sábado, 31 de outubro de 2015

2040*
20
65 anos ou mais
40
60
80
100
1979
1990
2000
2010
2014
2020*
2030*
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O abandono da controversa política de filho único na China anunciado pelo Partido Comunista do país, terá efeito direto sobre Andrea Zhao, 30, moradora da capital e mãe de um menino de quatro meses.
Pela política ainda em vigor, Zhao só pode ter um segundo filho caso pague um preço proibitivo em multas e serviços como saúde e educação. Com a mudança, ainda a ser colocada em prática, o caminho está aberto para uma nova gestação.
"Eu quero um outro bebê. Se tivermos mais dinheiro, acho que terei sem hesitar", diz a chinesa, que tem três irmãs e um irmão. "Eu e meu marido achamos que uma criança é algo muito solitário, mas é difícil. Somos do campo, sem ajuda de ninguém na cidade, é mais difícil em Pequim." A preocupação com custos de um apartamento maior e educação de qualidade, e a necessidade de mais benefícios sociais para a maternidade não é exclusiva de Zhao, mas um fator que faz muitos chineses ponderarem sobre a opção pela segunda criança -e especialistas se questionarem sobre o impacto da nova permissão de dois filhos para todos os casais.
Uma família de Xangai que não quis se identificar disse à Folha que deseja um segundo filho, mas se preocupa com preços de moradia nas grandes cidades. "Será que podemos ter um outro filho, para que nossa criança não fique tão sozinha quanto a gente?", disse a chinesa de 31 anos, mãe de um garoto de 3 anos.
O casal, ambos filhos únicos, diz que há muitas questões a serem resolvidas antes de ampliar a família. "Por exemplo, precisamos de um apartamento maior. Hoje vivemos em um apartamento muito pequeno, queremos muito dar um bom ambiente para as crianças. Se insistirmos no segundo filho, talvez tenhamos um grande custo", diz ela.
Mas o benefício da existência de irmãos também está claro para o casal: "Crescemos com nossos primos, mas estamos muito ocupados e não temos muito tempo para eles. Quando temos algo para contar para alguém, só temos um ao outro".
Outro fator levantado como problemático é o fato de muitas famílias migrarem do campo para a cidade, mas se manterem registradas na cidade de origem -sistema que fixa a pessoa na cidade natal, encarecendo serviços básicos, como escola e hospitais, na cidade para onde migra.
O limite de um filho por casal está em vigor há 35 anos na China e é, provavelmente, a mais dura política pública de redução da natalidade no mundo. A regra é complexa e já permitia mais de um filho a depender de determinados fatores: se a família mora no campo ou na cidade, se os pais têm irmãos, se trata-se de minorias étnicas e se o primeiro filho foi uma menina.
Estima-se que 150 milhões de famílias, cerca de um terço do total, tenham apenas um filho, estrutura familiar conhecida como "quatro avós, dois pais, uma criança".
Uma flexibilização da política foi anunciada no final de 2013, permitindo o segundo filho para famílias em que pelo menos um dos pais era filho único -até essa data, ambos deveriam ser filhos únicos para ter o direito.
Essa flexibilização atraiu interesse de 14% dos 11 milhões de casais elegíveis, segundo Yuan Xin, professor do instituto de população e desenvolvimento da Universidade de Nankai, em Tianjin. Mas, continua ele, estudos indicaram que 60% das famílias aptas têm interesse na segunda criança, e que mais de 80% dos casais chineses vê dois filhos como um número ideal.
Além de derrubar uma política impopular e mal vista no exterior, a China pretende ampliar a força de trabalho e reduzir o impacto do envelhecimento da população. De acordo com Yuan Xin, 15,5% da população chinesa tinha 60 anos ou mais no final de 2014, proporção que pode atingir 35% em 2053.
O professor diz que a permissão de dois filhos por família é efetiva para minimizar o impacto do envelhecimento, mas tem efeito limitado no curto prazo, com um "baby boom" modesto por dois ou três anos, até voltar a uma taxa de natalidade abaixo da reposição das pessoas que morrem.
"[Esperamos] mais famílias com duas crianças, mas não uma grande onda, pois o padrão mudou tanto que a maioria das famílias não quer mais crianças", avalia Joan Kaufman, diretora da Columbia Global Centers para o leste da Ásia e especialista em saúde pública. "Não creio que haverá grandes mudanças na sociedade chinesa."
Um cálculo oficial, feito no passado, credita à política de filho único a redução de 400 milhões de nascimentos na China nas últimas três décadas. Esse número impactante, no entanto, é contestado por especialistas, que identificaram reduções de natalidade também importantes em outros países no período, e na própria China nos anos anteriores à adoção da política.
Além de impedir a livre decisão das famílias sobre o planejamento familiar, o modelo forçado de um filho deu origem a práticas condenadas, como abortos e abandono de meninas, abortos forçados e crianças não registradas. E a um contexto social particular, em que as crianças são mimadas e, ao mesmo tempo, pressionadas para serem bem sucedidas e se casarem cedo.
Andrea Zhao diz admirar os filhos únicos, que tiveram acesso a uma educação melhor e mais atenção dos pais. "Mas os filhos únicos também me admiram, por eu ter irmãos com quem pude brincar e compartilhar momentos."


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