A jovem já tinha
passado dois meses detida num acampamento na selva do sul da Tailândia quando
um acordo foi proposto.
Ela havia fugido de
Mianmar na esperança de encontrar segurança na Malásia, após seu vilarejo ter
sido incendiado por extremistas antimuçulmanos.
No entanto, sua
família não tinha condições de pagar os US$ 1.260 exigidos para que ela pudesse
completar a viagem. Os traficantes disseram que um desconhecido estava disposto
a pagar pela liberdade dela, mas, em troca, ela teria que se casar com ele.
"Me deixaram
telefonar para meus pais. Eles falaram que, se eu estivesse de acordo, seria
melhor assim para toda a família", contou Shahidah Yunus, 22.
"Entendi o que tinha que fazer."
Ela passou a fazer
parte das centenas de mulheres rohingyas vendidas em casamento a homens
rohingyas que já estavam na Malásia. O casamento é o preço pago para escapar da
violência e da miséria em seu país de origem, Mianmar.
Algumas rohingyas
concordam em se casar desse modo para escapar da detenção ou de um destino
ainda pior nas mãos dos traficantes. No entanto, outras são enganadas ou
coagidas. Algumas são apenas adolescentes.
"Centenas ou até
milhares de mulheres e meninas foram vendidas ou negociadas em casamento desde
2012 por meio desses corredores de tráfico", disse Matthew Smith, da
entidade Fortify Rights, em Bancoc. "Algumas famílias enxergam isso como
um mecanismo de sobrevivência. Para a mulher, ser vendida ou coagida a se casar
é o resultado menos tenebroso da viagem. Isso é um problema."
Sharifah Shakirah é
uma refugiada rohingya em Kuala Lumpur que presta assistência a refugiados.
Segundo ela, muitas das mulheres detidas por traficantes temem que, se não
encontrarem maridos rapidamente, "os traficantes as vendam como
prostitutas".
As jovens muitas
vezes empreendem a viagem sob pressão de seus pais, ansiosos para enviar suas
filhas para uma situação de segurança e reduzir seus custos domésticos. Segundo
outros rohingyas e especialistas, elas se deixam atrair pelas promessas
douradas feitas pelos traficantes sobre o custo da viagem e a boa vida que
supostamente as aguarda na Malásia.
Na realidade, porém,
mulheres solteiras que embarcam nos navios de traficantes de pessoas sem ter
meios de pagar a passagem se convertem em mercadorias que são mantidas em um
acampamento ou no navio até que alguém pague sua soltura.
Segundo Shakirah, se
os traficantes sabem que a família de uma mulher não tem meios para pagar,
"eles informam a outras pessoas: 'Estamos com uma mulher aqui'". Os
maridos muitas vezes são mais velhos e mais pobres que o prometido. Algumas das
mulheres acabam envolvidas em relacionamentos abusivos.
Dois anos atrás,
Ambiya Khatu, 21, casou-se com um homem na Malásia que pagou US$ 1.050 para
tirá-las das mãos de traficantes de pessoas na Tailândia. "Minha mãe
combinou o casamento", contou.
Quando vivia em
Mianmar, ela queria estudar enfermagem. Hoje mora na periferia de Kuala Lumpur,
capital da Malásia, cuidando de sua mãe, sua irmã doente e a bebê de sua irmã,
enquanto aguarda o retorno de seu marido, que saiu à procura de trabalho meses
atrás e ainda não voltou. "Depois de eu ser resgatada, meu marido
perguntou se eu me casaria com ele", contou Khatu. "Ele disse: 'Se
você não quiser se casar, pode devolver o dinheiro que gastei com você'."
Isso não era
possível. "Eu não falava a língua. Como poderia trabalhar para pagá-lo?
Não havia outra opção senão me casar."
Algumas das mulheres
que se casam para pagar a taxa cobrada por traficantes descrevem isso como uma
escolha, mas Susan Kneebone, da Universidade de Melbourne, na Austrália, diz
que, quando há violência, ameaças ou promessas enganosas envolvidas, esses
casamentos equivalem ao tráfico humano.
Quando a violência
antimuçulmana explodiu em Mianmar, em 2012, a maioria dos refugiados era
formada por homens. No entanto, nos últimos dois anos, vem aumentando o número
de mulheres e crianças que fogem do país.
O tráfico de pessoas
foi interrompido temporariamente devido à repressão regional e à estação das
monções. Porém, algumas mulheres aguardam a retomada da atividade para deixar
Mianmar, mesmo que o preço de sua passagem seja o casamento.
Tahera Begum, 18,
rohingya que tinha fugido de Mianmar havia alguns meses, estava com sua cunhada
em um acampamento improvisado em Kutupalong, Bangladesh, aguardando para seguir
viagem para se casar na Malásia com um homem escolhido por seu irmão, que já
estava nesse país. "Eu ficaria mais feliz se pudesse ficar aqui
mesmo", disse. "Mas, se receber sinal de meu irmão ou de meu futuro
marido, vou tentar de novo."
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