela relações que envolvem atos ilegais.
Entre os patrocinadores do festival estão a IBM e o conglomerado indiano Godrej, e publicações de massa como o "Hindustan Times", o "Mumbai Mirror" e "The Hindu" promoveram o evento em suas páginas.
Entre os 28 filmes indianos exibidos este ano no Kashish - que significa "atração" em urdu – estava "Purple Skies", de Rangayan, um documentário sobre os desafios de ser lésbica, biessexual e transgênero na Índia; bem como "Meghdhanushya", ou "Cor da Vida", de K.R. Devmani, sobre um menino gay que cresce em uma família conservadora de Gujarati.
O príncipe Mavendra Singh Gohil, um príncipe de Gujarat que se declarou gay há alguns anos, fez um comentário no início e no fim de "Meghdhanushya". 
"O cinema é uma ferramenta muito importante para a comunicação", disse o príncipe em uma entrevista por telefone. "Muitas pessoas que atuam nos filmes são nossos modelos de comportamento. Nós nos inspiramos nelas."
Outros filmes do subcontinente incluíram "Frangipani", de Visakesa Chandrasekaram, sobre dois homens e uma mulher envolvidos em um triângulo amoroso secreto em um vilarejo remoto no Sri Lanka.
Uma mostra especial de curta-metragens indianos incluiu o filme "Eidi", ou "O Dom", de Pradipta Ray, sobre um homem secretamente gay que volta à sua cidade natal para se encontrar com um amigo próximo, um ativista transgênero, levando-o a se confrontar com seus demônios.
Ray, que trabalha dando aulas de animação em uma universidade local, onde é conhecida pelos alunos como "a professora transgênero", disse que o maior desafio era conseguir financiamento. Ela fez "Eidi" com US$ 5 mil de suas economias. Os atores trabalharam de graça.
Organizadores disseram que realizaram o evento em um cinema convencional para tentar atrair o público convencional e ajudar a derrubar os estereótipos em relação aos homossexuais.
"Queríamos desfazer o preconceito mostrando filmes sobre pessoas LGBT do mundo inteiro. Elas têm as mesmas aspirações e esperanças", disse Rangayan em uma entrevista. "Seus problemas só diferem porque o governo ou a sociedade ou a lei torna as coisas difíceis para elas."
A Índia é um país de cinéfilos, com uma produção cinematográfica robusta centrada em Bollywood e Mumbai e legiões de fãs por todo o mundo. Mas personagens gays raramente aparecem nos filmes de Bollywood. Quando eles aparecem, a homossexualidade aparece estereotipada ou é usada para incrementar a trama.
Por exemplo, no sucesso "Dostana" de Bollywood, de 2008, dois homens heterossexuais fingem ser um casal para impedir que um apartamento seja alugado, depois acabam se apaixonando por uma mulher que divide o apartamento com eles. E a comédia segue.
"As pessoas agora dizem: 'você é como o Dostana'. O filme retirou aquela ideia de que é sujo", disse Rangayan. Ainda assim, ele se pergunta, sobre se ser associado a uma piada de um filme: "o que isso acarreta? É uma coisa boa?"
Recentemente, a atriz e ex-miss Índia Celina Jaitly, foi nomeada como porta-voz da campanha "Free & Equal" ["Livre & Igual"] da ONU pelos direitos dos homossexuais.
Como parte da campanha, Jaitly estrelou em um vídeo musical intitulado "The Welcome" ["A Recepção"], que mostra uma família se preparando para receber um filho querido que volta para casa. Ele aparece com um parceiro homem, e o choque da família eventualmente dá lugar a sorrisos e – ao melhor estilo bollywoodiano – mais música e dança. 
Jailty disse que não pode mais suportar ver seus amigos gays viverem sob um tipo de "apartheid".
Para Sagar Natekar, 19, estudante de psicologia em Mumbai, a exibição de "Out in the Dark", um filme do cineasta israelense Michael Mayer, foi a primeira vez que ele viu uma história de temática gay na tela grande.
O filme é sobre um caso de amor entre um estudante palestino e um advogado israelense, e para Natekar, uma história de sobrevivência em condições extremas.
Ele mostra "a importância do amor", disse ele.
Folha de São Paulo
Domingo 1 de junho de 2014


Maioria de estudantes chineses vive alheia ao massacre de 1989
Repressão a protestos na Praça da Paz Celestial, que completa 25 anos, ainda é tema tabu
Na Universidade de Pequim, onde tudo começou, referências históricas foram desfeitas pelo governo
MARCELO NINIO DE PEQUIM
Vinte e cinco anos depois do massacre da praça da Paz Celestial, em Pequim, o assunto continua sendo um tabu na China. Na internet, qualquer menção à data, 4 de junho, é rapidamente apagada pela censura.
O aniversário será lembrado em todo o mundo, mas não na China. Na memória coletiva do país, os protestos estudantis de 1989 estão enterrados sob anos de censura e pelo triunfo da narrativa oficial de que enriquecer, afinal, é o que importa.
Na Universidade de Pequim, onde o movimento pró-democracia nasceu, em maio de 1989, a nova geração de estudantes pouco sabe dos protestos. A maioria prefere evitar o assunto.
"Os menos inteligentes não sabem o que aconteceu em 1989. Os mais inteligentes sabem que não podem falar do assunto", resume o sinólogo David Kelly, diretor da consultoria China Policy.
A amnésia coletiva, para alguns, é voluntária, por prudência e medo. Mas, para a maioria, nasce da escassez de informações e do esforço do governo para reescrever a história, diz Kelly.
No centro do campus, estudantes passam apressados por um canteiro arborizado. Poucos sabem que aquele foi o marco zero do movimento.
Em 1989, o local era conhecido como o "triângulo", onde um mural de anúncios abrigou as convocações para os primeiros protestos. Para apagar a lembrança, o governo destruiu o triângulo e o substituiu pelo canteiro.
O estopim do movimento foi a morte do ex-secretário-geral do Partido Comunista Hu Yaobang, que havia sido afastado do cargo porque defendia reformas políticas.
A comoção pela morte de Hu logo se transformou em um movimento pró-democracia, com milhares de estudantes acampados na praça da Paz Celestial (Tiananmen, em mandarim).
Os protestos ganharam volume com o apoio popular e se espalharam para mais de 400 cidades da China. Mas o foco era Pequim. Após sete semanas de impasse, o governo ordenou que o Exército desocupasse a praça.
Os soldados abriram fogo contra manifestantes e a população que os defendia, resultando num massacre. Pelas contas oficiais, houve 241 mortos. O número exato é desconhecido. Estimativas independentes variam de 2.000 a 7.000 mortos.
"Não sei exatamente o que aconteceu em 1989, há muitas versões", diz Li, 29, estudante de física, interrompendo a leitura da biografia do presidente americano Abraham Lincoln (1809-1865).
"É um assunto muito sensível. Por isso, nunca falamos dele", afirma Li.
O silêncio não se limita aos estudantes. Nas últimas duas semanas, a Folha procurou 22 professores da Universidade de Pequim e de outras instituições acadêmicas para comentar o aniversário dos protestos. Nenhum aceitou falar.
Quem desafia o tabu não escapa de punição. Cinco ativistas de direitos humanos estão presos desde 6 de maio por participar de um encontro para marcar o aniversário dos protestos.
Pu Zhiqiang, 49, um dos mais conhecidos advogados de direitos humanos do país, está entre os detidos. Em 1989, ele era um dos estudantes que ocuparam a praça da Paz Celestial para pedir mais liberdades.
Em entrevista ao jornal "South China Morning Post" pouco antes de ser preso, Pu resumiu a lição dada pelo regime em Tiananmen --que ele foi um dos poucos a desprezar: "Não vale a pena ficar no caminho do Partido Comunista. Siga o fluxo".
INDIFERENÇA
Para muitos, porém, não foi tão difícil adotar o contrato social imposto pelo governo: desenvolvimento econômico e estabilidade em troca de subserviência.
Estela, 22, recém-formada em língua portuguesa, critica a "obsessão" da mídia estrangeira pelos protestos de 1989. Seus colegas, garante ela, não se importam com o assunto.
"Talvez o comportamento do governo tenha sido o mais adequado na época. A China conseguiu se desenvolver, e hoje a qualidade de vida é muito mais elevada, especialmente se comparada com 25 anos atrás", diz.
O milagre econômico que resultou das medidas de abertura do governo de fato produziu uma revolução no país, alavancando milhões da pobreza para a sociedade de consumo.
Em 1989, o PIB per capita da China girava em torno de US$ 400. Hoje está em aproximadamente US$ 6 mil.
A repressão e a prosperidade econômica abafaram o instinto de oposição ao regime, além de criar um apagão no conhecimento dos mais jovens sobre a história recente do país.
Muitos estudantes abordados pela Folha na Universidade de Pequim disseram que jamais viram a famosa imagem do manifestante solitário diante de uma fileira de tanques em Pequim, um dos momentos mais marcantes do século 20.
"É uma instalação artística?", pergunta Lin, 20, estudante de eletrônica, ao ver a foto pela primeira vez. "Ouvi vagamente sobre os protestos, mas não sei o suficiente para ter uma opinião".



No mês passado, o ministro da Justiça turco, Bekir Bozdag, anunciou um projeto do governo para criar prisões separadas para os presos gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros do país. De acordo com a declaração por escrito de Bozdag, o objetivo é proteger esses presos de abusos. Essa não é a primeira vez que Ancara considera a ideia: o Ministério da Justiça propôs planos em julho passado para criar instituições para "pessoas em situação LGBT".
O sistema carcerário turco é superlotado e carente de recursos. Os oficiais de correção são mal treinados e as medidas de disciplina são implementadas de forma arbitrária. O estupro é comum e o acesso à assistência médica é inadequado. Criar prisões exclusivas para indivíduos LGBT não ajudará em nada a resolução desses problemas mais amplos. E uma política de separação – ou mesmo o discurso que sugere que esta é a abordagem correta – poderia ter a consequência não intencional de alimentar a homofobia generalizada pelo país.
Embora não haja leis contra homossexuais na Turquia, as atitudes do público dificilmente são tolerantes. Em uma pesquisa do Pew Research Center de 2013, 78% dos turcos disseram que "a homossexualidade não deveria ser aceita pela sociedade", um número 12% maior do que em 2002, ano em que o Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP) do primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan chegou ao poder. A Comissão Europeia citou relatórios de 12 assassinatos de indivíduos LGBT motivados por ódio entre outubro de 2012 e setembro de 2013 além de "incidentes de tortura, estupro, maus-tratos, violência doméstica, assédio e ataques cibernéticos". Os ataques antigays e o discurso de ódio também aumentaram.
As regulações vagas da Turquia quanto à proteção da "moralidade pública" são frequentemente interpretadas de forma a discriminar os gays no emprego, educação, habitação e assistência médica. O ministro de Estado para mulheres e famílias disse em 2010 que ser gay é "uma doença". O exército turco considera a homossexualidade como um "distúrbio psicossexual"; com base nisso, os homossexuais são isentos do serviço militar. E o AKP se recusou, em 2012, a incluir a identidade de gênero e a orientação sexual nos artigos antidiscriminação da constituição.
"A homofobia e a transfobia estão espalhadas por todos os aspectos da vida cotidiana", disse Sezen Yalcin, coordenadora da Associação para Políticas Sociais, Identidade de Gênero e Orientação Sexual, uma ONG com sede em Istambul. "As pessoas LGBT vivem com medo de serem expostas", acrescentou ela. Aquelas que são declaradamente gays ou transexuais são vistas como "afrontas à estrutura quase sagrada da família".
Muitos ativistas turcos, portanto, são céticos em relação às intenções declaradas pelo ministério, especialmente uma vez que nenhum grupo de defesa dos direitos LGBT foi informado – muito menos consultado – antes do anúncio de Bozdag. Até agora, os planos para prisões exclusivamente LGBT continuam totalmente abstratos, e alguns veem todo o episódio como uma reação cínica de um governo que busca evitar as críticas de Bruxelas e de parlamentares de oposição em Ancara, ansioso para se proteger de processos na Justiça.
As questões sobre a melhor abordagem para o tratamento de presos LGBT são complexas, e as políticas variam no mundo inteiro. Na Turquia, onde não existe nenhuma regulação nacional, o protoloco geral é restringir a interação desses presos com a população carcerária mais ampla. Em instituições com mais de um preso LGBT, as celas podem ser compartilhadas. Mas como há poucos detentos declaradamente LGBT, esse isolamento normalmente significa o confinamento solitário - uma punição reservada para os criminosos de alto risco.
Uma presa transgênera descreveu o tratamento que recebeu durante os dez anos que ficou presa em uma carta enviada este ano para uma ONG que trabalha para melhorar as condições nas prisões. Sob o pseudônimo "Funda", ela se lembrou de como os administradores da prisão à qual ela foi enviada inicialmente ficaram "perplexos" com sua condição. Eles a obrigaram a tirar a roupa na frente de vários oficiais homens para que eles pudessem checar seus genitais, colocaram-na em confinamento solitário sem água quente ou banheiro, e chamavam-na de "o homem que se vestia de mulher". Transferida para uma segunda prisão, ela foi confinada a uma cela solitária em uma ala de alta segurança. Outro pedido foi necessário para que ela fosse transferida para uma instituição com presos transgêneros.
Relatórios recentes sugerem que pouca coisa mudou na última década.
O Tribunal Europeu de Direitos Humanos determinou em outubro de 2012 que as autoridades carcerárias turcas haviam submetido um jovem gay a tratamento "desumano e degradante" em violação à Convenção Europeia de Direitos Humanos. Em 2008, logo após ser preso, ele pediu uma transferência de uma cela onde estava sofrendo perseguição para outra cela, compartilhada com outros presos gays. Em vez disso, foi colocado em confinamento solitário por mais de oito meses. O tribunal declarou que o Estado precisa garantir um tratamento que não cause "dificuldades maiores do que as que são características inerentes e inevitáveis da detenção". Ancara foi ordenada a pagar 22 mil euros ao homem, estabelecendo um precedente.
Em março, presos transgêneros da província de Samsun, no Mar Negro, fizeram uma greve de fome dizendo que eram submetidos a tratamento severo e abuso sexual.
Claramente, as políticas específicas de isolamento não estão funcionando. Alguns proponentes do plano do governo podem afirmar que instalações separadas ajudarão a proteger os presos LGBT, mas este argumento simplesmente reforça uma mentalidade de culpar a vítima. Em todo caso, o abuso de prisioneiros deveria ser condenado e punido independentemente da identificação sexual.
Criar prisões dedicadas não favorecerá um sistema penal mais responsável, nem colocará um fim ao assédio e o abuso sexual. Mais que isso, a criação de instituições especiais poderia obrigar os presos LGBT a cumprir sentenças longe de casa, limitando as visitas de advogados, amigos e parentes.
Em um país homofóbico, sancionar instituições separadas envia uma mensagem de que uma segregação similar é aceitável fora das grades da prisão. São necessárias políticas que garantam a proteção para todos os presos, a investigação diligente das queixas de perseguição, regulações que responsabilizem as autoridades carcerárias pelo bem-estar dos presos, e estratégias nacionais que lutem contra a discriminação. E se Ancara quiser de fato ajudar os presos LGBT do país, deve incluir os grupos de defesa de direitos nas discussões das políticas, desde o início.